Termina em 1 de abril a janela partidária que permite aos parlamentares trocarem de legenda e no dia seguinte expira o prazo para que prefeitos e governadores se desincompatibilizem para poder disputar outros cargos. A movimentação envolve pelo menos 14 chefes do Executivo estadual e de capitais. São pelos menos 7 prefeitos de capitais e 7 governadores em articulações visando concorrer a outro cargo no pleito de outubro.
A dança de cadeiras inclui acordo entre PT e PDT no Ceará e até uma aproximação velada da família Sarney ao grupo liderado pelo governador Flávio Dino (PSB) no Maranhão. Existe ainda uma tentativa de parte do PSDB para manter na legenda o governador gaúcho Eduardo Leite, que flerta com o PSD. O movimento tenta colocá-lo na disputa presidencial no lugar do paulista João Doria.
Dos 27 governadores, a maioria vai disputar ou a reeleição ou simplesmente terminar mandatos que não podem ser renovados. Entre desistentes do mandato atual, a preferência é por uma vaga no Senado ou pela Presidência da República.
A renúncia de governadores pode ocorrer em Alagoas, Bahia, Ceará, Maranhão, Rio Grande do Sul, São Paulo e Piauí. O Senado está na mira de Camilo Santana (PT-CE), Flávio Dino (PSB-MA), Renan Calheiros Filho (MDB-AL) e Wellington Dias (PT-PI).
A incerteza, contudo, envolve a composição de alianças para pavimentar o caminho de sucessores e apoio de máquinas partidárias com recursos para financiar campanhas. Além da preservação do poder local em mãos amigas.
Em Alagoas, pesa contra a decisão de renúncia o fato de o governador não ter um vice para manter a máquina operando favorável a ele durante a eleição. Mas o pai do governador, senador Renan Calheiros (MDB-AL), avalia a candidatura como possível. “Há essa tendência. Essa possibilidade está sendo construída”, afirmou o senador ao JOTA.
Já candidatura de Rui Costa (PT-BA) ao Senado segue incerta, dependendo de aliança petista com outras forças políticas para garantir Jaques Wagner na disputa pelo governo e o Senado para um partido aliado. Neste caso, em fim de segundo mandato, Costa não se lançaria e passaria o bastão em 1 de janeiro.
Já entre as capitais com prefeitos flertando com o governo do estado estão Aracajú, Belo Horizonte, Campo Grande, Cuiabá, Florianópolis, Maceió e Natal.
Na janela partidária, adversários, ‘pero no mucho’
No campo das alianças regionais está o embarque velado da família Sarney na campanha do vice-governador do Maranhão Carlos Brandão (PSDB), que está a caminho do PSB, de Dino, nesta janela partidária. O governador deixará o cargo para concorrer ao Senado.
Dino trata pessoalmente das alianças na chapa de Brandão. O deputado estadual Adriano Sarney (PV), neto do ex-presidente José Sarney, deve compor a coligação de Brandão. Adriano é dissidente do clã, mas carrega o peso eleitoral do avô.
A tia dele, a ex-governadora Roseana Sarney (MDB), decidiu evitar um novo confronto direto com Dino, dessa vez pelo Senado. Ela foi derrotada em primeiro turno por ele na disputa pelo governo em 2018.
No cenário político maranhense, a desistência é vista como um arrefecimento na guerra dos Sarney contra Dino. Mas há um motivo para isso: a família tem no senador Weverton Rocha (PDT) seu novo inimigo.
Rocha comprou o complexo de Comunicação Difusora (filiada ao SBT), entrando na concorrência direta com o Grupo Mirante, controlado pelos Sarney e filiado à Rede Globo.
Fora a briga por audiência, Rocha retirou o PDT da aliança com Dino e pretende concorrer contra Brandão. A decisão teria levado os Sarney para a oposição ao pré-candidato ao Palácio dos Leões. O movimento é tido no Maranhão como um apoio velado ao candidato de Dino.
PT e PDT juntos no Ceará
No Ceará, a articulação envolve um acordo para o PDT disputar o governo local sem a concorrência do PT, apesar de Ciro Gomes se opor a Lula na disputa pelo Palácio do Planalto.
Carlos Lupi, presidente nacional do PDT, afirma que o acordo existe há 16 anos e está mantido. “O acordado desde o primeiro contato [pela aliança no Ceará] é que teria uma alternância de poder com direito à reeleição [ao governo]”, diz Lupi. “Como agora acaba o [segundo] mandato do PT é coerente começar a nova etapa do PDT, como fizemos quando era Cid Gomes, [ex-governador] e foi o Camilo Snatana [o candidato]”, afirma.
