
Depois da surpresa com o IPCA de março na última sexta-feira, a possibilidade de a inflação fechar este ano na casa de 8% já é considerada no governo. O número assusta, especialmente quando se lembra de que no ano passado o índice ficou em 10,06%. O cenário, porém, ainda é nebuloso e os números oficiais não foram revisados. A projeção atual do governo é que a inflação medida pelo IPCA encerre o ano em 6,55%, mas só a surpresa do mês passado já sinaliza que essa estimativa deveria subir para algo em torno de 7%. Em 12 meses até março o IPCA ficou em 11,3%.
Curiosamente, a nova rodada de aceleração na inflação tem ocorrido ao mesmo tempo em que o presidente Jair Bolsonaro tem subido nas pesquisas eleitorais e também de avaliação do governo. Normalmente, preços salgados machucam a popularidade presidencial, o que de fato ocorreu no ano passado.
A diferença neste ano é que outros indicadores econômicos estão ajudando o titular do Planalto, como a queda nos índices de desemprego, o Auxílio Brasil de R$ 400 e a valorização do real ante o dólar, que pode ajudar a conter a inflação. Além disso, o governo tem acionado sua máquina de bondades, com desonerações no IPI e no Imposto de Importação, liberação de FGTS, antecipação do 13º e um maior volume de gastos, permitido pelo PEC dos Precatórios. E o mercado tem revisado para cima suas estimativas para o PIB.
De qualquer forma, nada garante que esse descolamento entre inflação e comportamento da popularidade de Bolsonaro, que tem ocorrido no curtíssimo prazo, vai continuar. Na manhã de hoje, o próprio presidente do Banco Central, que andou recebendo críticas internas do governo por deixado o IPCA desgarrar para dois dígitos, admitiu ter ficado surpreso com o resultado do IPCA em março e alertou para o fato de que os núcleos (aquelas medidas que descontam variações fora do normal ou alguns produtos específicos) também estão muito salgados.
Núcleos altos são uma notícia mais preocupante do que a inflação de março em si, que foi impulsionada pelo reajuste dos combustíveis. Isso porque indicam um comportamento mais estrutural na alta de preços, que pode demandar uma carga ainda mais pesada de juros por parte do Banco Central, que havia indicado parar a Selic em 12,75% (hoje está em 11,75% ao ano).
É importante frisar que o processo agressivo de alta de juros que vem sendo implementado pelo BC ainda não fez todo seu efeito. Já contribuiu para acentuar a valorização cambial (que deve ajudar nos preços), mas a defasagem da política monetária aponta que o auge do efeito dos juros deve ocorrer mais perto das eleições.
A questão principal é como se dará esse efeito. Por enquanto, mesmo com juros subindo, há sinais de que houve algum crescimento neste início de ano, o que explica a queda no desemprego. Mas à medida que os impactos do choque monetário vão se acumulando, a tendência seria a economia esfriar.
Por outro lado, o cenário do governo é de inflação caindo a partir de abril ou, mais tardar, de maio e intensificando a queda no segundo semestre. O que é bom para o Planalto, embora as taxas acumuladas em 12 meses devem seguir elevadas.
Diante disso, a economia parece trazer mais perguntas do que respostas para o desenho do cenário eleitoral.