

Primeira vacina contra chikungunya a chegar à 3ª fase de testes, o imunizante desenvolvido pela empresa de biotecnologia Valneva em parceria com o Instituto Butantan deve estar disponível no Brasil a partir de 2024. Essa é a previsão de médicos e cientistas que realizam estudos no país.
A etapa final recruta adolescentes para participar da testagem em dez centros de pesquisa no país. Essa fase deve acabar no início do próximo ano, quando o Butantan pretende pedir o registro da vacina à Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa). Trata-se de uma parceria de encomenda tecnológica junto à Valneva.
“Completamos esse estudo com adolescentes no começo de 2024 e esperamos fazer o processo de aprovação durante o próximo ano”, afirma a diretora médica executiva do Butantan, Fernanda Boulos, em entrevista ao JOTA.
Pesquisa realizada nos Estados Unidos com 4.115 voluntários a partir de 18 anos mostrou que 96,3% deles tinham anticorpos contra a doença pelo menos seis meses após a vacinação. A vacina utiliza o vírus vivo atenuado da chikungunya e é de dose única.
“Os resultados (dos testes em adolescentes) dependem da velocidade em que ocorrer o estudo. Esses adolescentes serão acompanhados por 15 meses. É difícil saber quando (a vacina será disponibilizada), mas, como já tem a parceria, esperamos conseguir num período próximo, de 1 a 2 anos”, diz a coordenadora dos testes no Instituto de Infectologia Emílio Ribas (IIER), Ana Paula Rocha Veiga.
Existe o entendimento de que é difícil desenvolver vacinas contra doenças tropicais, incluindo as arboviroses — dengue, zika e chikungunya. Em linhas gerais, a avaliação é de que falta incentivo, sobretudo financeiro: há receio por parte de farmacêuticas em não obter lucro.
Mas a questão não é tão simples. Infecções como essas são causadas por vírus que sofrem mutações que desafiam os cientistas a descobrir como promover uma imunidade duradoura. Só no Butantan, os estudos já duram dez anos, lembra Boulos.
Se aprovada pela Anvisa, a vacina deve atender prioritariamente à demanda do Sistema Único de Saúde (SUS), diz a diretora. A negociação se estenderá a laboratórios se a capacidade de produção for além do que a rede pública precisa comprar. Mas isso, é claro, também precisa passar pelo crivo da Comissão Nacional de Incorporação de Tecnologias no SUS (Conitec).
Há tratativas iniciais tanto com o Ministério da Saúde quanto com a Anvisa para compartilhamento de dados. Ainda não é possível estimar o preço por dose.
Cresce número de mortes pela doença
Dados do Ministério da Saúde mostram que a chikungunya matou pelo menos 94 pessoas em 2022, o maior número em três anos. O total acumulado representa 6,7 vezes mais que o registrado em todo o ano anterior — e ainda pode aumentar: existem mais 15 óbitos em investigação no país.
Essa disparada no número de mortes anda lado a lado com o cenário da dengue, que bateu recorde de 1.016 óbitos em 2022, conforme mostrou o JOTA. Com 39 vítimas, o Ceará acumulou mais de quatro a cada 10 mortes (41,5%) ao longo do ano passado.
O número reflete o ranking de número de casos: capital do estado, Fortaleza desponta em primeiro lugar, com 20.453 diagnósticos — taxa de incidência que alcança 756,5 casos por 100 mil habitantes. Ao todo, o ministério contabilizou 174.517 casos em todo o país no ano passado, o que representa 78,9% a mais que em 2021.
Apesar de menos letal que a dengue, chikungunya preocupa pelas sequelas. Metade dos infectados passa ter dor crônica nas articulações.
“A chikungunya é menos frequente, mas bastante debilitante, que deixa muitas pessoas, inclusive jovens em idade produtiva, com sequelas importantes. Essa doença, assim como a dengue, se apresenta como necessidades médicas não atendidas: têm formas de prevenção relacionadas ao vetor, mas a vacina viria como uma outra ferramenta que pode ser um divisor de águas”, diz a diretora médica executiva do Butantan.