Thiago Cássio D’Ávila Araújo

Tramita, na Câmara dos Deputados, o substitutivo apresentado pelo Deputado Federal Mauro Pereira ao Projeto de Lei (PL) nº 3.729, de 2004,<a class="sdfootnoteanc" href="#sdfootnote1sym" name="sdfootnote1anc">1</a> que pretende instituir a Lei Geral de Licenciamento Ambiental, dispor sobre a Avaliação Ambiental Estratégica (AAE) e dar outras providências, além de regulamentar o inciso IV do § 1º do art. 225 da Constituição Federal (CF/88). 
O atual texto do PL tem méritos, mas, em nossa opinião, ainda comporta melhoramentos, alguns dos quais apontamos neste artigo. 
Considerado o modelo jurídico atual, na licença prévia (LP) são estabelecidos requisitos e condicionantes a serem cumpridos em todas as fases do licenciamento ambiental, quais sejam, planejamento, instalação e operação (no modelo trifásico), o que, salvo melhor juízo, não está presente na redação do inciso XVI do art. 2º do mencionado PL. 
Em nossa opinião, não basta dizer que a LP “estabelece requisitos e condicionantes ambientais”, pois tal não a diferencia das outras licenças ambientais, quanto à projeção que a LP possui sobre todo o processo de licenciamento. 
Diante disso, parece-nos insuficiente o conceito de licença prévia que vem no art. 2º, inciso XVI, do projeto, como sendo a “licença que atesta, na fase de planejamento, a viabilidade ambiental de atividade ou empreendimento quanto à sua concepção e localização, e estabelece requisitos e condicionantes ambientais”. 
O Decreto nº 99.274, de 6 de junho de 1990, com melhor redação, dispõe que o Poder Público, no exercício de sua competência de controle, expedirá licenças, dentre elas a licença prévia, “na fase preliminar do planejamento de atividade, contendo requisitos básicos a serem atendidos nas fases de localização, instalação e operação, observados os planos municipais, estaduais ou federais de uso do solo”.<a class="sdfootnoteanc" href="#sdfootnote2sym" name="sdfootnote2anc">2</a> 
A LP vem definida, na Resolução CONAMA nº 237/1997, como aquela “concedida na fase preliminar do planejamento do empreendimento ou atividade aprovando sua localização e concepção, atestando a viabilidade ambiental e estabelecendo os requisitos básicos e condicionantes a serem atendidos nas próximas fases de sua implementação”.<a class="sdfootnoteanc" href="#sdfootnote3sym" name="sdfootnote3anc">3</a> 
Há inclusive condicionantes que devem ser fixadas, já na LP, para serem cumpridas, contínua ou intermitentemente, durante todo o licenciamento ambiental de empreendimento ou atividade, inclusive na fase de operação. Tais condicionantes surgem na LP e seguem sendo repetidas nas licenças subsequentes, com ou sem modificações. Se a LP, inclusive especificando-as, apontar a necessidade de que condicionantes dessa natureza sejam novamente mencionadas nas licenças seguintes, estará dando melhor cumprimento aos conceitos atuais de licença prévia, contidos nos dispositivos acima mencionados do Decreto nº 99.274/1990 e da Resolução CONAMA nº 237/1997, que são, efetivamente, mais robustos do que o conceito previsto para a LP, no momento, no projeto da Lei Geral de Licenciamento Ambiental. E, assim, a LP pode melhor cumprir seu perfil condutor de todo o processo de licenciamento ambiental. 
Vejamos o exemplo, no caso de empreendimento de grande impacto ambiental, da condicionante, prevista na LP, que venha a obrigar o empreendedor a criar, manter e constantemente atualizar uma página na Rede Mundial de Computadores (Internet), com o nome do empreendimento, estudos, licenças, relatórios, em atenção ao princípio da informação ambiental.<a class="sdfootnoteanc" href="#sdfootnote4sym" name="sdfootnote4anc">4</a> Não faz sentido que esta condicionante não se repita na LI e na LO. E a necessidade desta repetição de condicionante, nas licenças das fases subsequentes, já pode vir prevista na própria LP. 
