Inicialmente previsto para ser assinado em dezembro de 2020, o contrato de transferência de tecnologia entre a Fiocruz e a AstraZeneca, que irá permitir a produção de uma vacina nacional contra Covid-19, foi assinado nesta terça-feira (1º/5) pela presidente da instituição, Nísia Trindade, e pelo presidente da farmacêutica no Brasil, Carlos Sanches Luiz.
A formalização do acordo foi feita em cerimônia com o presidente Jair Bolsonaro no Ministério da Saúde. Durante o ato, ele pediu uma homenagem ao ex-ministro da Saúde, Eduardo Pazuello. “Pediria que aplaudissem o ex-ministro Pazuello, que começou esse contrato”, afirmou.
O general foi nomeado Secretário de Estudos Estratégicos da Secretaria Especial de Assuntos Estratégicos da Presidência da República também nesta terça. Em junho de 2020, quando ele estava à frente do Ministério da Saúde, a Fiocruz assinou um memorando de entendimento com a farmacêutica.
Em setembro, a instituição formalizou o contrato de Encomenda Tecnológica (Etec) “pelo qual já se assegurava a transferência de tecnologia do processamento final da vacina e posterior transferência de tecnologia do IFA para a produção 100% nacional da vacina”, de acordo com a Fiocruz.
Os recursos foram garantidos pela MP 994/2020, assinada em agosto do ano passado, que liberou R$ 1,9 bilhão. Desse montante, R$ 522,1 milhões são para ampliar a estrutura de Bio-Manguinhos, unidade da Fiocruz produtora de imunobiológicos. Os outros R$ 1,3 bilhão são despesas referentes a pagamentos relativas à encomenda tecnológica.
O atual titular da pasta, Marcelo Queiroga, afirmou que o contrato dá autonomia ao Brasil na produção de vacinas contra Covid-19. “O contrato que hoje celebramos permitirá avançar em relação à auto-suficiência e à soberania produtiva dessa vacina. Trata-se de mais um passo crucial para que possamos melhor nos posicionar estrategicamente na luta contra a pandemia e para seguir nosso objetivo de construir um Brasil melhor para todos brasileiros”, afirmou.
Outros integrantes do primeiro escalão do governo também estavam presentes, como o ministro Luiz Eduardo Ramos (Casa Civil) e o chanceler Carlos França.
Atrasos na assinatura
A assinatura vinha sendo adiada devido a divergências em relação a algumas cláusulas. De acordo com um relatório de acompanhamento do Tribunal de Contas da União (TC 014.575/2020-5), ao menos dois pontos foram motivo de divergências entre a Fiocruz e a AstraZeneca na negociação.
O primeiro diz respeito à isenção da farmacêutica quanto às responsabilidades relacionadas ao uso e aplicação da vacina. A Fiocruz propôs reciprocidade de direitos e deveres das partes, mas a AstraZeneca se recusou a aceitar. Por fim, o laboratório público cedeu.
Outro aspecto está relacionado à propriedade intelectual. O TCU verificou que a empresa não assegura que a tecnologia transferida não infringe os direitos de propriedade intelectual ou direitos de terceiros, por se tratar de um produto novo e ainda em desenvolvimento.
O documento será disponibilizado no Portal Fiocruz, de acordo com a instituição.
Produção do IFA nacional será iniciada
Com a formalização do contrato, o laboratório poderá receber a matéria-prima para produção do IFA (ingrediente farmacêutico ativo) em Bio-Manguinhos. “O processo produtivo mesmo vai começar quando recebermos os bancos de células e vírus. Só que precisamos fechar o contrato com a Astrazeneca”, afirmou o diretor do laboratório, Maurício Zuma, em entrevista ao JOTA em maio.
Em nota, a Fiocruz informou que “segue com as etapas preliminares de treinamento da equipe técnica e elaboração da documentação técnica relacionada aos processos produtivos do IFA nacional”.
Segundo a instituição, as adaptações da planta fabril e a aquisição dos equipamentos necessários no Centro Henrique Penna (CHP), parte do Complexo Tecnológico de Vacinas (CTV) no campus da Fiocruz em Manguinhos, no Rio de Janeiro, foram feitas a partir de doações privadas.
As instalações receberam as Condições Técnico-Operacionais (CTO), concedidas pelas Agência Nacional de Vigilância em Saúde (Anvisa), bem como o certificado de Boas Práticas de Fabricação (CBPF) para a produção do IFA.
Após o recebimento dos insumos, será iniciada a produção dos lotes de pré-validação, que demora cerca de 45 dias. Serão dois lotes de pré-validação e três de validação.
A previsão da Fiocruz é de que o imunizante possa ser usado pelo Programa Nacional de Imunizações (PNI) a partir de outubro. As instalações terão a capacidade de produção para cerca de 15 milhões de doses da vacina por mês, segundo a instituição.
Quando as vacinas com IFA nacional estiverem prontas, será necessária uma mudança no registro concedido pela Anvisa. Paralelamente à produção dos insumos nacionais, a Fiocruz fará a submissão contínua junto à reguladora, a fim de acelerar a apresentação da documentação necessária.
O contrato prevê a produção de 60 milhões de doses. A previsão inicial era de 110 milhões, mas 50 milhões foram substituídas por doses com IFA importado. Foi liberado R$ 1,68 bilhão, por meio da MP 1048/2021, para essas novas doses da AstraZeneca.
Em nota, a Fiocruz informou que “segue em formalização contratual” para a aquisição adicional de IFA importado para as 50 milhões de doses previstas para o segundo semestre. A contratação é uma tentativa de tentar suprir possível hiato na produção em agosto e setembro.