Basilia Rodrigues

Luciano Bottini Filho

A audiência do ministro José Eduardo Cardozo com advogados da Odebrecht, investigada na operação Lava Jato, divide opiniões não apenas no mundo político, mas também no meio jurídico.
Os <a href="https://www.jota.info/o-que-amb-vai-dizer-ao-ministro-da-justica">juízes vêem interesse de empreiteiras </a>em intimidar o Poder Judiciário. Por outro lado, advogados que defenderam réus na Ação Penal 470, o processo do Mensalão, apoiam Cardozo, tratando o encontro como um tipo de encontro “comum e legítimo” - posição que ecoa a visão da <a href="http://www.oab.org.br/noticia/28077/o-advogado-possui-o-direito-de-ser-recebido-em-audiencia">Ordem dos Advogados do Brasil.</a>
Da mesma forma, especialistas ouvidos pelo JOTA avaliam que, dadas as atribuições do cargo, é previsível que o titular do Ministério da Justiça seja acionado em casos do tipo.
Advogados que atuaram no mensalão afirmam que nunca foram recebidos pelo ministro para falar sobre a AP 470 mas não deixaram de rebater as críticas envolvendo a Lava Jato.
"Com ele (Cardozo), eu nunca me reuni, mas já me reuni com dezenas de ministros da Justiça. Desde o governo Sarney", lembra Antônio Carlos de Almeida Castro, o Kakay, advogado influente em Brasília e que convenceu a maioria dos ministros do Supremo Tribunal Federal a absolver o publicitário Duda Mendonça. "Estão querendo criminalizar o trabalho do advogado criminal. Isto é muito sério. O advogado é indispensável à administração da Justiça. A tentativa de amordaçar o advogado atenta contra a democracia. Ele recebe advogados, assim como recebe o procurador-geral. Claro que se presume que as conversas são republicanas.”
A agenda oficial não detalha, mas Cardozo esteve reunido com representantes da Odebrecht e da UTC Engenharia, investigadas pela Polícia Federal na Lava Jato. A Odebrecht pediu que o ministro esclarecesse dúvidas sobre o alcance do acordo de lavagem de dinheiro do país com a Suíça e enviou documentos ao STF. A Associação dos Magistrados Brasileiros também critica a postura das empreiteiras.
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A relação entre as partes, defensores e políticos é das mais delicadas quando operações de grande envergadura podem escancarar malfeitos dentro de um governo. O contato entre os representantes dos investigados e integrantes do governo, para a advogada Helena Regina Lobo da Costa, professora da Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo (USP), é possível apenas para resolver questões previstas na função da autoridade procurada.
"Se o político desempenha uma dada função jurídica, o advogado deve recorrer a ele nos casos em que esse político for autoridade competente para examinar o pleito de seu cliente". Por exemplo, em uma Comissão Parlamentar de Inquérito, o advogado deverá dirigir seus requerimentos ao parlamentar que a presidir, podendo, inclusive, solicitar audiência para apresentar seus argumentos. "O limite do advogado, do político ou do juiz é o de atuar naquilo que é inerente à sua função, sem extrapolá-la.”
O envolvimento direto do ministro da Justiça era esperado, de acordo com Helena Regina. "O Ministro da Justiça, por exemplo, é o chefe da Polícia Federal, do Departamento de Recuperação de Ativos e Cooperação Jurídica Internacional, dentre outros. Se houver problemas jurídicos envolvendo essas instituições, o ministro da Justiça pode ser competente para tomar as providências”.
"Na imensa maioria dos processos criminais, não há qualquer acionamento político. Entretanto, em alguns casos, pode ser necessário acionar figuras do governo que desempenham determinadas funções jurídicas", diz.
Abusos da PF
O advogado de Simone Vasconcelos, ex-sócia do publicitário Marcos Valério, também saiu em defesa do ministro. "Embora não pareça normal e não seja comum, penso que não é absurdo o encontro do ministro da Justiça com advogados se for tratar de assuntos relativos a pasta do mesmo, como por exemplo abusos da PF", afirma Leonardo Yarochewsky.
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O episódio de Cardozo com as empreiteiras ressuscitou outro personagem do mensalão,  o ex-relator, Joaquim Barbosa. Ele defendeu a demissão de Cardozo do cargo no Twitter e voltou a enfurecer advogados. "Absurdo para mim é o Joaquim Barbosa não se recolher a sua insignificância", esbraveja Yarochewsky que teve a cliente condenada a mais de 12 anos de prisão.
[caption id="attachment_2194" align="aligncenter" width="300"]<a href="https://www.jota.info/wp-content/uploads/2014/12/bancoImagemFotoAudiencia_AP_266263.jpg"><img class="size-medium wp-image-2194" src="https://www.jota.info/wp-content/uploads/2014/12/bancoImagemFotoAudiencia_AP_266263-300x200.jpg" alt="Barbosa volta a irritar advogados (Crédito Fellipe Sampaio/SCO/STF) " width="300" height="200" /></a> Barbosa volta a irritar advogados (Crédito Fellipe Sampaio/SCO/STF)[/caption]
Os advogados do mensalão criticam a polêmica. "Nada de excepcional. Há muita especulação. Não vi nenhuma indicação de que o ministro da Justiça tenha se movimentado junto ao STF para favorecer os acusados. Se não houve isto, não vejo problema nas reuniões, ainda que para tratar da operação. Enquanto não se comprovar algo reprovável, como uma promessa de tráfico de influência, não vejo nada de errado", declarou ao JOTA, Marcelo D'avila, o advogado do ex-deputado Valdemar Costa Neto, também condenado.