O eminente jurista Talden Farias, ao comentar a fase preliminar de planejamento, do processo de licenciamento ambiental, leciona o seguinte: 
“É nessa fase que o empreendedor manifesta a intenção de realizar a atividade, devendo ser avaliadas a localização e a concepção do empreendimento, de maneira a atestar a sua viabilidade ambiental e a estabelecer os requisitos básicos para as próximas fases, devendo ser também elaborados os estudos de viabilidade do projeto. Após a análise, a discussão e a aprovação desses estudos de viabilidade, o órgão ambiental concederá a licença prévia, que por ser a primeira licença ambiental deverá funcionar como um alicerce para a edificação de todo o empreendimento.”<a class="sdfootnoteanc" href="#sdfootnote5sym" name="sdfootnote5anc">5</a>
Portanto, o inciso XVI do art. 2º do referido projeto de lei, na atual redação, no que toca ao conceito de “Licença Prévia”, melhor estaria apresentado se contemplasse requisitos e condicionantes a serem cumpridos durante todo o processo de licenciamento ambiental. 
Idêntica sugestão cairia bem, ainda, para a hipótese de licenciamento simplificado bifásico, no que toca à LP/LI (LP aglutinada à LI), já que a LP/LI também trará condicionantes a serem cumpridas em ambas as fases desse licenciamento ambiental simplificado (a segunda fase é a de operação, daí porque é chamado de “bifásico”), embora, e aqui já se tem outra lacuna a ser suprida, o PL não apresente, na versão atual, um conceito de “LP/LI”. 
Com efeito, apenas mencionar o fenômeno da “aglutinação de licenças” não resolve, juridicamente, as questões atinentes à essência normativa e à abrangência administrativa desta licença (LP/LI), que, afinal, é uma licença híbrida, não uma mera junção de licenças, já devendo merecer, só por isso, tratamento jurídico mais detalhado no referido projeto de lei.<a class="sdfootnoteanc" href="#sdfootnote6sym" name="sdfootnote6anc">6</a> 
Objetivamente: além de um conceito ter que ser oferecido, no projeto de lei, para a LP/LI (como também para a LI/LO), no caso específico da LP/LI este conceito deve, ainda, trazer a previsão de que, por meio dela, serão estabelecidos requisitos e condicionantes ambientais a serem cumpridos durante todo o licenciamento ambiental.
Para que a autoridade licenciadora possa definir, no Termo de Referência (TR), as licenças que poderão ser aglutinadas (LP com LI ou LI com LO), como previsto no § 1º do art. 15 da atual redação do projeto de lei, é de crucial importância que este contenha conceitos adequados, tanto para a LP, como para LP/LI e LI/LO, sobre os quais a autoridade licenciadora possa refletir, a fim de exercer, com segurança jurídica, a discricionariedade técnica e a discricionariedade administrativa que permeiem as questões pontuais de cada caso concreto, bem como possa fundamentar apropriadamente a decisão administrativa que vier a tomar.<a class="sdfootnoteanc" href="#sdfootnote7sym" name="sdfootnote7anc">7</a> 
O PL poderia ter, também, melhor apresentação espacial dos conceitos. O propósito central da nova lei será disciplinar o “licenciamento ambiental”, mas seu conceito surge apenas no inciso XVII do art. 2º. A “licença ambiental” vem definida no inciso X, antes de “licenciamento ambiental”, quando aquela é ato emitido no âmbito deste, de modo que melhor seria se o conceito de licenciamento ambiental surgisse no texto do PL antes do conceito de licença ambiental (partindo-se, assim, do geral para o particular). 
