Leandro Cara Artioli

Felipe De Albuquerque Destri

Em meio à dinâmica sem precedentes das relações comerciais deste ano, o agronegócio pôde comemorar as medidas adotadas pelo Congresso Nacional contra a tentativa do Governo Federal de vedar o tratamento tributário mais favorável aos Créditos de Descarbonização previstos na Lei nº 13.576/17, os chamados “CBios”.
A medida foi celebrada pelo mercado em geral, como forma de estimular a emissão dos CBios e incentivar o desenvolvimento de um novo mercado de ativos ambientais do setor de combustíveis.
O presidente da República havia vetado o art. 15-A da Lei nº 13.986/20, o que poderia resultar na incidência de IRPJ e CSLL pela alíquota combinada de 34% sobre as operações com os CBios, reduzindo o incentivo à emissão desses ativos por produtores e importadores de biocombustíveis.
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A derrubada do veto pelo Congresso Nacional decorreu de um acordo amplamente discutido com associações do setor de combustíveis e líderes congressistas. Segundo o Governo, o veto se justificaria porque o regime especial de tributação implicaria renúncia de receitas, sem que houvesse redução de uma equivalente despesa obrigatória, o que não seria permitido pela Lei de Responsabilidade Fiscal. O entendimento dos congressistas, no entanto, foi o de que não haveria renúncia de receitas, uma vez que não existia expectativa de receita sobre as negociações desses novos títulos.
<blockquote class="jota-article__eye">Em linhas gerais, os CBios são emitidos pelos produtores ou importadores de biocombustíveis, com lastro nas notas fiscais de comercialização desses produtos.</blockquote>
Cabe à Agência Nacional do Petróleo (ANP) confirmar a existência de lastro suficiente, nos termos da legislação e regulamentação, autorizando a emissão dos CBios. Uma vez autorizado, o emissor deverá contratar um agente escriturador, quem emitirá o CBio.
O produtor/importador dispõe de até 60 dias da emissão das respectivas notas fiscais para solicitar a emissão do CBio, sob pena de decadência do direito de fazê-lo.
A negociação é feita no ambiente da bolsa de valores, cabendo ao próprio escriturador registrar as operações de compra e venda dos CBios. Não há prazo de vencimento para os certificados emitidos, os quais permanecem válidos até sua “aposentadoria” a pedido do investidor. As distribuidoras de combustíveis fósseis devem adquirir e aposentar os certificados a fim de cumprir com suas metas anuais de redução de emissões, conforme fixado em regulamentação.
Pois bem, do ponto de vista tributário, segundo o art. 15-A inserido na Lei nº 13.576/17, a receita decorrente da negociação dos CBios em mercados organizados está sujeita o imposto de renda exclusivamente na fonte pela alíquota de 15%. Consequentemente, a receita será excluída na apuração do IRPJ e da CSLL, tanto no lucro real quanto no presumido.
Ainda há previsão de que eventuais perdas auferidas nas negociações com os CBios não serão dedutíveis na apuração do lucro real. Ao tratar deste assunto, a lei falou apenas do lucro real, sem mencionar a base de cálculo da CSLL, o que pode gerar discussão sobre uma possível dedutibilidade das perdas na apuração desta contribuição.
Embora a lei não tenha tratado especificamente das demais pessoas jurídicas (não sujeitas ao lucro real ou presumido, como seria o caso dos optantes pelo Simples Nacional), parece-nos que a melhor interpretação dos dispositivos seria a de que tal receita também não deveria ser computada como “receita bruta”, garantindo o regime de tributação exclusiva na fonte.
A lei também não previu como essas operações seriam tributadas para fins das contribuições ao PIS e da Cofins, cabendo a cada pessoa jurídica avaliar se as receitas decorrentes das negociações dos CBios estariam compreendidas na base de cálculo dessas contribuições, conforme o regime de tributação aplicável em cada caso concreto. Em casos específicos, sobretudo de contribuintes sujeitos ao regime cumulativo, pode-se a argumentar que não haveria incidência dessas contribuições, a despeito da ainda controversa natureza jurídica das receitas decorrentes de operações com os CBios.