Arena Política
A Operação Lava Jato trouxe de volta a Justiça na linha de frente da arena política. Como se viu em grandes casos como o Mensalão e operações da Polícia Federal em que partidos foram ameaçados por escândalos, o rito regular dos inquéritos é marcado por declarações, incidentes e impasses entre autoridades e advogados que nunca se vê falar quando o suspeito é um cidadão comum. Denúncia após denúncia, recai sobre o Judiciário a dúvida sobre o quanto esse embate é ditado pela lei ou pelo jogo político.
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Professor de Teoria Geral do Processo da FEPI, Sergio Henrique Salvador afirma que a política é mais notada em processos de repercussão, mas não mais acionada. Nos processos de menor relevo, a ingerência política seria muito menos percebida.
"A população em si não se interessa muito nos grandes debates políticos nacionais, apenas fazem reflexões ou colocam opiniões quando existem casos de corrupção de grande impacto", diz ele. "Essa influência política nunca será saudável, pois a Justiça deve ser isenta, aplicar a legislação em pé de igualdade para as partes envolvidas, sem qualquer tipo de ingerência, que nada mais faz senão produzir o descrédito e a indesejada impunidade.”
Tanto no Direito quanto na Política, a ética sempre foi um tema espinhoso. Quando esses dois mundos se encontram, entretanto, a vigilância na conduta dos magistrados torna o desafio ainda mais evidente.
"O juiz, como se espera, deve primar e conduzir qualquer processo ou linha investigatória com isenção, evitando comentários extra-processo e focar exclusivamente no objeto de seu oficio, com a menor participação possível fora do ambiente do processo", destaca o professor.
Um desvio pode tornar o próprio juiz, um mero servidor "alvo do represália política", onde sanções disciplinares também percorrem a estreita linha entre a interpretação de leis e interesses pessoais.
Cardozo foi testemunha no mensalão
O depoimento de José Eduardo Cardozo foi determinante para livrar o ex-presidente da Câmara, João Paulo Cunha, de uma das acusações de peculato. Em 2009, quando Cardozo não era ministro, ele foi ouvido como secretário-geral do PT e deputado federal da legenda. Testemunhou a favor de Cunha, José Genoíno e Delúbio Soares.
Em 2012, já titular da pasta da Justiça, chegou a ter o depoimento elogiado por ministros do STF durante o julgamento do mensalão. Cardozo contou que o jornalista Luís Costa Pinto prestou diversos serviços à Câmara, enquanto a acusação questionava a comprovação dos serviços e dizia que o jornalista atuava como assessor pessoal de João Paulo Cunha. No entanto, o MPF perdeu.
[caption id="attachment_4670" align="aligncenter" width="300"]<a href="https://www.jota.info/wp-content/uploads/2015/02/bancoImagemFotoAudiencia_AP_216782.jpg"><img class="wp-image-4670 size-medium" src="https://www.jota.info/wp-content/uploads/2015/02/bancoImagemFotoAudiencia_AP_216782-300x232.jpg" alt="bancoImagemFotoAudiencia_AP_216782" width="300" height="232" /></a> Peluso e Lewandowski elogiaram testemunho de Cardozo (Crédito Nelson Jr./SCO/STF)[/caption]
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"Não posso deixar de dar crédito a alguns depoimentos de pessoas que tenho na mais alta conta, como o então deputado José Eduardo Cardozo, atual ministro da Justiça, que disse que o jornalista prestou vários serviços à instituição. No mínimo, diante das declarações de pessoas desse calibre, não posso deixar de decidir na dúvida em favor do réu", disse na época o ministro aposentado Cezar Peluso.
O presidente do STF, Ricardo Lewandowski, então revisor do mensalão, também fez menção ao testemunho de Cardozo. "Trata-se de depoimento altamente qualificado do ministro da Justiça do nosso país. Respondeu seguramente que ele era assessor da Câmara e fazia toda parte de relação com a imprensa", julgou.
Sobre Genoíno, Cardozo afirmou que o ex-presidente do PT dava mais atenção aos deputados do que à gestão do partido, tese da defesa. À favor de Delúbio, contou que nunca presenciou nada que o incriminasse.
Reuniões com técnicos
Entre 2012 e 2013, anos que compreenderam o julgamento do mensalão e de recursos, a agenda oficial do ministro José Eduardo Cardozo não registrou reuniões com advogados do mensalão. Mas ao menos dois defensores estiveram oficialmente com a equipe técnica de Cardozo para tratar de assuntos paralelos ao mensalão.
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Em junho de 2012, faltando pouco mais de um mês para o início do julgamento, o advogado do ex-deputado Professor Luizinho, Pierpaolo Bottini, esteve no gabinete de assuntos legislativos para debater sobre a Lei de Lavagem de Dinheiro.
Em agosto, foi a vez de Cláudio Alencar, um dos advogados de José Genoíno, ir ao Ministério da Justiça, segundo a pauta oficial, falar sobre o novo Código Penal, em tramitação no Congresso.

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JOTA

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