De acordo com Lupi, a legenda está “discutindo” internamente o mais viável para disputar o Palácio da Abolição. O PDT tem pelo menos dois nomes fortes: o da vice-governadora Izolda Cela, que assumirá o governo após o desligamento de Santana e terá a máquina pública em mãos; e o do ex-prefeito de Fortaleza Roberto Cláudio.
O deputado federal Mauro Filho, ex-secretário de Planejamento e assessor econômico de Ciro corre em paralelo pela indicação do PDT. Além do presidente da Assembleia Legislativa Evandro Leitão.
Tucanos rachados na janela partidária
O PSDB vive uma guerrilha interna de facções políticas regionalizadas nesta janela partidiária. Os embates ocorrem entre os grupos liderados pelo governador paulista João Doria, pré-candidato ao Planalto; pelo senador mineiro Aécio Neves; e pelo governador gaúcho Eduardo Leite.
Doria aparece nas pesquisas eleitorais com cerca de 3% das intenções de voto e sofre pressão para desistir da corrida eleitoral. Mas ele resiste acreditando ser possível conquistar o eleitorado em busca de uma terceira via. Enquanto isso, o tucano tenta atrair a presidenciável do MDB e senadora Simone Tebet (MS) como vice na sua chapa.
Aécio busca amarrar os diretórios estaduais do PSDB num levante para derrubar a candidatura de Doria. A ideia é segurar Leite no partido para ser o presidenciável tucano. O gaúcho, entretanto, está em negociações com o PSD para ser o candidato da legenda ao governo federal.
A manobra de Aécio daria como saída honrosa a Doria o direito de concorrer ao Senado por São Paulo no lugar de José Serra. Mas é preciso convencer Serra a desistir de concorrer à reeleição. Ele está com 79 anos e trata de Parkinson, o que motivou um afastamento dele do Senado por quatro meses entre agosto passado e fevereiro deste ano.
Seja Doria candidato ao Planalto ou ao Senado, o vice-governador Rodrigo Garcia assume o Palácio dos Bandeirantes buscando a reeleição, na esperança de a máquina estatal ajudá-lo a subir nas pesquisas. Até o momento Garcia não deslanchou. As pesquisas são lideradas por Fernando Haddad (PT), que vê o ministro bolsonarista Tarcísio Freitas (sem partido) empatado com ele na pergunta espontânea, ambos com 2% das intenções de voto.
Nascido na cidade do Rio de Janeiro e sem nenhuma ligação com São Paulo, Freitas tende, nesta janela partidária, a se filiar ao PL do mensaleiro Valdemar da Costa Neto. O mesmo partido escolhido pelo presidente Jair Bolsonaro para tentar a reeleição. Em alguns cenários de pesquisas o ministro aparece colado em Haddad com até 25% das intenções de voto.
Três cenários para Leite
O futuro segue incerto para o governador do Rio Grande do Sul nesta janela partidária, após derrota nas prévias tucanas para Doria. O destino de Leite ganhou contorno presidenciável nas últimas semanas. Em meio à desistência de candidatura do presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), ele passou a ser fortemente assediado pelo PSD.
Leite se reuniu em São Paulo com o cacique da legenda, o ex-prefeito paulistano Gilberto Kassab, que recebeu o governador para um café da manhã na terça-feira (15/3). Na tarde do mesmo dia, Leite voou para Brasília para se reunir com tucanos que o apoiaram nas prévias. Foi desse encontro na capital federal que surgiu a proposta de Aécio para o PSDB retirar a candidatura de Doria para manter Leite no partido.
O governador tenta também amarrar de parte do partido a um compromisso de abandonar a campanha de Doria, caso ele se lance pelo PSD, e apoiá-lo num eventual segundo turno contra Bolsonaro ou Lula.
A saída de Leite do PSDB o faria perder o controle da máquina partidária tucana no Rio Grande do Sul. Além disso, o obrigaria a carregar consigo o vice-governador Ranolfo Vieira Júnior, postulante ao Palácio Piratini. O vice trocou o PTB pelo PSDB no ano passado e, dificilmente, conseguiria manter um palanque duplo no estado para Leite se ele migrar de legenda.
Ranolfo manifestou ao JOTA o interesse de acompanhar Leite, nesta janela partidária, seja para o PSD ou outra legenda da chapa do governador ao Planalto. “Ficaria muito difícil o Eduardo ser candidato para presidente em um partido e eu ficar apoiando outro candidato. Então, possivelmente, eu tenha que fazer a migração para um partido que vá apoiar o Eduardo”, afirma.
