Bruno Polonio Renzetti

Lucas Griebeler da Motta

Na sexta-feira, dia 11/06, foram apresentadas cinco novas propostas legislativas no Congresso americano, todas elas com foco em aspectos relacionados a grandes empresas de tecnologia, notadamente Google, Amazon, Facebook e Apple. Os projetos de lei possuem como principal articulador o deputado David Cicilline de Rhode Island, presidente do subcomitê responsável por questões antitruste na Câmara dos Deputados.
Apesar de ser um congressista democrata, Cicilline conta com apoio bipartidário em recentes movimentos mais enérgicos voltados para o setor de tecnologia, o que demonstra a importância do tema principalmente após a divulgação do <a href="https://int.nyt.com/data/documenttools/house-antitrust-report-on-big-tech/b2ec22cf340e1af1/full.pdf" target="_blank" rel="noopener noreferrer">Relatório do Congresso sobre Big Techs</a>, publicado em outubro de 2020. Os projetos de lei da semana passada representam o resultado de muitas das sugestões registradas no relatório do 2020.
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O impacto no mercado buscado pelos projetos de lei pode ser verificado já nos nomes com que cada projeto foi batizado. A proposta que versa sobre a não-discriminação de produtos de terceiros em plataformas digitais recebeu o nome de “<a href="https://cicilline.house.gov/sites/cicilline.house.gov/files/documents/American%20Innovation%20and%20Choice%20Online%20Act%20-%20Bill%20Text.pdf" target="_blank" rel="noopener noreferrer">Lei para a Inovação e Escolha Americana</a>”. A proposta que trata sobre atos de concentração envolvendo plataformas digitais é apelidada de “<a href="https://cicilline.house.gov/sites/cicilline.house.gov/files/documents/Platform%20Competition%20and%20Opportunity%20Act%20-%20Bill%20Text%20%281%29.pdf" target="_blank" rel="noopener noreferrer">Lei para a Oportunidade e Competição entre Plataformas</a>”. Além disso, há a “<a href="https://cicilline.house.gov/sites/cicilline.house.gov/files/documents/ACCESS%20Act%20-%20Bill%20Text%20%281%29.pdf" target="_blank" rel="noopener noreferrer">Lei para o Aumento da Compatibilidade e Competitividade pela Possibilidade de Troca</a>”, a qual aborda o tema da interoperabilidade entre plataformas. Por fim, há a “<a href="https://cicilline.house.gov/sites/cicilline.house.gov/files/documents/Ending%20Platform%20Monopolies%20-%20Bill%20Text.pdf" target="_blank" rel="noopener noreferrer">Lei para o fim dos Monopólios das Plataformas</a>” – talvez a proposta legislativa que tenha o discurso mais forte.
Em razão da limitação de escopo e espaço deste artigo, não serão abordadas todas as particularidades de cada proposta legislativa. Por essa razão, escolhemos discorrer especificamente sobre a Lei para a Oportunidade e Competição entre Plataformas e seus impactos nas aquisições feitas por big techs. Entendemos o tema pertinente e oportuno em razão da recente publicação de <a href="https://www.dataprivacybr.org/wp-content/uploads/2021/05/dpbr_relatorio_data_driven_mergers_vf.pdf" target="_blank" rel="noopener noreferrer">estudo do Data Privacy Brasil</a>, em que foram analisadas aquisições centradas em dados que sequer foram notificadas à autoridade concorrencial brasileira. Referido estudo propõe novo critério de notificação que poderia ser complementado com base em nuances semelhantes aos utilizados no projeto de lei que comentaremos.
Tal projeto de lei tem como objetivo impedir aquisições de ativos e participações societárias em concorrentes por parte de plataformas específicas, que seriam definidas como “Plataformas Abrangidas”. De acordo com o texto da proposta, uma Plataforma Abrangida seria aquela que se enquadra em três critérios cumulativos: (i) ter pelo menos 50 milhões de usuários mensais ativos ou pelo menos 100 mil usuários comerciais (i.e., usuários que utilizam a plataforma para ofertar produtos e serviços) nos EUA; (ii) ser controlada por uma entidade com mais de 600 bilhões de dólares em capitalização de mercado ou vendas anuais; e (iii) ser considerada como um “Parceiro Comercial Crucial”, definido como uma entidade capaz de prejudicar um usuário comercial ao restringir ou impedir o acesso a clientes finais ou às ferramentas necessárias para atender aos clientes finais.
