STF

54% das prisões provisórias no Rio de Janeiro são indevidas, aponta pesquisa do Sou da Paz

Quando levados a julgamento, presos provisórios foram absolvidos ou condenados a penas em regime aberto ou semiaberto

29/09/2015|11:51
Atualizado em 05/03/2020 às 17:56

Se a Constituição, as leis, convenções internacionais e o bom senso são insuficientes, os números comprovam as consequências da aplicação generalizada da prisão provisória e os efeitos da demora da apresentação de presos em flagrante aos juízes.

Uma pesquisa do Sou da Paz, feita em parceria com o Centro de Estudos de Segurança e Cidadania da Universidade Cândido Mendes (CESEC), chegou à conclusão de que 54% dos presos provisórios permaneceram desnecessária e indevidamente encarcerados.

Foram analisados 7.734 casos de presos em flagrante no Rio de Janeiro no ano de 2013.

Desse total:

  • 772 foram absolvidos
  • 294 processos foram arquivados
  • 273 foram condenados a penas alternativas ou a cumprir pena em regime aberto
  • 058 foram condenados a penas em regime semiaberto
  • 814 terminaram em acordo judicial
  • 437 foram condenados a penas a serem cumpridos em regime fechado

O restante dos casos era de pessoas que ainda aguardavam julgamento - a quase totalidade já em liberdade - e de processos que acabaram com a conduta sendo desclassificada.

Em média, cada uma dessas pessoas permaneceu presa por 101 dias até que o caso fosse julgado.

Há situações emblemáticas, como de Pedro, 44 anos, casado, preso na Rocinha com 16 gramas de droga. Ele, usuário de droga, é deficiente visual e esquizofrênico e ficou 485 dias presos. Em julho de 2014, quando pela primeira vez esteve diante de um juiz, seu processo fosse extinto.

Outro exemplo mencionado pelos pesquisadores: Paulo, 28 anos, casado. Foi preso com 88 filmes piratas. Não tinha condenação anterior e o Ministério Público não pediu sua prisão preventiva. Apesar disso, o juiz determinou que Paulo permanecesse preso. E por lá ficou, por 162 dias, até ser solto. Quando o caso foi a julgamento, o resultado foi a absolvição.

Mais :

- J.P.D. ficou 195 dias presos por furto simples. Também absolvido. A.M.D.S

- A.M.D.S. também preso provisoriamente por 135 dias. A acusação era de furto simples. Também foi absolvido.

- E.A.R. igualmente preso por furto simples. Passou 152 dias preso até que fosse solto para cumprir a pena que lhe foi imposta.

Mudanças

Os casos analisados pela pesquisa são anteriores à iniciativa do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) de promover, junto a todos os tribunais do País, as audiências de custódia.

Justamente para evitar prisões desnecessárias, com danos às pessoas presas, o juiz deverá ser apresentado ao preso em até 24 horas para que analise a necessidade da manutenção da prisão.

O Supremo Tribunal Federal, em julgamento recente, também determinou liminarmente que as audiências sejam aplicadas em todo o País como forma de mitigar a crise no sistema carcerário brasileiro. No entendimento do STF, a situação dos presídios no País configura um estado de coisas inconstitucional.

De acordo com dados de outra pesquisa, feita pelo Instituto de Pesquisa Econômica e Aplicada (IPEA) em nove estados e divulgada no final do ano passado, 37% dos presos provisórios brasileiros não foram condenados judicialmente a cumprir pena em regime fechado.

O estudo do IPEA, assim como o levantamento do Sou da Paz, indicam um abuso na conversão da prisão em flagrante em prisão provisória. Ciente disso, o ministro Gilmar Mendes chegou a sugerir em julgamento no STF que as escolas de magistratura passem a incluir esse tema nos cursos de formação de juízes. Seria uma forma de combater a cultura do super encarceramento, apontado por integrantes da Corte.

Íntegra

Os resultados da pesquisa do Sou da Paz (http://soudapaz.org/)  em parceria com o CESEC (http://www.ucamcesec.com.br/home/?unbust) podem ser vistos no site de divulgação: http://danospermanentes.org/index.htmllogo-jota