Vale lembrar que Liebman, hoje com 71 anos, começou a ficar conhecido ao trilhar o caminho da fusão jazz-rock, participando, em 1972, da primeira das sessões do LP On the Corner (Columbia), de Miles Davis, ao lado dos elétricos Herbie Hancock, Chick Corea e John McLaughlin. Mas, aos poucos, ele aderiu ao legado de John Coltrane, incorporando-se à vanguarda bem mais especulativa, e fundando o quarteto Quest (que significa busca, aventura), com Richie Beirach (piano), Ron McLure (baixo) e Billy Hart (bateria). Este grupo atuou com sucesso de 1981 a 1991. Em 2011, o saxofonista foi “sagrado” Jazz Master pela NEA (National Endowment for the Arts).
Sobre o encontro com mestre Solal no festival de jazz de Bordeaux, mestre Liebman escreveu nas notas do álbum: “As diversas vezes em que tocamos juntos no ano passado (na turnê francesa de 2016) foram muito significativas pra mim. Embora o repertório queinterpretamos represente o standard jazz song book (escolhido no momento das apresentações), interagir com aquele que é, sem dúvida, o mais famoso artista de jazz europeu de todos os tempos, tocando standards, não é algo que aconteça todo dia”.
E aí está exatamente o que há de mais atraente nessa seleção de cinco canções bem batidas,
O duo Solal-Liebman, em interação constante, descobre ou inventa trilhas surpreendentes a partir do material melódico básico, em variações harmônicas e tiradas rítmicas tão espertas que é impossível cravar de quem é a iniciativa para manter ou mudar o rumo da “viagem” musical. Parecem dois garotos muito espertos na faina de montar (ou desmontar) uma série de puzzles.
O site jazzstandards.com tem uma lista dos 300 temas musicais mais interpretados por instrumentistas e vocalistas em gravações consideradas jazzísticas. All the things you are (de Jerome Kern, 1939) é o segundo da relação (entre Body and soul e Summertime). Pois bem. Em Masters in Bordeaux, Liebman (no sax soprano) consegue extrair linhas modais inimagináveis da velha canção, impulsionado por um ostinato inicial e comentários de Solal que, depois, sola sem nenhum compromisso com as habituais chord progressions. Em On Green Dolphin Street, depois de uma abertura mais ou menos à la lettre, os dois mestres tomam um rumo bem free, com o saxofonista fazendo lembrar o saudoso Steve Lacy.
(A faixa All the things... pode ser ouvida em:
soundcloud.com/