Manoela Albuquerque

Gustavo Gantois

A diretoria colegiada da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) aprovou por unanimidade, neste domingo (17/1), o uso emergencial das vacinas CoronaVac (Sinovac) e CoviShield (Oxford/AstraZeneca), solicitados pelo Instituto Butantan e pela Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz), respectivamente. 
O parecer do gerente-geral de Medicamentos e Produtos Biológicos (GGMED), Gustavo Mendes, foi pela aprovação tanto da <a href="https://www.jota.info/wp-content/uploads/2021/01/parecer-no-2-2021-sei-gpbio-ggmed-dire2-anvisa-butantan-1.pdf" target="_blank" rel="noopener noreferrer">CoronaVac</a> quanto da <a href="https://www.jota.info/wp-content/uploads/2021/01/parecer-no-3-2021-sei-gpbio-ggmed-dire2-anvisa-fiocruz.pdf" target="_blank" rel="noopener noreferrer">CoviShield</a>, mesmo pontuando algumas incertezas em relação aos dados apresentados nos pedidos. Foi assim que a diretora Meiruze Freitas, superior à área técnica, conduziu o <a href="https://www.jota.info/wp-content/uploads/2021/01/sei-anvisa-1299258-voto-dire2.pdf" target="_blank" rel="noopener noreferrer">voto</a>. 
<a href="https://conteudo.jota.info/saude"><img class="wp-image-291212 size-medium aligncenter" src="https://www.jota.info/wp-content/uploads/2021/01/jota-pro-saude-v2.jpg" alt="" width="300" height="300" /></a>
“Ressalvadas algumas incertezas ainda existentes pelo estágio de desenvolvimento em apreço, os benefícios conhecidos e potenciais das duas candidatas a vacinas superam os riscos conhecidos e potenciais. Entretanto, ambas atendem aos critérios de qualidade e segurança para uso emergencial”, afirmou. 
No caso da CoronaVac, a relatora incluiu como condição para a autorização a assinatura de um termo de compromisso pelo Instituto Butantan. A decisão foi tomada após consulta à Procuradoria-Federal junto à Anvisa e prevê a apresentação de dados complementares sobre a imunogenicidade do imunobiológico até o dia 28 de fevereiro.
“Faço ressalva a um ponto crítico relacionado à vacina CoronaVac, que requer abordagem complementar quanto à imunogenicidade. A ausência da quantificação dos anticorpos nas amostras biológicas dos voluntários, conforme previsto no desenho do ensaio clínico em fase 3, nos impede de responder, neste momento, a seguinte pergunta: por quanto tempo perdura no organismo dos indivíduos que receberam a vacina a proteção conferida pela CoronaVac?”, relatou. 
Em seguida, os diretores Romison Mota, Alex Campos e Cristiane Jourdan acompanharam a relatora. O último a votar foi o diretor-presidente da Anvisa, Antonio Barra Torres, que confirmou o resultado final. 
Barra Torres destacou que a Anvisa é a única autoridade regulatória no mundo a analisar dois pedidos de uso emergencial de vacinas para Covid-19 em nove dias. O prazo estabelecido internamente pela agência era de 10 dias, com fim na segunda-feira (18/1).
“Em meio a esse cenário de incertezas, agravado por pressões de todas as naturezas, infelizmente muitas vezes motivadas por razões outras que não a saúde pública, especialistas de variadas capacitações fizeram renúncias de suas próprias vidas e não mediram horários nem esforços para honrar a responsabilidade da qual nunca se afastaram: atestar a qualidade, a segurança e a eficácia da ‘esperança’, traduzida sob a forma de vacina”, afirmou. 
Depois de deixar claro que se trata do uso emergencial, temporário e experimental dos produtos, o presidente da reguladora incentivou à vacinação e a manutenção de medidas de distanciamento social. 
“Eu me dirijo ao cidadão brasileiro que agora nos assiste para lembrar: a imunidade com a imunização leva um tempo para se estabelecer. Mesmo vacinado, use máscara, mantenha o distanciamento social, higienize suas mãos. Essas vacinas estão certificadas pela nossa Anvisa. Elas foram analisadas por nós, brasileiros, no menor e no melhor tempo, estabelecidas por nossos especialistas. Confie na Anvisa, confie nas vacinas que a Anvisa certifica. E quando elas estiverem ao seu alcance, vá e se vacine”, finalizou.
<h3>Incertezas relacionadas à CoronaVac:</h3>
