A Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) vai iniciar uma rodada de reuniões com representantes do governo e com parlamentares para mostrar a urgência da criação de vagas para a autarquia. “Caso isso não seja feito, dentro de dois ou três anos teremos uma falência na área de portos e aeroportos do país”, afirmou ao JOTA o diretor da Anvisa, Alex Machado Campos. “Se houver qualquer outro evento de saúde de dimensão internacional como o que enfrentamos com a Covid-19, não teremos como responder”, completou.
A área liderada por Machado Campos é a que deverá sofrer maior impacto com redução de quadros de funcionários nos próximos anos, caso novas vagas não sejam criadas. Em 2006, para auxiliar nas atividades da Anvisa, 1.300 colaboradores do governo foram reunidos para trabalhar na autarquia. O grupo passou a ser chamado de “específico”. Com o passar dos anos, no entanto, a grande maioria se aposentou. Atualmente, 330 permanecem em atividade. Todos trabalham em portos, aeroportos e fronteiras e representam 60% da força de trabalho do setor. Há também 220 servidores concursados, do quadro próprio. “Somente hoje, sete funcionários que eram do quadro de colaboradores se aposentaram”, disse o diretor, na entrevista concedida sexta (1/04).
A estimativa de Machado Campos é a de que, em cinco anos, mais da metade desta força de trabalho estará aposentada. “Por mais que a gente tenha inteligência regulatória, por mais que a gente tenha capacidade de lidar com dados, não há como dispensar colaboradores. Com contingente tão pequeno, será impossível trabalhar. A Anvisa é polícia administrativa. É ela que faz inspeção, lavra auto, pune empresas e todas essas atividades necessitam de profissionais qualificados.” O diretor faz uma comparação com a Administração de Drogas e Alimentos, autoridade sanitária dos Estados Unidos (FDA, na sigla em inglês). “Eles têm mais de 10 mil colaboradores. E a área regulada é menor.”
Apesar da redução da força de trabalho, a demanda aumentou de forma expressiva. Em 2020, por exemplo, a Anvisa concedeu 250 mil licenças de importação para medicamentos, alimentos e outros produtos sujeitos à vigilância sanitária. Em 2021, o número passou para 360 mil autorizações.
O diretor conta que a regulação foi alterada justamente para trazer maior rapidez aos processos. A lógica é norteada pela análise de risco. Empresas com selo premium podem ter uma análise simplificada. “Adotamos vários instrumentos de inteligência artificial para dar maior agilidade à importação. Seguimos uma tendência mundial. E isso impacta no ambiente econômico”, afirma o diretor. ”Produtos sujeitos à vigilância sanitária representam 22% do PIB”, completa. Quanto maior o tempo aguardando liberação, maior os gastos das empresas na armazenagem do produto.
Apesar do uso de dados e também, em alguns casos, de inspeção remota, a fiscalização também depende de funcionários. “Temos de ter gente para inspecionar. O Brasil não terá como enfrentar outra pandemia se o país não enfrentar esse tema. Temos de ampliar o quadro.”
O diretor lembrou que aeroportos são porta de entrada de qualquer vírus num processo pandêmico. “É um ambiente global: pessoas vindo de todos os lugares do mundo. São locais potencialmente favoráveis à disseminação rápida do vírus pelo mundo. O mesmo ocorre com portos”, disse. Justamente por isso, afirma, é indispensável ter nesses locais um contingente de pessoas bem treinadas para atuar. “A pandemia de Covid-19 mostrou isso. Tínhamos uma estrutura para lidar com portos, aeroportos, fronteiras. Trabalhamos nas plataformas. Já havia um protocolo.”
Diante da ameaça da redução drástica nos quadros, a Anvisa está agora empenhada em reunir informações sobre todas as atividades realizadas durante a pandemia, os problemas enfrentados ao longo do processo e identificar as necessidades. Amanhã (5/04), por exemplo, uma reunião será realizada com representantes de portos e aeroportos do país para fazer uma análise detalhada das necessidades. A partir dos dados, um estudo sobre as demandas será preparado e apresentado a parlamentares e governo. Para que o pedido de abertura de vagas seja feito, é necessária uma iniciativa de lei do presidente da República, por intermédio do Ministério da Saúde. Também é necessária a inclusão do gasto no orçamento. “Daí a necessidade de nos mobilizarmos e ter uma sinalização até meados do ano”, completou.
Machado Campos afirmou que, apesar de haver no Congresso algumas discussões que apontem para uma diminuição de competências da agência, há muito espaço para o diálogo. “Nunca fomos tão ouvidos. Além disso, a questão do incremento para portos e aeroportos não é apenas uma questão da Anvisa, é do Brasil.”
O diretor da Anvisa argumentou ainda que, por mais que haja mecanismos de inteligência, de uso de dados para tornar os processos mais ágeis, funcionários são indispensáveis. “A ausência de profissionais é um risco para saúde pública e também para a economia.” Hoje, de acordo com ele, há registros de filas para liberação de cargas em portos e aeroportos. “Queremos reduzi-la, porque sabemos que isso representa custos. Sem falar na previsibilidade para empresas.” Mas a solução do problema, completa, passa também por uma melhor estrutura de funcionários.