O interessante dessa proposta é que ela não leva em consideração apenas critérios tradicionais de faturamento para caracterizar um agente econômico como “Plataforma Abrangida”.  Isso representa uma evolução no entendimento sobre a dinâmica do modelo de negócios das big tech, que muitas vezes oferecem produtos e serviços gratuitos a milhões de usuários, inclusive no Brasil. A princípio, a adição de filtros adicionais inspirados na proposta americana poderia resolver um problema significativo no Brasil, que é a não-notificação de atos de concentração relevantes no mercado de tecnologia.
<blockquote class="jota-article__eye">Como sabido, medidas de faturamento têm sido historicamente utilizadas como o principal parâmetro para verificar se um ato de concentração deve ou não ser analisado pelas autoridades concorrenciais, como é o caso do Brasil nos termos do art. 88 da Lei nº 12.529/2011.</blockquote>
Justamente em razão da adoção desse parâmetro, plataformas digitais relevantes que possuíam, já à época da operação, massa crítica de usuários (como Instagram e WhatsApp, por exemplo), foram adquiridas sem que autoridades concorrenciais, incluindo a do Brasil, se pronunciassem sobre o tema. Esses casos são especialmente importantes quando tratam da aquisição de concorrentes nascentes ou potenciais, estratégia também chamada de killer acquisitions para expansão do crescimento e da influência em diferentes mercados por parte de plataformas dominantes.
Ano passado, estudantes de Yale fizeram um <a href="https://som.yale.edu/faculty-research-centers/centers-initiatives/thurman-arnold-project-at-yale/digital-platforms-and-antitrust" target="_blank" rel="noopener noreferrer">mapeamento</a> das aquisições realizadas por Google e Facebook nos últimos dez anos. Esse mapeamento constatou que mais de 200 entidades foram adquiridas. Os setores envolvidos variam, mas a maioria diz respeito a empresas do mercado de tecnologia – além disso, a maior parte dessas operações não foi notificada por não se enquadrar nos critérios tradicionais de submissão de atos de concentração. Com a nova definição de Plataforma Abrangida, essa falha legislativa seria consertada nos Estados Unidos.
A proposta legislativa americana está aparentemente alinhada com discussões acadêmicas e com a publicação de diversos relatórios de especialistas nos últimos anos. É salutar ver que legisladores estão acompanhando o assunto de uma perspectiva técnica. Essa tendência não está limitada apenas aos Estados Unidos, visto que a Europa está discutindo a Lei dos Mercados Digitais (Digital Markets Act, ou DMA), que impõe um novo padrão de comportamento para plataformas definidas como gatekeepers, que passariam a ter obrigações de interoperabilidade e tratamento isonômico em relação a produtos e serviços oferecidos por terceiros dentro da plataforma do gatekeeper.
Da mesma forma que o DMA possui alvos claros para diversas de suas obrigações (vide <a href="https://voxeu.org/article/european-commission-digital-markets-act-translation" target="_blank" rel="noopener noreferrer">artigo</a> de Cristina Caffarra e Fiona Scott Morton sobre o tema), a proposta americana também parece ter plataformas específicas como alvo, <a href="https://www.politico.com/news/2021/06/15/big-tech-house-antitrust-changes-494506" target="_blank" rel="noopener noreferrer">tais como as empresas do acrônimo GAFAM – Google, Apple, Facebook, Amazon e Microsoft.</a>
Ainda que a vanguarda esteja principalmente situada nos ambientes europeu e norte-americano, recentes publicações acadêmicas no Brasil tratam sobre os assuntos abordados pelas propostas em discussão no Congresso dos Estados Unidos. Exemplo disso é a <a href="https://bibliotecadigital.fgv.br/dspace/handle/10438/30031" target="_blank" rel="noopener noreferrer">obra da Fundação Getúlio Vargas</a>, que conta com dez artigos que explicam conceitos e especificidades dos mercados digitais e que também conversam com parte das propostas legislativas brevemente abordadas neste artigo. Trata-se de publicação cuja análise por autoridades brasileiras é encorajada para que em breve possamos ter iniciativas similares em nosso país, que é um dos principais mercados do planeta.
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big tech

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JOTA

Projetos de lei possuem como principal articulador o deputado David Cicilline de Rhode Island, presidente do subcomitê responsável por questões antitruste

A proposta americana para impedir os atos de concentração das Big Tech

Foram apresentadas cinco novas propostas legislativas no Congresso americano, relacionadas a grandes empresas de tecnologia