Murilo Meneghetti Nassif

A política pública de assistência farmacêutica, parte integrante da PNS – política nacional de saúde, tem como um dos objetivos garantir o acesso a medicamentos e insumos para toda população e promover a melhoria das condições de saúde das pessoas.
Está fundada nas normas constitucionais, nas Leis Federais nº <a href="http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l8080.htm">8.080/90</a> e <a href="http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/L8142.htm">8.142/90</a>, além de portarias e resoluções específicas que, de forma fragmentada, estruturam todo o arcabouço jurídico da PNS. Como parte integrante da PNS e dos objetivos do SUS foi criada, em 1988, a política nacional de medicamentos que tem, nas principais diretrizes, a adoção de uma relação de medicamentos essenciais considerados básicos e indispensáveis para atender a maioria dos problemas de saúde da população brasileira.
São fatores críticos de sucesso e efetividade de uma política de assistência farmacêutica e de uma política pública de medicamentos – em um pais com tamanha extensão territorial, desigualdades sociais e assimetria de informação –, o correto acesso ao medicamento pelo paciente, com qualidade, segurança e eficácia, além da efetiva participação da sociedade civil, especialmente dos profissionais de saúde, instituições acadêmicas, científicas e órgãos de controle.
<a href="http://conteudo.jota.info/saude" rel="attachment wp-att-266195"><img class="aligncenter wp-image-266195 size-full" src="https://www.jota.info/wp-content/uploads/2020/08/whatsapp-image-2020-08-12-at-15-31-05.jpeg" sizes="(max-width: 312px) 100vw, 312px" srcset="https://www.jota.info/wp-content/uploads/2020/08/whatsapp-image-2020-08-12-at-15-31-05.jpeg 312w, https://www.jota.info/wp-content/uploads/2020/08/whatsapp-image-2020-08-12-at-15-31-05-267x300.jpeg 267w" alt="" width="312" height="350" /></a>
A busca pela efetividade dessas políticas públicas se torna ainda mais desafiadora quando novos medicamentos são descobertos e passam a ser considerados indispensáveis no atendimento do cidadão, como é o caso dos medicamentos biológicos, em especial os de alto valor agregado.
O medicamento biológico é resultado de complexa tecnologia. Tanto pela utilização de organismos e sistemas vivos para sua produção – ex. vírus, bactérias, células animais, vegetais –quanto pelo processo produtivo industrial. É um produto farmacêutico que trouxe soluções inéditas para inúmeras patologias, revolucionando o tratamento de muitas doenças e melhorando a saúde e qualidade de vida de pacientes no tratamento de doenças graves, raras e autoimunes.
Dada toda a complexidade que é intrínseca ao biológico – como por exemplo o fato de que os biológicos são copiados apenas por semelhança e não por identidade – e ciente dos benefícios e desafios que esse medicamento trouxe ao SUS, o Ministério da Saúde, em <a href="http://www.saude.gov.br/images/pdf/2018/outubro/19/PORTARIA-N-1160-DE-3-DE-MAIO-DE-2018.pdf">2018</a><a href="#_ftn1" name="_ftnref1">[1]</a>, instituiu um grupo de trabalho para discutir e formular uma política nacional de medicamentos biológicos no âmbito do SUS. O <a href="https://portalarquivos2.saude.gov.br/images/pdf/2019/setembro/30/Relatorio-final-GT-Bio.pdf">relatório final</a> produzido pelo grupo de trabalho, divulgado em setembro de 2019, trouxe a proposta de criação de diretrizes básicas a serem observadas para a instituição desta política.
Entre as diretrizes básicas do relatório está a necessidade de aprimoramento da regulamentação, com recomendação de elaboração de atos normativos relativos à <a href="http://portal.anvisa.gov.br/documents/33836/4095801/Nota+de+esclarecimento+003+de+2017+-+Medicamentos+Biol%C3%B3gicos/0774f2d7-5c83-45b7-832d-37efdf21790c">intercambialidade</a><a href="#_ftn2" name="_ftnref2">[2]</a> de medicamentos biológicos, a partir de evidências científicas disponíveis, prevalecendo a segurança do usuário, o interesse público e a ampliação do acesso.
