Etienne Jacintho

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<p>Já escrevi neste espaço sobre “Elementary”, a série americana inspirada na obra de sir Arthur Conan Doyle, que transporta o famoso detetive Sherlock Holmes para a Nova York atual e retrata seu fiel escudeiro o dr. John Watson como uma bela mulher, a dra. Joan Watson, na pele da atriz Lucy Liu. Ainda na trama americana, a sedutora e perigosa Irene Adler ganha nuances mais românticas e tem importância maior do que nas tramas de Doyle. E Sherlock? Bem, o excêntrico personagem ficou por conta de um ator britânico, o bonitinho Jonny Lee Miller, que defende bem seu papel, mas poderia estar ainda melhor se o texto fosse mais, digamos, britânico.</p>
<p>Por outro lado, a série (ou minissérie) “Sherlock”, da inglesa BBC, traz um Sherlock Holmes mais sarcástico, com uma arrogância quase infantil e atitudes que demonstram claramente sua sociopatia – Síndrome de Asperger, talvez? O texto, repleto de ironia, não romantiza nada nem ninguém. Aqui, Irene Adler é uma devoradora de homens com inteligência acima da média que seduz Sherlock. Enquanto em “Elementary”, o detetive cai de amor por Irene, em “Sherlock”, ele tem desejo por ela. Tanto que, tal qual nos livros de Doyle, o detetive trata a srta. Adler por “A Mulher”. Inteligentemente, na trama da BBC, os roteiristas transformaram a sedutora mulher numa dominatrix de luxo, que tem clientes importantes, entre eles até mesmo a nobreza do Palácio de Buckingham.</p>
<p>“Sherlock” tem episódios com 1h30 de duração, por isso, a trama se desenvolve numa outra velocidade, se compararmos aos 40 e poucos minutos de “Elementary”. Na série britânica, o público pode perceber melhor as técnicas de dedução de Sherlock Holmes, mas o tempo também traz outra vantagem: o primor dos diálogos. São momentos de puro humor britânico, como no primeiro e no segundo encontro de Holmes com o homem que parece ser seu arqui‐ inimigo Moriarty. Apesar da tensão da segunda cena, quando John Watson está em perigo, é impossível não rir com as falas dos dois personagens. Não poderia esperar menos da terra que despejou no mundo o humor genial e peculiar de “Monty Python”. Por isso, por mais excêntrico que seja o personagem defendido por Jonny Lee Miller em “Elementary”, o verdadeiro “esquisitão” é o detetive encenado pelo ator Benedict Cumberbatch em “Sherlock”.</p>
<p>Errado, porém, é somente comparar “Elementary” a “Sherlock”. Produções britânicas e americanas são muito diferentes. Certamente muitos fãs de “Friends”, por exemplo, não seriam seguidores de “Coupling”, a série inglesa sobre amigos que, às vezes, se enroscam. Tanto que houve uma versão americana de “Coupling” que, obviamente, não foi para frente. E os adolescentes que adoravam a série britânica “As If” possivelmente não teriam a menor paciência para os dramas dos pobres garotos ricos de “The O.C.” ou de “Gossip Girl”. É mais ou menos como ver um filme de animação de contos de fadas da Disney e compará‐los com os enredos originais de Hans Christian Andersen ou dos Irmãos Grimm. Os contos originais podem até ter um final feliz, mas o caminho até lá é tortuoso demais para os musicais da Disney.</p>
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<p>O americano criou essa mania do politicamente correto. Como dizer às crianças que a Rapunzel teve gêmeos antes de se casar com seu príncipe? Até mesmo ao compararmos a série cômica americana “Grace &amp; Frankie”, que ousa ao colocar sexo e drogas na conversa entre duas mulheres maduras, ao seriado britânico “Absolutely Fabulous”, a diferença é enorme. O julgamento moral nas séries inglesas é bem menor. O mundo é mais cru e não há tanto maniqueísmo. A malícia está mais presente. Para uma atração com clima de “film noir”, esses pontos são temperos quase que essenciais.</p>
<p>“Sherlock” traz episódios todos baseados em livros de Doyle. Elementos criados pelo autor estão lá – o confronto de Holmes e Moriarty, a simulação da morte do detetive, só para citar alguns. A minissérie teve três temporadas até agora, a última exibida no ano passado. Devido ao sucesso, a BBC anunciou a quarta temporada para 2016, mas já adiaram para 2017. Enquanto isso, os fãs do detetive podem acompanhar “Elementary”, se não acharem que a versão americana para a história do detetive inglês é água com açúcar!</p>
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<p><em>Serviço: As três temporadas de “Sherlock” que já foram ao ar estão disponíveis para os assinantes da Netflix.</em></p>
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Premiada minissérie da BBC traz detetive esquisitão, com arrogância quase infantil, num clima malicioso e permeado pelo sarcástico humor britânico

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