Dalton Cesar Cordeiro de Miranda

Em exame recente de matéria processual administrativa tributária restou formalizado o acórdão 2201-003.216, cujo tema específico para o objeto de nossa análise restou assim vazado: “a apreciação de matéria objeto de recurso especial admitido pela Câmara Superior de Recursos Fiscais, torna definitiva todas as demais constantes do recurso voluntário ou de ofício, que não foram objeto do recurso especial.”
A impossibilidade de reexame de matéria transitada em julgado, por não provocação em apelo especial, segundo a relatoria do recurso então julgado, deveu-se ao fato de que a representação da Fazenda Nacional não teria pleiteado à Câmara Superior de Recursos Fiscais (CSRF) e ao Pleno do Tribunal Administrativo a revisão do tema “qualificação da multa”, mas tão somente a revisão da questão “decadência”.
Imperioso é apresentarmos de forma breve o debate encerrado na esfera administrativa para, daí sim, firmarmos posição em sentido contrário e sob o fundamento de que não ocorreu a definitividade de parte da decisão administrativa nos moldes em que sustentado.
Contra acórdão de câmara do então Primeiro Conselho de Contribuintes, cuja ementa informa a atração para a espécie da decadência e a desqualificação da multa agravada, temos a interposição, pela Fazenda Nacional e à CSRF, de recurso especial escorado na tentativa de afastar a decadência acolhida amparado no argumento de que “para contagem da decadência aquela constante no artigo 150, § 4°, do Código Tributário Nacional (CTN), contrariou as disposições dos artigos 149 e 173, inciso I, ambos do CTN, argüindo que o sujeito passivo ao omitir rendimentos, somente constatados através de ação fiscal, não poderia contar a decadência por outro dispositivo que não fosse aquele do artigo 173, inciso I, do mesmo diploma legal.”
Negado o apelo especial pelo Colegiado Superior consta informação de que a mesma matéria foi objeto de recurso extraordinário ao Tribunal Pleno do já Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (CARF), sendo que, na oportunidade, conclui-se pela revisão e reforma do julgado atacado com o consequente afastamento da decadência e o retorno dos autos à Câmara ordinária para exame das demais razões de recurso.
Destacamos que tal revisão e reforma deu-se com fundamento no artigo 62-A do então RICARF e com a adoção de discutível decisão proferida pelo Superior Tribunal de Justiça no REsp repetitivo 973.733.
Daí que sob o fundamento de que a representação da Fazenda Nacional, à CSRF, bem como ao Pleno do CARF, limitou-se a pleitear o “afastamento da decadência”, veio à decisão pela impossibilidade de enfrentamento da matéria quanto ao agravamento da multa, uma vez que não ventilada pela parte interessada.
Ocorre que, promovendo-se ao exame do acórdão recorrido por especial e de número 104-22253, temos que posicionamento diferente não poderia ter adotado a Procuradoria da Fazenda Nacional, uma vez que foi a “decadência” acolhida que consolidou a extinção do direito à constituição de todo crédito tributário.
A confusão que ora se apresenta quanto ao possível trânsito em julgado administrativo deu-se, talvez, por força da pouca tecnicidade na formalização do acórdão 104-22523, ou, mais ainda, no excesso de zelo à época do então conselheiro julgador em deixar consignado algo que era até dispensável de tratamento, tanto na ementa, e em especial na parte dispositiva daquela decisão, já que, repita-se, todo o crédito tributário fora extinto pela atração da decadência.
E assim afirmamos em razão de que na assentada em que reconhecida a decadência e afastada a multa qualificada, o exame destas matérias deu-se em ordem invertida – e não poderia ser diferente – para que a exigência do crédito fosse declarada insubsistente; ou seja, primeiro o relator promoveu ao afastamento da qualificação da multa para só então promover a atração da decadência ao feito com fundamento no artigo 150, § 4º do CTN, caso contrário, observável seria a disposição do artigo 173, I também do CTN.
Naquele acórdão 104-22253 e às folhas 30, o então conselheiro julgador expressamente consigna que, após tecer longo arrazoado sobre a multa agravada, “da desqualificação da multa de ofício levanto a preliminar de decadência do direito de a Fazenda Pública constituir crédito tributário relativo ao fato gerador lançado,”.
Forçoso é concluir que uma vez afastada a qualificação da multa pelo entendimento de que não houvera a prática de simulação, dolo ou fraude, o tema decadência, preponderante que era para o exame da legitimidade do crédito exigido, tornou-se o único e principal tema prejudicial da exigência do crédito reclamado.
Ora, como poderia então a representação da Fazenda Nacional guindar em recurso especial e à CSRF matéria que restara prejudicada pela decadência?
Cremos que não poderia, pois o exame e atração da decadência para o afastamento de toda a exigência tributária culminou na prejudicialidade, ou melhor, na “canibalização” do tema referente à qualificação da multa; matéria essa que deveria sim ser revisitada pelo CARF, mesmo que para a manutenção da decisão anterior pela sua desqualificação, pois imperioso é recordar que a revisão e reforma para o afastamento da decadência ocorreu pela aplicação de decisão do STJ, que, frisamos, passa ao longe e ao largo de análise de qualificação de multa.
E mais, o colegiado Pleno do CARF andou bem ao determinar o retorno dos autos para o julgamento das demais razões de recurso, em preservação às instâncias administrativas de julgamento e suas competências, e entre elas, sim, a qualificação da multa que, observamos, não transitou em julgado por impossibilidade de em momento processual específico e à CSRF, reclamar matéria que estava prejudicada; pois, uma vez extinto o direito à exigência de todo o crédito pela decadência, insubsistente era a exigência de qualquer multa.
Assim, concluímos que não houve o trânsito em julgado administrativo para o exame da “multa qualificada”, matéria que, em havendo tempo e pelos recursos próprios, deverá a parte interessada reclamar sua revisitação pelo CARF.
Encerramos este breve expediente com transcrição de texto de Frederico Jose Correa (22:1878), lançado em seu “Um livro de crítica”, no sentido de que “ninguém obterá de mim louvores imerecidos e nem além dos justos limites da verdade, (...). Mas, se procedo com esta severidade, também sou incapaz de faltar à justiça, nem mesmo a inimigos.”

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JOTA

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