O relatório ainda apontou: (i) a necessidade de fomentar a implantação de centros de terapias assistidas para medicamentos biológicos no âmbito do SUS, de modo a promover melhoria nos processos de armazenamento, distribuição, dispensação e uso; (ii) a necessidade de integrar as informações clínicas dos pacientes à base nacional de dados de ações e serviços da assistência farmacêutica, para permitir a gestão da informação e qualificação do monitoramento da segurança e efetividade do uso de medicamentos biológicos; (iii) a promoção e acompanhamento farmacoterapêutico dos pacientes que utilizam medicamentos biológicos como estratégia para estimular a racionalidade da terapia e monitoramento clínico dos pacientes.
Fatores de ameaça para a implementação de uma política nacional de biológicos também foram apontados no relatório. Dentre outras ameaças apontadas estão: a influência da judicialização da saúde no acesso e implementação de diretrizes assistenciais no SUS, a escassez de dados sobre imunogenicidade e estudos de intercambialidade e limitações da legislação sobre compras públicas na aquisição de biológicos sem, contudo, indicar quais seriam essas limitações legais de forma concreta.
Apesar de oportunidades de melhoria na legislação de compras públicas, não parece ser correto afirmar que a lei é um limitador para a correta aquisição do medicamento biológico. Essa suposta limitação está muito mais ligada a um dogma criado em relação à Lei nº 8.666/93, de supervalorização da licitação, que está enraizada em análises principiológicas<a href="#_ftn3" name="_ftnref3">[3]</a>. Essa limitação não está na legislação, mas, no fato de o gestor público não ter o devido conhecimento sobre o medicamento biológico e suas complexidades (em especial da intercambialidade que pode afetar a saúde e segurança do paciente), além do receio – por vezes infundado – de órgãos de controle.
Tal conclusão é extraída do campo prático. Basta analisar, na seara administrativa, as diversas manifestações proferidas pelos gestores públicos em respostas à pedidos de esclarecimentos e decisões de impugnações de editais de compras de medicamentos biológicos. A quase totalidade das manifestações exaradas são meras retóricas e com conceitos jurídicos puramente abstratos, que não levam em consideração normas, orientações e estudos técnicos vigentes.
Que se mostram lacradas ao diálogo sem ideologias e que, como consequência prática e lógica, está criando conflitos – inclusive com o aumento da judicalização da saúde – ao invés de fomentar e buscar um diálogo institucional e saudável com toda a sociedade civil, sobre o tema.
Dado que a introdução de medicamentos biológicos no país (especialmente as cópias), está aumentando e continua sendo fator crítico de sucesso e de efetividade de uma política de assistência farmacêutica e de uma política pública de medicamentos, urge ao país avançar nas discussões sobre uma política nacional de medicamentos biológicos em busca da saúde e qualidade de vida dos pacientes, além da eficiência e sustentabilidade do SUS.
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<a href="#_ftnref1" name="_ftn1">[1]</a> Portaria GM/MS nº 1.160/2018.
<a href="#_ftnref2" name="_ftn2">[2]</a> Por intercambialidade entende-se a circunstância em que dois produtos farmacêuticos podem ser trocados um pelo outro, sem que essa troca gere risco significativo para a eficácia e segurança do tratamento do paciente.
<a href="#_ftnref3" name="_ftn3">[3]</a> Vide Rosilho, André Janjácomo. Qual é o modelo das licitações no Brasil? As reformas legislativas federais no sistema de contratações públicas – 2011. Dissertação de mestrado disponível em: &lt;<a href="http://bibliotecadigital.fgv.br/dspace/bitstream/handle/10438/8824/20111018%20-%20Vers%c3%a3o%20Final%20Disserta%c3%a7%c3%a3o%20%28dep%c3%b3sito%29%20.pdf?sequence=5&amp;isAllowed=y">http://bibliotecadigital.fgv.br/dspace/bitstream/handle/10438/8824/20111018%20-%20Vers%c3%a3o%20Final%20Disserta%c3%a7%c3%a3o%20%28dep%c3%b3sito%29%20.pdf?sequence=5&amp;isAllowed=y</a>&gt;.

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JOTA

Biológicos são para melhorar a saúde e qualidade de vidas das pessoas, não para criar conflitos e judicialização


Política nacional de medicamentos biológicos no SUS

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