Editor JOTA

Desde o início da Operação Lava Jato, no ano passado, os advogados das maiores empreiteiras do país colecionam derrotas, especialmente nas mãos do juiz Sérgio Moro. Esgotada boa parte das alternativas de contestação no Paraná, os criminalistas preparam uma ofensiva de recursos nos tribunais superiores.
O JOTA ouviu sete advogados de renome envolvidos no caso para colher suas reclamações. Todos pediram para falar em caráter reservado, diante da sensibilidade do tema. Eis os argumentos que eles devem usar para embasar os principais questionamentos:
VÍCIOS DE ORIGEM 
Sérgio Moro seria incompetente para conduzir a Lava Jato e teria agido deliberadamente para manter o caso sob sua responsabilidade
1 - Violação de foro
 A Lava Jato é derivada de uma investigação sobre lavagem de dinheiro iniciada em 2004 pela PF no Paraná. Sérgio Moro teria permitido que os policiais investigassem indiretamente durante meses o então deputado federal José Janene (PP), morto em 2010, suspeito de usar o doleiro Alberto Youssef para expatriar dinheiro do esquema do mensalão. Mas só o STF poderia mandar investigar Janene, por conta da prerrogativa de foro. Todos os atos decorrentes dessa investigação seriam nulos, incluindo a descoberta das relações entre Janene, o doleiro de Brasília Carlos Chater e Youssef, e a participação do doleiro no esquema da Petrobras. Moro tem vetado acesso das defesas aos autos desse inquérito, que provariam essas nulidades, diz um advogado envolvido no caso que preferiu não ser identificado na reportagem.
2 - Suspeição
O doleiro Alberto Youssef e o juiz Sérgio Moro são velhos conhecidos. Em 2002, Youssef firmou um acordo de delação premiada homologado pelo magistrado para contar o que sabia sobre o caso Banestado. Anos depois, surgiram denúncias de que Youssef teria quebrado esse acordo e continuado sua atividade criminosa. Numa dessas acusações, um delegado da PF informou ao juiz que Youssef teria escondido R$ 25 milhões no exterior. Moro se declarou suspeito para supervisionar essa investigação, mas não as outras que envolviam o doleiro que havia concordado em manter em liberdade.
3 - Encontro fortuito
Sérgio Moro teria se negado a desmembrar investigações derivadas do inquérito inicial sobre o esquema de lavagem de dinheiro de José Janene. A suspeita inicial era que Alberto Youssef fosse o operador do esquema criminoso, mas descobriu-se depois que as lavagens de Janene também eram feitas pelo doleiro Carlos Chater. As operações de Chater configurariam um encontro fortuito, o que demandaria a abertura de um novo inquérito, que não ficaria necessariamente nas mãos de Moro. O mesmo valeria para a descoberta de que Youssef lavava dinheiro desviado da Petrobras, por meio de interceptações telemáticas cujo objetivo era investigar Chater. Moro teria agido para unir todos os casos sob sua responsabilidade.
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4 - Distribuição viciada
Teria havido vício de distribuição do caso embrionário da Lava Jato, segundo dois advogados. Até 2007, Curitiba tinha apenas uma vara especializada em crimes financeiros, sob o comando de Sérgio Moro. Nesse ano, o TRF4 resolveu criar outra vara para dividir o acervo. Na véspera da criação da vara, Moro recebeu um pedido de quebra de sigilo de terminais telefônicos que seriam de Alberto Youssef. A suspeita era que Youssef tivesse participação nos crimes de lavagem de dinheiro pelos quais Janene era investigado. Ao invés de distribuir a representação por dependência à investigação do então deputado, Moro juntou a representação em um procedimento ligado ao caso Banestado, no qual Youssef tinha feito uma delação premiada. O caso de Janene foi distribuído para a nova vara e Moro manteve a investigação sobre Youssef.
5 - Incompetência territorial
Houve pedidos para que Moro declinasse da competência para julgar o caso, uma vez que os delitos não teriam sido cometidos no Paraná, estado onde atua, mas sim em Brasília, em São Paulo, Rio de Janeiro, Pernambuco e outros Estados. Em todos os pedidos, o juiz se declarou prevento, o que contrariaria a jurisprudência do TRF4 e dos tribunais superiores.
6 - Violação de foro 2
Durante a investigação contra Alberto Youssef, descobriu-se que o doleiro trocou mensagens pelo BBM, sistema de mensagens da Blackberry, com os deputados federais André Vargas e Luiz Argôlo. A identificação dos deputados era elementar. “LA”, por exemplo, chegou a escrever seu endereço funcional em Brasília para Youssef. A PF alegou que não sabia da identidade dos deputados, apesar de ter solicitado informações à Blackberry, e Moro não comunicou a suspeita ao STF, o que deslocaria a investigação para o foro adequado, isto é, o STF. A 2a turma do Supremo, no entanto, não viu ilegalidade nesse caso, que ainda pode ser questionado no Plenário.