Além de dados de imunogenicidade gerada a longo prazo, entre as principais incertezas encontradas pela Anvisa no estudo da CoronaVac, estão a eficácia da vacina quanto a efeitos moderados e graves, bem como na faixa etária acima de 60 anos.
Segundo o gerente-geral de Medicamentos e Produtos Biológicos, Gustavo Mendes:
<ul>
<li style="font-weight: 400;">Eficácia geral: “O dado mais importante é o dado da eficácia total, que traz 50,4%. Já o agrupamento, por essas diferentes diferentes gravidades, como desfecho secundário, é uma situação que estamos colocando como incerteza”;</li>
<li style="font-weight: 400;">Uso em idosos: “A incidência total, como foi apresentado pela empresa, não nos permite fazer cálculos com os diferentes grupos de idade, principalmente nos casos em que a gente tem voluntários de 60 anos ou mais”;</li>
<li style="font-weight: 400;">Imunogenicidade: “Não foram apresentados os resultados de avaliação de imunogenicidade ao longo do tempo para esse estudo, de acordo com o que era esperado e definido no protocolo aprovado. O único resultado apresentado não foi considerado adequado para avaliação e conclusão de imunogenicidade”.</li>
</ul>
<h3>Incertezas relacionadas à CoviShield:</h3>
Em relação à vacina CoviShield, produzida pelo Instituto Serum da Índia, a Anvisa indicou que as principais incertezas estão relacionadas ao tempo de proteção após a aplicação da primeira dose e à comparabilidade com a vacina de Oxford. A eficácia geral encontrada é de 70,42%.
Segundo o gerente-geral de Medicamentos e Produtos Biológicos, Gustavo Mendes:
<ul>
<li style="font-weight: 400;">Dose única: “A primeira dose, no esquema padrão, fornece imunidade protetora até a administração da segunda dose, porém os dados relativos a esse tipo de eficácia são limitados quando se considera um período de intervalo de 22 dias após a primeira dose até a segunda dose. A gente não consegue estabelecer qual seria a resposta após uma dose única além das 12 semanas avaliadas”;</li>
<li style="font-weight: 400;">Proteção a formas graves: “Existe uma tendência favorável à proteção para as formas graves, mas precisamos acompanhar mais de perto essa questão para termos um dado mais definitivo”;</li>
<li style="font-weight: 400;">Comparabilidade: “Embora a empresa alegue que a vacina CoviShield apresenta imunogenicidade comparável à vacina de Oxford/AstraZeneca, ainda existem incertezas sobre a comparabilidade do produto”.</li>
</ul>
<h3>Uso recomendado pela Anvisa</h3>
Na apresentação técnica, a Anvisa pontuou que os estudos apresentaram incertezas quanto à aplicação das vacinas em idosos, que estão no grupo prioritário definido pelo Ministério da Saúde.
No caso da CoronaVac, a gerência-geral de medicamentos concluiu que não foram apresentados dados que possam garantir a eficácia de 50,38% para esse grupo. De forma semelhante, a conclusão foi que o número de adultos com mais de 65 anos também é pequeno para determinar a eficácia de 70,42% da vacina de Oxford.
No entanto, de acordo com Gustavo Mendes, essa falta de dados não representa risco e deve constar nas bulas das vacinas. Não há um prazo máximo para a divulgação da bula pelos desenvolvedores, mas o esperado é que ocorra antes da imunização.
“A incerteza não representa risco, necessariamente. A gente colocou como incerteza mas, pelo dado de segurança, a gente não viu nenhum risco específico. Então, essa população foi contemplada no estudo e os dados que existem são promissores. A gente entende que poderia [haver vacinação], mas com uma observação. É diferente de uma população que não foi incluída nos estudos, por exemplo, crianças, gestantes e outros. Nesse caso específico, existe essa lacuna. Tudo isso vai ser endereçado na bula”, afirmou, em coletiva de imprensa.
Nesses casos, o documento não será divulgado no bulário da Anvisa, como ocorre no caso de registros de medicamentos. Será adotada uma forma de divulgação excepcional, sem data prevista.
A diretora Meiruze Freitas indicou, na mesma coletiva, que pode haver participação do Ministério da Saúde no processo de divulgação do público indicado para a vacinação após a autorização de uso emergencial.
