O secretário executivo do Ministério da Saúde, Daniel Pereira, confirmou ao JOTA que vai assumir o posto de diretor da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) até o dia 24 de agosto. Advogado e especialista em regulação federal, Pereira foi indicado à cadeira que estava ocupada por Cristiane Jourdan até 24 de junho após uma disputa de forças entre o ministro da Saúde, Marcelo Queiroga, e o diretor-presidente Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS), Paulo Rebello.
No último mês, Pereira havia lançado dúvidas sobre como o processo seria conduzido. Na ocasião, afirmou que havia várias entregas a serem feitas na pasta que ele não gostaria de deixar por fazer. A ideia era postergar ao máximo sua permanência no ministério.
A estratégia, no entanto, esbarra num entrave legal. Uma vez nomeados, diretores devem tomar posse em, no máximo, um mês, depois da saída do antecessor. No caso de Pereira, o prazo vence dia 24. Para tentar driblar essa barreira, chegou-se a cogitar a possibilidade de revogar a nomeação, deixar na Anvisa um diretor substituto para, em tempo oportuno, ainda este ano, refazer a nomeação. A manobra é considerada por todos bastante arriscada, uma vez que o Congresso entra em recesso e há eleições. A possibilidade de ficar na secretaria poderia significar abrir mão de um mandato de cinco anos.
Pereira é servidor público da ANS desde 2013 e sempre atuou na área de regulação, na qual já trabalhava desde 2009, quando atuou na Agência Nacional de Transporte Terrestre (ANTT). Em 2017, assumiu a diretoria adjunta de Desenvolvimento Setorial (Dides) da ANS.
Entre 2015 e 2016, atuou na Autoridade Pública Olímpica, no Rio de Janeiro. Foi quando, segundo conhecidos dele com quem o JOTA conversou nos últimos dias, conheceu o general Walter Braga Netto, atual vice na chapa do presidente Jair Bolsonaro em busca da reeleição. A aproximação tem lhe rendido bons frutos com o atual governo.
Seu irmão, Thiago Meirelles Fernandes Pereira, por exemplo, foi adjunto na Secretaria Executiva da Casa Civil da Presidência da República até abril. Atualmente, é subchefe de Articulação e Monitoramento da pasta.
Daniel Pereira, por sua vez, teve o nome cotado no fim do ano passado para uma das diretorias da ANS que precisavam ser preenchidas em definitivo — três delas vinham sendo tocadas por interinos e uma sequer estava ocupada.
Paulo Rebello, contudo, trabalhou diretamente contra Pereira, usando toda sua influência política para barrar o nome. O presidente da ANS foi chefe de gabinete do deputado Ricardo Barros (PP-PR), ex-líder do governo na Câmara, e tem parentesco com o ex-senador e vereador Lindbergh Farias (PT-RJ).
Rebello discordou da forma como Daniel Pereira conduziu a mediação de propostas com impacto na saúde suplementar, como a PNSS-Covid e a MP 1067/21, o que acirrou a disputa de forças envolvendo a ANS e o Ministério da Saúde.
Sem conseguir vencer o centrão, em abril, o governo decidiu indicar o secretário executivo do Ministério da Saúde para uma diretoria da Anvisa. Uma semana após a indicação, o Senado aprovou na Comissão de Assuntos Sociais (CAS) e no plenário a indicação de Pereira. Segundo parlamentares, essa foi uma designação pessoal de Marcelo Queiroga, que trabalhou pessoalmente pela agilidade na apreciação, em mais um desejo de demonstração de sua influência.
No mesmo mês, o servidor foi nomeado assessor especial do ministro.
A indicação e posterior aprovação de Daniel Pereira desagradaram a diretora que deveria ser substituída na Anvisa, Cristiane Jourdan. Ela recorreu à Justiça para manter seu mandato até 2025. Em entrevistas, ela classificou a indicação como “má-fé”, argumentando que, como foi nomeada após a nova lei geral das agências reguladoras, deveria ter o direito de exercer seu mandato por 5 anos.
O presidente do Sinagências, Cleber Ferreira, afirmou ao JOTA que a reclamação de Jourdan não procede. “Ela entrou em uma vaga que iniciou antes da nova lei. Então a vaga tem o tempo determinado anteriormente. Isso está pacificado pra gente.”
Atualmente licenciado da ANS, Ferreira contou ao JOTA que já trabalhou com Pereira na agência e acredita que ele está “mais do que capacitado” para exercer o cargo na Anvisa. “Tem formação em Direito e é especialista em regulação na ANS. Preenche totalmente os requisitos, é bem familiarizado com questões da área de saúde, até por sua passagem pelo Ministério da Saúde e, com certeza, vai continuar contribuindo muito para os processos regulatórios da Anvisa.”
Para empoderar Pereira, Queiroga o tornou secretário-executivo da pasta em maio. “Em toda a minha vida profissional, trabalhei para cumprir os princípios constitucionais do SUS, em especial a universalidade. Tenho defendido também mais transparência e eficiência na gestão dos recursos públicos com novos modelos de cuidado focados em resultados. O SUS é um sistema de saúde de referência mundial. Vimos sua força durante a ESPIN e vamos fortalecê-lo ainda mais”, disse ele, em nota divulgada pelo Ministério da Saúde em 11 de maio.
Por ocupar o posto de número dois do Ministério da Saúde, cargo com mais visibilidade, fontes do governo chegaram a dizer que Pereira poderia não assumir a diretoria da Anvisa. Ainda de acordo com integrantes da equipe de governo, Pereira teria sido convencido por Queiroga a ficar na secretaria para ajudar na construção de uma agenda positiva, essencial sobretudo nesse momento de disputas eleitorais.
Com atuação em agências reguladoras federais na área da saúde, Daniel Pereira é graduado em Direito pela UNESA e pós-graduado em Direito Constitucional pela Universidade Cândido Mendes, em 2021.