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7 - Parcialidade
Até o momento, o juiz Sérgio Moro tem evitado o assédio da imprensa. No entanto, apesar de não ter dado nenhuma entrevista desde que a operação foi deflagrada, ele usou um decreto de prisão preventiva para criticar o encontro entre advogados dos investigados com o ministro da Justiça, José Eduardo Cardozo, noticiado pela imprensa. Para um criminalista, essa conduta demonstra a parcialidade do juiz, que deveria se ater ao processo. Moro se tornou alvo de um novo pedido de exceção de suspeição depois do episódio.
CERCEAMENTO DE DEFESA
Advogados alegam que o juiz tem reiteradamente negado acesso a trechos dos autos e deu prazo exíguo para apresentar resposta
8 - Acesso negado
Profissionais que atuam na defesa de empreiteiros já denunciados pelo MPF reclamam que Sérgio Moro tem reiteradamente negado acesso a trechos dos autos que poderiam comprometer as investigações. “Fomos intimados a apresentar resposta sem termos tido vista do material que estava nos autos, que incluia documentos, depoimentos e delações”, reclama um criminalista.
9 - Prazo exíguo
Após negar acesso a trechos dos autos durante a fase de inquérito, o magistrado teria dado um prazo exíguo (30 dias) para os advogados lerem mais de 60 mil páginas do processo antes de apresentarem a primeira defesa antes do recebimento da denúncia. No caso de um réu representado pela Defensoria Pública, o prazo para resposta ainda estava correndo, mas Moro já determinava diligências, relata um advogado. “É como se ele já tivesse a decisão pronta e a defesa do acusado não importasse”.
10 - Fatiamento das denúncias
Um criminalista reclama de uma suposta falta de lógica na apresentação das denúncias pelo MPF, que já teriam sido apresentadas contra alguns acusados e não contra outros supostos envolvidos nas mesmas condutas. Haveria casos em que um réu acusado de entregar dinheiro a um suspeito, mas esse suspeito não foi denunciado. “É uma irregularidade flagrante, o juiz pode fatiar o processo, o Ministério Público, não. Isso prejudica a defesa”, protesta.
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DELAÇÕES 
Criminalistas questionam legalidade e validade ética dos acordos de delação premiada que basearam investigação sobre a Petrobras
11 - Defender delator e delatado
A advogada Beatriz Catta Preta foi a responsável por fechar o acordo de delação premiada do ex-diretor de Abastecimento da Petrobras, Paulo Roberto Costa, ainda em agosto do ano passado. Meses depois, ela assumiu a defesa de Julio Camargo, executivo da construtora Toyo Setal, que havia sido apontado por Costa como um dos integrantes do esquema de pagamento de propinas. Na sequência, Camargo viria a também se tornar um colaborador. Essa atuação “nas duas pontas” representa um claro conflito de interesses, para um dos criminalistas ouvidos.
12 - Prisão como forma de convencimento 
A Justiça e o MPF estariam utilizando os decretos de prisão preventiva como forma de pressionar os investigados a aceitarem colaborar com a Justiça. A prática chegou a ser admitida por um dos procuradores envolvidos no caso, mas depois foi desmentida. Para um defensor envolvido na causa, o fato de os acusados serem soltos tão logo firmem o acordo é uma prova desse desvio. “O investigado era perigoso e depois de firmar o acordo passa a não ser mais?”, questiona.
13 - Pressão a familiares
Um dos métodos de convencimento utilizado por policiais e procuradores para que Paulo Roberto Costa aceitasse se tornar um colaborador, teria sido a possibilidade de parentes seus serem processados por terem recebido dinheiro do esquema. O acordo de PRC inclui cláusulas de perdão para familiares próximos, que acabaram também fazendo acordos semelhantes. Advogados questionam essa conduta.
14 - Falta de espontaneidade
Um dos requisitos previstos pela lei para a validade dos acordos de colaboração é a espontaneidade. Para um criminalista que defende uma grande empreiteira, esse princípio foi completamente desvirtuado na Lava Jato. Além das prisões e da pressão a familiares, o fato de o acordo já prever antecipadamente a soltura e qual será a punição do investigação é uma inversão do procedimento. “Primeiro a pessoa conta tudo o que sabe, depois a Justiça define qual será o seu benefício de redução de pena”, diz.
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