Por sua vez, o conceito de “licença prévia” aparece no inciso XVI do art. 2º, depois que já foram definidas a “licença ambiental por adesão e compromisso” (inciso XI), a “licença ambiental única” (inciso XII), a “licença de instalação” (inciso XIII), a “licença de operação” (inciso XIV) e a “licença de operação corretiva” (inciso XV). Melhor seria que “licença prévia” fosse a primeira espécie de licença a ser apresentada no texto do projeto de lei, logo após a definição de “licença ambiental”. 
Aliás, o PL já segue uma orientação estética apropriada, enquanto estruturação lógica das espécies de licença ambiental, na disposição que faz das mesmas nos incisos I a VI do art. 4º. Basta fazer o mesmo quanto aos conceitos previstos nos incisos do art. 2º do PL, a fim de melhor organizá-los. 
A distribuição espacial apropriada de elementos e institutos jurídicos não é questão apenas estética, mas que diz respeito também à facilitação da compreensão adequada das normas insculpidas no texto legal, mormente no que se refere ao encadeamento lógico das licenças, que, além de atos administrativos, são também símbolos, ou marcos, de fases do processo de licenciamento ambiental.
&nbsp;
--------------------------------
<div id="sdfootnote1">
<a class="sdfootnotesym" href="#sdfootnote1anc" name="sdfootnote1sym">1</a> E aos PLs nºs 3.957/2004, 5.435/2005, 358/2011, 1.700/2011, 2.941/2011, 5.716/2013, 5.918/2013, 8.062/2014, 1.546/2015, 3.829/2015 ,4.429/2016, 6.411/2016, 6.877/2017 e 7.143/2017. 
</div>
<div id="sdfootnote2">
<a class="sdfootnotesym" href="#sdfootnote2anc" name="sdfootnote2sym">2</a> Grifos nossos. Art. 19, caput e inciso I.
</div>
<div id="sdfootnote3">
<a class="sdfootnotesym" href="#sdfootnote3anc" name="sdfootnote3sym">3</a> Grifos nossos. Art. 8º, I. 
</div>
<div id="sdfootnote4">
<a class="sdfootnotesym" href="#sdfootnote4anc" name="sdfootnote4sym">4</a> Assegurado o sigilo comercial, industrial, financeiro ou qualquer outro sigilo protegido por lei, bem como o relativo às comunicações internas dos órgãos e entidades governamentais (Lei nº 10.650/2003, art. 2º, §§ 2º e 3º).
</div>
<div id="sdfootnote5">
<a class="sdfootnotesym" href="#sdfootnote5anc" name="sdfootnote5sym">5</a> FARIAS, Talden. Licenciamento ambiental: aspectos teóricos e práticos. Belo Horizonte: Fórum, 2017, 6ª ed., p. 73. Grifos nossos.
</div>
<div id="sdfootnote6">
<a class="sdfootnotesym" href="#sdfootnote6anc" name="sdfootnote6sym">6</a> Conferir, no projeto: art. 15, na íntegra; inciso I e caput do art. 14; incisos II e III do art. 5º e; caput e § 1º do art. 12. 
</div>
<div id="sdfootnote7">
<a class="sdfootnotesym" href="#sdfootnote7anc" name="sdfootnote7sym">7</a> PL, art. 15, § 1º: “A autoridade licenciadora definirá na emissão do TR as licenças que poderão ser aglutinadas, podendo ser a LP com a LI (LP/LI) ou a LI com a LO (LI/LO)”. O Termo de Referência (TR), por sua vez, está definido, no PL, no inciso XXII do art. 2º, como “documento único emitido pela autoridade licenciadora, que estabelece o conteúdo dos estudos a serem apresentados pelo empreendedor no licenciamento ambiental para avaliação dos impactos ambientais decorrentes da atividade ou empreendimento”.
</div>

riscos climáticos disclosure

https://images.jota.info/wp-content/uploads/2021/09/copy-of-jota-logo-high-cmyk.jpeg

JOTA

Licença prévia traz requisitos e condicionantes para todas as fases do licenciamento ambiental

Conceitos no PL da Lei Geral de Licenciamento Ambiental

Licença prévia traz requisitos e condicionantes para todas as fases do licenciamento ambiental