Para as distribuidoras de combustíveis fósseis que adquirirem os CBios e solicitarem sua aposentadoria, o custo incorrido com a aquisição dos certificados no mercado organizado deveria ser dedutível na apuração do IRPJ e CSLL como despesa operacional.
Além disso, a tributação pelo PIS e COFINS por parte dos produtores e distribuidores de combustíveis fósseis geraria a possibilidade de questionar a tomada de crédito das mesmas contribuições por parte dos distribuidores, em linha com o decidido pelo Superior Tribunal de Justiça à luz dos critérios da essencialidade ou relevância.
<blockquote class="jota-article__eye">Como dito, o novo mercado criado pelo Governo Federal tem por objetivo estimular a produção de biocombustíveis na matriz energética do país em detrimento dos combustíveis fósseis.</blockquote>
A Exposição de Motivos da medida provisória que foi convertida na Lei nº 13.986/20 é clara no sentido de que se pretende “promover aumento de eficiência e de produtividade na produção de biocombustíveis. Isso reduzirá custos e, consequentemente, de preços aos consumidores. Assim, os biocombustíveis serão crescentemente competitivos e, portanto, menos dependentes de instrumentos de política fiscal para a sua viabilização”.
A ideia por trás do tratamento acima descrito é louvável, mas ainda parece precisar de alguns ajustes normativos para fomentar de modo mais eficiente a produção dos biocombustíveis sem trazer prejuízos para os consumidores.
O regramento essencial que não está na legislação é a vinculação da receita decorrente da emissão originária dos CBios pelos produtores ou importadores à expansão ou modernização de suas atividades.
Pela atual redação da lei, os produtores e importadores não necessariamente reduzirão seus custos nem repassarão o benefício aos consumidores, podendo dispor livremente dessa receita adicional, distribuindo lucros, por exemplo. Apenas haveria a redução de custos se o valor arrecadado com a comercialização dos CBios fosse repassado no preço de venda da mercadoria para os distribuidores, que por sua vez repassariam ao varejista e consumidor final.
É por isso que a vinculação da receita com a emissão primária dos CBios a investimentos na atividade produtiva por meio da expansão ou implementação de empreendimentos econômicos seria benvinda. Nesses moldes, tal receita poderia até mesmo caracterizar-se como uma subvenção para investimento, cuja distribuição aos sócios seria vedada na forma do art. 30 da Lei nº 12.973/2014, melhor atingindo a finalidade da lei e com reflexos importantes na desoneração tributária.
Além disso, por questões mercadológicas, os biocombustíveis mantêm-se competitivos em relação aos combustíveis fósseis até a razão de 70% entre o preço dos primeiros em relação ao dos últimos. A majoração do custo dos distribuidores de combustíveis fósseis decorrente da aquisição dos CBios, na proporção de venda de combustível fóssil, pode resultar na majoração do preço destes combustíveis, abrindo espaço para aumento no preço do biocombustível, causando o efeito contrário ao pretendido pelo legislador e prejuízos aos consumidores.
É preciso encontrar mecanismos para reequilibrar essa relação, tendo-se em mente que eventual medida governamental impedindo o repasse do custo com as CBios pelos distribuidores de combustíveis fósseis no preço do combustível poderia implicar abuso de poder econômico ou interferência na livre concorrência.
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O episódio 46 do podcast Sem Precedentes discute se o contrato de trabalho intermitente é ou não constitucional. Ouça:
https://youtu.be/o8E3sXtx7j0
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JOTA

O incentivo ao desenvolvimento de um novo mercado de ativos ambientais do setor de combustíveis

A tributação dos Créditos de Descarbonização – CBios

O incentivo ao desenvolvimento de um novo mercado de ativos ambientais do setor de combustíveis