“Em alguns países, o programa de estratégia de imunização no país também faz algumas discussões sobre a melhor forma, junto aos estudos, junto a autoridades. Muitas vezes os ministérios tomam decisões relacionadas ao programa de vacinação específico para cada vacina. Também deve-se considerar que tenham recomendações específicas no programa de vacinação. É uma estratégia adotada tanto no Reino Unido quanto nos Estados Unidos. A própria OMS faz uma recomendação de discussão com o programa de vacinação”, disse.
<h3>Vacinação em São Paulo e no Brasil</h3>
Logo após a decisão da agência, a primeira brasileira foi vacinada pelo governo de São Paulo, com a CoronaVac.
“Mônica Calazans: mulher, negra, enfermeira, vive no extremo da Zona Leste de SP, a primeira pessoa a ser vacinada no Brasil. Representa não apenas os heróis e heroínas que atuam na linha de frente na pandemia, mas tmb o povo brasileiro. Finalmente os brasileiros serão imunizados”, comemorou o governador João Doria (PSDB), em seu perfil no Twitter.
A medida desrespeita a condição imposta pela reguladora. Para que a autorização emergencial tivesse validade, o Termo de Compromisso precisava ser assinado pelo Instituto Butantan e um extrato da reunião deveria ser <a href="https://www.jota.info/wp-content/uploads/2021/01/2021-01-17-assinado-do3-extra-a.pdf" target="_blank" rel="noopener noreferrer">publicado</a>, o que só ocorreu às 22 horas.
Pouco depois da primeira imunização, Doria anunciou na mesma rede o envio de 4,6 milhões de doses da vacina ao Ministério da Saúde para distribuir aos demais estados e ao Distrito Federal. Na última semana, a pasta havia solicitado o envio imediato das 6 milhões de doses importadas pelo Instituto Butantan.
O ministro da Saúde, Eduardo Pazuello, afirmou em coletiva de imprensa realizada pela pasta após as autorizações que o início do plano nacional de imunização será na quarta-feira (20/1).
Está marcado, para segunda-feira (18/1), o início da distribuição da vacina, com participação dos governadores. Um evento será realizado no Centro de Distribuição Logística do Ministério da Saúde, em Guarulhos (SP), às 7h.
"Todas as vacinas produzidas pelo Butantan estão contratadas de forma integral e exclusiva para o Ministério da Saúde, para o PNI. Todas, inclusive a que foi aplicada. Eu reafirmo que a coordenação do plano nacional de imunização é do Ministério da Saúde, por medida provisória, com força de lei. E está pactuado com os governadores que todas as doses recebidas, 6 milhões de doses, serão distribuídas de forma proporcional aos estdos e entregues simultaneamente. Qualquer movimento fora dessa linha, está em desacordo com a lei”, disse o ministro.
<h3>Doses limitadas</h3>
Por enquanto, a autorização da Anvisa contempla 8 milhões de doses, somando o quantitativo das duas vacinas. São 6 milhões da CoronaVac e 2 milhões da CoviShield, a vacina de Oxford produzida pelo Instituto Serum da Índia, que depende da liberação do país de origem para ser trazida ao Brasil.
O Butantan já iniciou sua produção própria, porém, novas informações precisam ser enviadas à reguladora para a liberação.
O JOTA apurou que o instituto paulista deve fazer um novo pedido ainda nesta semana. Segundo o ministro da Saúde, deve haver entrega de mais 3 milhões de doses.
“Uma nova autorização, de um novo produto, certamente seguirá o mesmo rito. Uma extensão pode ser até que a gente discuta entre os diretores se poderia ser pelo circuito deliberativo, que é um canal em que as decisões são publicizadas logo depois, mas é um meio eletrônico”, explicou Meiruze Freitas.

Reunião da diretoria colegiada da Anvisa que autorizou uso emergencial de vacinas (Foto: Anvisa)

https://images.jota.info/wp-content/uploads/2021/09/copy-of-jota-logo-high-cmyk.jpeg

JOTA

Mesmo com incertezas, a agência considerou cenário positivo; liberação da CoronaVac é condicionada a termo de compromisso

Anvisa aprova uso emergencial de vacinas para Covid-19 no Brasil

Diretoria da Anvisa aprovou uso emergencial da CoronaVac e CoviShield, solicitados pelo Butantan e pela Fiocruz, respectivamente. 