A proposta de criar espaço no Orçamento de 2023 para recursos da saúde estudada pelo grupo de transição do governo eleito é essencial para cumprir promessas de campanha, avalia o especialista em Orçamento e assessor no Senado Bruno Moretti.
Em entrevista ao JOTA, ele afirmou que o ideal é garantir mudanças já para 2023, por meio de uma proposta de exceção à regra de teto de gastos. “Além de recursos para o Bolsa Família, seria importante ampliar o limite para saúde”, disse.
O tema já tem o aval do presidente eleito Luiz Inácio Lula da Silva e do vice, Geraldo Alckmin. A expectativa é de que a proposta seja apresentada ao Congresso nos próximos dias.
Moretti, que participa dos debates sobre a PEC que pode aumentar os recursos do orçamento de 2023, explica a necessidade da abertura de espaço para mais verbas.
No projeto de lei orçamentária anual encaminhado pelo governo Bolsonaro, foram reservados R$ 149,9 bilhões para ações e serviços públicos de saúde.
Desse total, R$ 19,6 bilhões estão previstos para emendas, das quais R$ 9,9 bilhões para emendas do relator. O destino dado a esses recursos, no entanto, segue interesse de parlamentares e na grande maioria dos casos está descolado das prioridades traçadas por autoridades sanitárias.
“Foi um dos maiores estragos no orçamento do setor nos últimos anos”, avalia o economista. E é fácil entender a razão. Do total reservado para emendas, esses quase R$ 10 bilhões são contabilizados no chamado piso da saúde, o mínimo que o setor público deve destinar para ações e serviços de saúde. Em outras palavras, o piso deixa de ser, de fato, atendido.
Para poder acomodar os R$ 9,9 bilhões de emendas do relator no orçamento de 2023, a saída foi cortar recursos destinados a vários programas, muitos dos quais em áreas consideradas estratégicas para o governo eleito.
Radiografia dos cortes
A saúde indígena, por exemplo, teve redução de 59% de seu orçamento, quando comparado com o valor destinado para 2022. Esse foi o percentual do corte para o Farmácia Popular, programa criado durante a gestão do PT e responsável por garantir medicamentos mais baratos para 20 milhões de brasileiros. Para educação e formação da saúde, o corte foi de 56% e para o programa de imunizações, de 37%. Os programas Mais Médicos e Médicos pelo Brasil tiveram corte de 51%.
A proposta de orçamento enviada para o Congresso pelo atual governo deixou sem lastro o equivalente a R$ 10,4 bilhões, disse semana passada o ex-ministro da Saúde e coordenador da equipe de transição da área, Arthur Chioro.
Com a redução, diz Moretti, será difícil, por exemplo, custear uma ação prevista na campanha de Lula e de sua aliada no segundo turno, Simone Tebet: a realização de mutirões para reduzir as filas de espera para exames, cirurgias e outros procedimentos.
Há um esforço para tentar aprovar no Congresso proposta adicional de R$ 52 bilhões ao limite de teto de gastos, previsto pela Emenda Constitucional 95, de 2016. A quantia é necessária para garantir o valor do bolsa família de R$ 600, sendo ainda necessária quantia para custear o benefício destinado a crianças menores de seis anos, também previsto na campanha do presidente eleito.
Moretti explica qual o raciocínio usado para a proposta: uma recomposição, no valor de R$ 10 bilhões que foram reservados para as emendas de relator na PLOA, acrescidos de recursos suficientes para custear ações consideradas prioritárias pelo novo governo.
Histórico das perdas
A fatia extra em 2023 seria no valor de R$ 22,7 bilhões. Moretti integra um grupo de especialistas que, em setembro, publicou um estudo sobre a perda de recursos na área de saúde no período de vigência da Emenda Constitucional 95. De acordo com a pesquisa, o setor deixou de receber R$ 60 bilhões com a mudança do critério de definição do piso da saúde entre 2018 e 2023.
Em vez dos 15% da Receita Corrente Líquida, em 2023 foram reservados 13%. “Para equiparar à regra de piso anterior à EC 95 seriam recomendáveis R$ 172,6 bilhões para a saúde em 2023”. Esse seria o valor do orçamento da área proposto no PLOA acrescido com as perdas projetadas com o projeto orçamentário de 2023.
Ao reduzir recursos para o setor, argumenta Moretti, perde-se a oportunidade de se facilitar o acesso. “É uma ilusão pensar que é preciso primeiro melhorar a eficiência para ampliar recursos. Com orçamento insuficiente, dificilmente o setor terá condições de adotar medidas eficientes, de fazer melhorias”.
O economista também argumenta que os impactos econômicos da saúde são muito relevantes e, por isso, o aumento dos gastos no setor funciona como um motor para a retomada da economia. O investimento em ações e serviços de saúde, completa, retornam sob a forma de aumento do PIB, aumento da renda e também melhora da balança comercial.