Luiz Orlando Carneiro

No último dia 10, a Advocacia-Geral da União, em nome da presidente da República, ajuizou ação de inconstitucionalidade no Supremo Tribunal Federal, para tentar anular a Emenda Constitucional 74, promulgada em 2013, e que confere autonomia administrativa financeira à Defensoria Pública da União, permitindo o desenvolvimento funcional de suas atividades, que tem como foco a defesa e a garantia dos direitos dos cidadãos mais pobres.
Nesta semana, a Associação Nacional dos Defensores Públicos Federais (Anadef), a Defensoria Pública da União (DPU) e a União dos Advogados Públicos Federais do Brasil (Unafe) protocolaram pedidos para serem admitidos na ADI 5.296 como amici curiae, a fim de acompanhar a sua tramitação no STF.
Em entrevista ao JOTA, o presidente da Anadef, Dinarte da Páscoa Freitas, contesta a oportunidade e “os reais objetivos” da iniciativa da Presidência da República. Para ele, a ação em questão pretende “diminuir a esfera de atuação da DPU na defesa dos mais carentes, e impor, de forma transversa, uma limitação ao Parlamento Federal no seu dever constitucional de reforma a Constituição”. Ainda segundo Freitas, a ADI “utiliza a DPU como bode expiatório, prejudicando o serviço a ser prestado no acesso à Justiça aos mais carentes, para atacar a liberdade do Parlamento em reformar a Constituição”.
De acordo com a petição da AGU, um dos principais objetivos da ADI foi impedir que a Defensoria Pública possa – com base na autonomia funcional e administrativa conferida pela EC 74/2013 - elaborar o seu orçamento e dispor sobre a sua organização funcional, e tomar iniciativas como a da resolução do Conselho Superior da DP que concedeu aos defensores federais ajuda de custo para moradia – como têm os magistrados. Foi isto mesmo?
O fundamento utilizado de concessão do auxílio-moradia mostrou-se muito mais uma cortina de fumaça, do que efetivamente o motivo real que levou ao ingresso dessa desastrosa ADI. Primeiro: a decisão do auxílio moradia através de ato do Conselho Superior da Defensoria Pública da União pautou-se no tratamento simétrico que deveria haver entre as instituições, e que motivou a mesma decisão no Conselho Nacional de Justiça (CNJ) e no Conselho Nacional do Ministério Público (CNMP). Segundo: tal decisão está suspensa por decisão judicial. Nenhum Defensor Público Federal recebe auxílio moradia. A autonomia funcional e administrativa em nada se confunde com o argumento utilizado pela AGU. Muito longe disso. A DPU tem autonomia desde 2013. A decisão do CSDPU de pagamento de auxílio moradia ocorreu apenas em novembro de 2014, e foi pautada em argumentos já aplicados no âmbito do CNJ e do CNMP. Esse argumento apresentado pela AGU foi uma forma de esconder os reais objetivos da ADI: atacar a Defensoria Pública da União, diminuir sua esfera de atuação na defesa dos mais carentes e impor, de forma transversa, uma limitação ao Parlamento Federal no seu dever constitucional de reforma a Constituição. Utiliza a DPU como bode expiatório, prejudicando o serviço a ser prestado no acesso à Justiça aos mais carentes, para atacar a liberdade do Parlamento em reformar a Constituição.
A ação da Presidente da República também dá ênfase à tese de que a iniciativa da PEC teria de ser do Executivo, que é o Poder que pode dispor, no plano constitucional, sobre servidores públicos da União, regime jurídico, provimento de cargos, estabilidade e aposentadoria. Como se sabe, a iniciativa da PEC foi do Congresso. O que tem a dizer sobre isto?
Os argumentos apresentados pela Presidência da República novamente não poderiam ser mais infelizes. A EC 74/2013 determina de forma muito simples a aplicação e extensão da autonomia administrativa e funcional, concedida às defensorias públicas estaduais - por meio da EC 45 - à Defensoria Pública da União. A única coisa que a EC 74 fez foi corrigir uma distorção que existia entre a Defensoria Pública do Estado e a Defensoria Pública da União. Em momento algum se trata de regime jurídico de servidor público. Muito longe disso. Trata sim, de organização administrativa do Estado. A infelicidade dos argumentos trazidos na peça inicial foi gigantesca. Tenta-se na inicial, a todo custo, colocar o julgador e o leitor em erro. A simples leitura do texto da EC 74 retira todas essas dúvidas. Quanto à iniciativa da proposta, inexiste atribuição exclusiva para propositura de PEC no caso analisado. Ao Legislativo Federal - que exerce o Poder Constituinte Reformador - as limitações materiais são aquelas decorrentes do artigo 60 da CF, do qual, no caso concreto, o tema não se aproxima em momento algum. A EC 74 seguiu todos os trâmites e formalidades para sua aprovação. No mérito corrigiu uma distorção histórica no órgão defensoria.
Como têm sido a evolução e os percalços da Defensoria Pública como uma das “funções essenciais à Justiça” (art. 127 e seguintes da Constituição), juntamente com o Ministério Público e da Advocacia Pública?
As dificuldades de crescimento da DPU são gigantescas. É o órgão do Sistema de Justiça que possui o menor número de membros, com o menor orçamento, e necessitando expandir seus serviços. O grande prejudicado é o assistido. Para isso é preciso ter uma Defensoria Pública estruturada, os membros valorizados em relação às demais carreiras e principalmente, com autonomia plena para gerir suas atividades. A litigância da DPU, em regra, é contra a União.

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JOTA

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