Leite enfrenta, contudo, um dilema nesta janela partidária: ele vem sendo apontado pelo eleitor gaúcho como forte candidato à reeleição ao governo local. Uma pesquisa do Instituto Real Time Big Data aponta Leite liderando com 25% da preferência do eleitoral. Se optar por essa via e conseguir a recondução, ele seria o primeiro governador reeleito no estado desde que a reeleição começou em 1998.
Pesa contra a decisão o sonho de concorrer ao Planalto como terceira via entre Bolsonaro e Lula, a disputa entre PSDB e PSD e o compromisso assumido em 2018 de não disputar a reeleição. A promessa colocou Ranolfo na linha de sucessão. “Embora a atuação do governo seja excelente, ele (Eduardo) cada vez mais se afasta dessa hipótese”, argumenta o vice.
Debandada nas prefeituras
Os prefeitos cogitados para postular governos estaduais são os de Aracaju, Edvaldo Vieira Filho (PDT-SE); Belo Horizonte, Alexandre Kalil (PSD-MG); Campo Grande, Marquinhos Trad (PSD-MS); Cuiabá, Emanuel Pinheiro (MDB-MS); Florianópolis, Gean Loureiro (DEM-SC); Maceió, João Henrique Caldas (PSB-AL), conhecido como JHC; e de Natal, Álvaro Costa Dias (PSDB-RN).
Com exceção de JHC e Dias, os demais estão no segundo mandato. Justamente por isso, a candidatura deles é vista como menos provável. O alcaide de Maceió, porém, tem a seu favor o fato do atual governador Renan Calheiros Filhos (MDB) estar em fim de mandato.
O governador alagoano enfrenta um problema doméstico: ele não tem um vice-governador. O ex-vice Luciano Barbosa (MDB) abandonou o cargo após se eleger prefeito de Arapiraca. Sem vice, caso renuncie, o presidente do Tribunal Regional Eleitoral (TRE) deve assumir por 30 dias e convocar uma eleição indireta para escolha de um dos integrantes da Assembleia Legislativa.
Renan Filho trabalha para o deputado estadual emedebista Paulo Dantas ser escolhido entre seus pares para o mandato-tampão, com direito a concorrer à reeleição ao governo com apoio dos Calheiros. “Está sendo construída essa transição”, diz o senador Renan Calheiros.
O clã Calheiros não assume publicamente, mas teme a ascensão de um oponente com disposição de travar o uso da máquina estatal na candidatura do atual governador.
A construção de uma chapa de oposição ganhou fôlego após o presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), manobrar junto com o União Brasil para tentar viabilizar um governador-tampão na Assembleia, cuja maioria segue fiel a Renan Filho. Lira também estimula JHC a disputar o comando do Palácio Floriano Peixoto.
A vaga em disputa por Alagoas para o Senado será a do ex-presidente Fernando Collor (PROS), que desde 2007 é senador pelo estado.
Eleições em Minas Gerais e Sergipe
Lupi, presidente nacional do PDT, afirma que Edvaldo Vieira Filho tem disposição de abandonar o segundo mandato à frente da prefeitura de Aracaju para concorrer ao governo de Sergipe. “Ele tem chance de ser candidato”, diz.
Já o prefeito de Belo Horizonte segue indeciso. Kalil, que está no PSD, é cortejado pelo PT para concorrer contra o governador Romeu Zema (NOVO). Com aprovação na casa dos 75% na capital mineira, ele consolidaria um palanque forte para Lula no segundo maior colégio eleitoral do país, com 15,5 milhões de votantes. Zema apoiará Bolsonaro.
O problema é que Kalil aparece nas pesquisas indo para o segundo turno contra Zema, mas com projeção de derrota por até 20%. A diferença reflete o distanciamento da capital em relação ao interior de Minas, estado com mais municípios no país (853).
O que é a janela partidária
A “janela partidária” é o período em que deputadas e deputados federais, estaduais e distritais poderão trocar de partido para concorrer ao pleito deste ano sem perder o mandato.
A janela partidária ocorre todo ano em que há eleições. E nada mais é do que um prazo de 30 dias para que parlamentares possam mudar de legenda sem perder o mandato vigente. Esse período acontece seis meses antes do pleito.
A regra da janela partidária foi regulamentada pela Reforma Eleitoral de 2015 (Lei nº 13.165/2015) e se consolidou como uma saída para a troca de partido. A normatização veio após a decisão do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) segundo a qual o mandato pertence à agremiação, e não ao candidato eleito. A decisão do TSE estabeleceu a fidelidade partidária para os cargos obtidos nas eleições proporcionais (deputados e vereadores). A regra também está prevista na Emenda Constitucional nº 91/2016.