Paulo Peressin

João Gazzi

Sempre que a legislação não versa sobre um tema em específico, abre-se margem para a discussão sobre a legalidade (ou não) de condutas ligadas ao assunto, o que exige, em muitos casos, a consulta a outras fontes do Direito.
Por vezes, se apresenta de um lado um costume, uma prática nascida e forjada na sociedade, a qual vai se adaptando e passa a encarar dada conjuntura como normal e regular, enquanto, do outro lado, as cortes são instadas a se manifestar sobre legalidade e adequação de certas práticas.
O <a href="https://www.jota.info/tudo-sobre/direito-do-trabalho">Direito do Trabalho</a> é seara fértil para discussões muito acirradas quando se trata de aquilatar práticas cotidianas nas relações laborais com aquilo que a lei, a doutrina e a jurisprudência consideram adequado. Nesse contexto, um tema de relevância ímpar, mas não muito falado no cotidiano de discussões jurídicas e de rotinas trabalhistas, consiste na taxa negocial cobrada pelo sindicato profissional diretamente do empregador.
Antes de tratarmos sobre este tema, em específico, lembramos que existem três principais contribuições sindicais (em sentido amplo) previstas no ordenamento jurídico brasileiro, quais sejam:  a contribuição sindical, correspondente a um dia de trabalho, a ser descontada dos trabalhadores da categoria no mês de março de cada ano, cuja obrigatoriedade de pagamento foi revogada com a <a href="https://www.jota.info/tudo-sobre/reforma-trabalhista">reforma trabalhista</a>, em 2017; a contribuição confederativa, cuja previsão veio à tona com a <a href="https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicao.htm">Constituição Federal de 1988 (CF/88)</a>, com vistas a manter o custeio do sistema confederativo de representação sindical; e a contribuição assistencial, a qual passou a ser implementada pelos sindicatos com maior regularidade após o advento da CF/88, tendo em vista a autonomia e liberdade garantida aos sindicatos para promoverem sua auto-organização.
Essa última, a princípio, tratava-se de contribuição direcionada apenas aos filiados das entidades sindicais, com o objetivo maior de custear as negociações coletivas entabuladas pelas entidades sindicais. Em 2023, porém, o STF reconheceu a possibilidade de cobrança compulsória da contribuição assistencial de todo e qualquer trabalhador integrante da categoria profissional, ainda que não filiado, desde que seja garantida a oposição ao pagamento, o que ainda provoca discussões e é objeto não apenas de manifestação jurisdicional definitiva (ainda pendente) mas, também, de Projeto de Lei específico (<a href="https://www25.senado.leg.br/web/atividade/materias/-/materia/136725">PL 2830/2019</a>).
Percebe-se, portanto, que há lacuna legislativa a respeito da chamada taxa negocial.
É fato que a expressão “taxa negocial” é frequentemente utilizada como sinônimo de “contribuição assistencial”. Todavia, são institutos distintos, até mesmo porque a prática cotidiana e os longos anos de experiência na assessoria jurídica prestada a empresas dos mais variados setores nos permitem compreender que a tal “taxa negocial” é, muitas vezes, apresentada como um instituto próprio pelos sindicatos, desvinculado das demais contribuições.
Essa taxa – que por vezes também é apresentada sob outra nomenclatura – consiste em cobrança realizada pelo sindicato profissional diretamente à empresa empregadora, justificada, na maioria das hipóteses, como condição para a assinatura de Acordos Coletivos de Trabalho (ACT) ou para a própria manutenção do bom relacionamento entre o empregador e o sindicato. A taxa pode ou não constar de instrumento coletivo, sendo comum que seja pretendida de maneira informal pelo sindicato e seus representantes, quase que como um requisito lateral para selar o “de acordo” da entidade em épocas de negociação.
É curioso como a prática se difundiu de tal forma que passou a ser tratada com certa normalidade. Não raro, deparamo-nos com questionamentos de empresas que buscam confirmar a melhor forma de conduzir o pagamento da tal taxa negocial em benefício do sindicato laboral, ficando evidente a naturalidade com a qual tratam o assunto, por vezes sob a justificativa de que o pagamento já é realizado há anos ou mesmo décadas.
Não deveria surpreender a todos o fato de a jurisprudência brasileira, sedimentada há pelo menos 30 anos no tocante a este assunto, considerar ilegal qualquer pagamento realizado diretamente pelo empregador ao sindicato da categoria profissional.
O principal fundamento que costuma ser ponderado em decisões que discutem tal temática é o fato de a cobrança de taxas pela entidade sindical profissional das empresas retirar-lhe a liberdade e autonomia necessárias para que conduza suas ações em efetivo benefício dos trabalhadores.
Já em 1949, ano em que a Organização Internacional do Trabalho (OIT) implementou a Convenção 98, posteriormente incorporada ao ordenamento jurídico brasileiro pelo Decreto Legislativo 49 de 1952, fazia-se referência acerca do tema com a proibição de todo e qualquer ato de ingerência pela empresa que, em última instância, culmine na dominação do sindicato pelo empregador ou grupo de empregadores, inclusive a partir da utilização de meios financeiros, de forma a controlar as ações sindicais.
O TST, ao longo dos anos, sempre referenciou e referendou a aplicação da Convenção 98, ponderando, ainda, que qualquer forma de custeio, pelo empregador, das entidades sindicais laborais afronta princípios basilares de organização sindical, sobretudo o mais importante deles, qual seja a fiel representação dos interesses da categoria profissional pelo sindicato.
Além disso, em 2007, durante a 1ª Jornada de Direito do Trabalho pela Escola Nacional da Magistratura do Trabalho (Enamat), realizada pelo TST e pela Associação Nacional dos Magistrados da Justiça do Trabalho (Anamatra), foi firmado o Enunciado 27, do qual constou a proibição de cláusula normativa que preveja o financiamento das atividades sindicais pelo empregador, a partir da transferência de recursos sem a correspondente dedução da folha de pagamento dos empregados.
De se notar, portanto, que não houve alteração a respeito da ilegalidade da cobrança de taxa negocial, a ser paga pelo empregador, por parte do sindicato laboral com o passar dos anos, embora essa prática siga sendo normalizada no cotidiano das relações coletivas de trabalho.
Todavia, deve-se buscar coibir essa prática, não só para que tal costume tenha sua ilegalidade devida e progressivamente reconhecida, mas, ainda, para evitar a imputação de responsabilidade às empresas quanto à caracterização de condutas antissindicais, as quais podem ser alvo de fiscalizações pelo Ministério Público do Trabalho e objeto de Ações Civis Públicas.
Ademais, acordos e convenções coletivas que tenham sido firmados mediante repasse de valores por parte dos empregadores aos sindicatos laborais podem ser objeto de questionamento e anulação perante o Judiciário, o que reforça ainda mais a necessidade de cuidado e adequação de postura das empresas que, eventualmente, ainda se deparem com esse tipo de situação.

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JOTA

Taxa negocial cobrada pelo sindicato laboral diretamente dos empregadores

A cobrança de taxa negocial pelo sindicato ao empregador é ilegal, segundo jurisprudência e a Convenção nº 98 da OIT

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