Carolina Botelho

A dois meses da <a href="https://www.jota.info/eleicoes">eleição mais importante</a> da nossa jovem Nova República, já dá para sentir uma brisa discreta e fresca no horizonte. Não era sem tempo. Nas últimas semanas, tenho lido notícias que dão esperanças. A última veio da diretoria da Fiesp, que <a href="https://www1.folha.uol.com.br/mercado/2022/07/fiesp-diz-que-ira-apoiar-qualquer-ato-em-favor-da-democracia.shtml">acaba de dar aval para participação em movimento de defesa da democracia e do TSE</a>.
Até há bem pouco tempo, o espírito truculento, antidemocrático e perigoso do bolsonarismo, sintetizado na figura do ex-presidente da entidade, estava dando as cartas por lá. Também se junta ao coro dos democratas um grupo de banqueiros e empresários, que parece ter percebido que precisamos de democracia. Um passo – ainda que tardio – importante. Com essas posições, o reacionarismo perde um pouco de espaço na agenda de um estrato influente nas decisões do país: a elite econômica. Antes tarde do que nunca. Que esses ventos venham mais fortes.
Há também outras notícias que trabalham por aliviar o clima pesado que o reacionarismo tem imposto a todos nós. O STF tem intensificado reação às falas antidemocráticas do presidente, assim como tem se organizado para frear tentativas de subverter o Estado de Direito. Depois de um primeiro ano de governo nadando de braçadas em cima de nosso Estado de Direito, Bolsonaro passou a encontrar limites por parte do Supremo, o que tem dificultado bastante suas investidas autoritárias.
Também temos visto personalidades públicas, pessoas influentes da sociedade brasileira, instituições, atores políticos relevantes nacionais e estrangeiros se movimentando com mais vigor para alertar a sociedade de que a defesa da democracia é o primeiro passo da agenda eleitoral e é sobre esse pilar que devem emergir todas as demais prioridades. O alerta tem vindo em tom grave, preocupado. Neste momento, já está claro que a ameaça de rompimento institucional não é mais considerada mera retórica política, mas um aviso a ser levado a sério. Um país com a herança de golpes que o Brasil tem não pode se dar ao luxo de ignorar todos esses sinais.
Importante dizer que o quadro de deterioração econômica e social, agravado pela baixa capacidade do governo de dar respostas à população, diminui as chances de reeleição do chefe do Executivo. As pesquisas (todas aquelas que possuem credibilidade, consistência, transparência, e que, portanto, merecem ser analisadas) têm demonstrado que o governo sente os efeitos negativos de sua desastrosa e perigosa administração, especialmente na pandemia, que resultou na morte de mais de 670 mil brasileiros. O aumento da violência política, que avança tragicamente, também tem servido de alerta para setores pacíficos da sociedade brasileira. A morte do tesoureiro do PT Marcelo Arruda é uma evidência lamentável de um cenário sombrio que nos ameaça, mas que se pode evitar.
É preocupante, contudo, a persistência de aproximadamente 1/3 dos eleitores em apoiar Bolsonaro. Significa dizer que uma parte expressiva da sociedade apoia o presidente e que compartilha com ele valores não cívicos e contrários ao Estado de Direito e à democracia. Passados três anos de governo, essa resiliência impressionante e também denota também que há, em parte dos nossos cidadãos, visões de mundo ultraconservadoras, que antes se encontravam desmobilizadas, mas hoje têm quem as lidere.
Também preocupa a demora inadmissível de parte importante da sociedade em responder à altura os avisos golpistas quase que diários vindos do Planalto e nas vozes do presidente, dos filhos e dos aliados ministeriais, fardados e não fardados. Refiro-me aqui a instituições de Estado, que existem para nos defender exatamente desses ataques, e de parte da imprensa e dos nossos formadores de opinião. O fato é que parte de nossas instituições claramente aderiu ao golpismo, seja por ação, seja por omissão de suas funções. Não é preciso dizer quais e quem. Está aí para todo mundo ver.
Após mais de três décadas de estabilidade democrática, os últimos anos têm mostrado que nessa estabilidade havia também fraquezas e que é preciso encará-las de frente. Somente os ingênuos e os cínicos ainda garantem que as nossas instituições seguem firmes. É claro que não estão. O cenário é de agressão, desgaste, esgarçamento e até cerceamento das funções republicanas de nossas instituições e é necessário reconstruir os alicerces. Mas diferentemente do período pré-2018, hoje já é possível identificar aqueles que contribuíram para a nossa deterioração, assim como conhecer os motivos que os levaram a cumprir essa missão tão lamentável e covarde com nosso povo.
A dois meses da eleição, é mais fácil ver quem é e sempre foi da democracia, assim como quem não serve e nem nunca serviu para ela. Esse deve ser o lado positivo. As máscaras caíram e as saídas para a crise se passam a ser mais viáveis do que antes no meio da confusão. E o que resta a nós, sociedade: apenas sentar e aguardar? Penso que não.
Cabe à sociedade aumentar o coro de quem quer a democracia e escolher a melhor saída para preservá-la ao máximo neste momento tão delicado. Pode até não ser o ideal, mas se for o possível para que seja protegida, é essa a escolha a ser feita. Teremos muitos anos pela frente para discutir e rediscutir agendas depois de afastarmos quem não é da democracia.

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JOTA

Importante repetir o valioso conselho de Przeworski: eleições servem também para remover governantes

Já é quase agosto e dá para sentir ventos promissores da democracia

Parte de nossas instituições claramente aderiu ao golpismo, seja por ação, seja por omissão de suas funções