Flávio de Haro Sanches

No litígio tributário é comum pedidos de liminares para o fim de afastar a necessidade de pagamento de tributos. São inúmeras as teses tributárias, muitas das quais respaldadas em sólidos argumentos jurídicos, a justificar a determinação judicial, também conhecida como norma individual e concreta. Pois bem, especial efeito merece atenção quando a ordem judicial está relacionada a um tributo com previsão de retenção pela fonte pagadora. Ou seja, o tributo tem o seu recolhimento realizado por pessoa diversa do sujeito passivo da obrigação tributária.
Diante de uma ilegalidade ou inconstitucionalidade, o contribuinte, ou mesmo o responsável, demanda o Poder Judiciário, buscando afastar a cobrança do tributo que entende indevido. Se o juiz acolhe um pedido de liminar, eis que o fato gerador passa a contar com a suspensão da exigibilidade por força de ordem judicial, deixando de ser retido pela fonte pagadora, e, evidentemente também deixa de ser recolhido.
Anos se passam, os pagamentos passíveis de retenção se dão todos em valor bruto, e o responsável tributário sequer se beneficiou, pois o beneficiário contribuinte do que seriam os tributos então suspensos, é quem recebeu os valores brutos, nisso incluindo-se os tributos não retidos.
É neste ponto que deve ficar claro o fato de ser impraticável a cobrança perante o responsável (fonte pagadora), caso haja cassação da ordem judicial, em relação aos fatos geradores relacionados a pagamentos ocorridos durante a sua vigência.
Durante a vigência da norma individual e concreta, os atos jurídicos se mostraram perfeitos e acabados. A retenção não era prevista, e os pagamentos se deram de forma bruta. A capacidade econômica para efetuar os recolhimentos na eventualidade de os tributos se tornarem novamente devidos, recai exclusivamente, então, para os sujeitos passivos que já receberam os pagamentos.
Em relação às fontes pagadoras ocorre o fenômeno da satisfatividade de uma ordem judicial. Não é a satisfatividade pura em que uma vez gozada a liminar não teria como reaver o bem jurídico tutelado. Mas a satisfatividade parcial em relação à fonte pagadora, que esta sim, passados os fatos geradores no interregno do período de vigência da ordem judicial, deixa de ter a responsabilidade anteriormente prevista em lei. Nada obstante, o fisco pode e deve cobrar o contribuinte de direito.
A fundamentação legal deste efeito de satisfatividade se encontra no artigo 128 do CTN. O referido artigo prevê a possibilidade de a lei atribuir a responsabilidade de terceiros “vinculados ao fato gerador da respectiva obrigação”. Na medida em que a lei que institui a obrigação tributária é afastada temporariamente, a responsabilidade prevista no artigo 128 fica sem efeito justamente durante o período da ocorrência do fato gerador, inviabilizando, posteriormente, que se faça aplicação retroativa da obrigatoriedade de uma retenção que não correu em razão de estrito cumprimento de uma ordem judicial.
Isso ocorreu em algumas passagens de nosso cotidiano recente, a recordar: i) da contenda envolvendo a responsabilidade dos bancos por retenção da CPMF desafiada nos tribunais pelos clientes contribuintes; ii) da dispensa da retenção dos 11% na cessão de mão de obra, tal como previsto no art. 31 da Lei .8.212/91, com a redação da pela Lei nº 9.711/98; e, iii) do imbróglio envolvendo a obrigatoriedade de retenção do Funrural sobre a receita bruta proveniente da comercialização da produção rural.
A Receita Federal do Brasil, por meio de Perguntas e Respostas reiteradamente vem assim se pronunciando: 
306 - De quem é a responsabilidade pelo recolhimento do imposto quando a fonte pagadora fica impossibilitada de fazer a retenção por força de decisão judicial? 
Caso a decisão final confirme como devido o imposto em litígio, este deverá ser recolhido, retroagindo os efeitos da última decisão, como se não tivesse ocorrido a concessão da medida liminar. Nesse caso, não há como retornar a responsabilidade de retenção à fonte pagadora. O pagamento do imposto, com os acréscimos legais cabíveis, deve ser efetuado pelo próprio contribuinte, tanto em relação aos rendimentos sujeitos à tributação exclusiva na fonte, quanto aos sujeitos ao ajuste na declaração anual, valendo observar os termos previstos no Parecer Normativo Cosit nº 01, de 24 de setembro de 2002, em especial ao constante em seus itens 18 e 19. 
(Parecer Normativo Cosit nº 01, de 24 de setembro de 2002, itens 18 e 19)
É evidente que na hipótese em que se faz a retenção e subsequente depósito judicial, não há a satisfatoriedade de que tratamos acima. Nesta hipótese justamente a retenção se operou normalmente, constituindo relação jurídica diversa.
Há quem sustente que a tal satisfatividade não seria aplicável para as hipóteses em que o autor da ação fosse a fonte pagadora. Nos parece irrelevante. O STJ pacificou entendimento de que tanto fonte como sujeito passivo de um tributo têm legitimidade para propor uma ação relacionada à ilegalidade ou inconstitucionalidade de tributo passível de retenção.
Na medida em que a fonte decida por questionar o tributo na justiça, e obtenha ordem judicial dispensando da retenção e subsequente recolhimento, haverá norma individual e concreta provisória, de tal forma que o raciocínio se mantém, ou seja, não retido legalmente o tributo, e sendo realizado o respectivo pagamento do valor bruto que compreende o fato gerador que se quer tributar, ficará para sempre afastada a possibilidade de exigir-se a retenção da fonte albergada por ordem judicial.
Diante do exposto, é correto afirmar que um tributo não retido por força de ordem judicial que assim o determina, ou simplesmente o dispensa, por certo período, deixa de ser exigível daquele que afigura como responsável, na situação em que o tributo volta a ser devido.

Martello da Giudice

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JOTA

Caráter satisfativo da ordem que inibe retenções fiscais pode resolver passivo de fonte pagadora

Decisão que inibe retenções exime fonte pagadora

Caráter satisfativo da ordem que inibe retenções fiscais pode resolver passivo de fonte pagadora