Etienne Jacintho

O canal AXN estreou este mês a segunda temporada de “American Crime”. Mas não dá para falar deste novo ciclo sem começar desde o início, já que esta é uma atração inovadora, mesmo seguindo a essência da velha fórmula do drama criminal. “American Crime” lembra, em muitos aspectos, o filme “American Beauty” (“Beleza Americana”). A série joga com os mesmos artifícios do filme de Alan Ball e Sam Mendes. Os roteiristas desconstroem mitos e desnudam personagens sem medos. Os preconceitos são derrubados numa espécie de tapa na cara do espectador. Não existe maniqueísmo. No filme, a beleza daquelas casas de subúrbio está só nas fachadas. Na série, o submundo desconhece classe social, raça ou condição financeira, mas a sociedade e as autoridades ainda acham mais fácil punir negros e imigrantes.
“American Crime” joga com estes estereótipos, critica o sistema prisional, questiona o judiciário e alerta para o racismo de uma forma bastante severa. A primeira temporada da série, disponível na Netflix, começa, obviamente, com um crime. Matt, um veterano de guerra está morto. Ele e sua mulher, Gwen, estavam em casa quando foram atacados brutalmente. Ela está em coma depois de ser espancada e provavelmente estuprada.
O pai de Matt, Russ (Timothy Rutton) é o primeiro a receber a notícia. Ele vai a Modesto, cidade em que vivia Matt, para reconhecer o corpo. A mãe da vítima, Barb (Felicity Huffman) chega em seguida à cidade e aguarda o desembarque de seu outro filho, Mark (David Hoflin), também do exército. A família de Mark está pronta para dar todo o apoio aos pais de Gwen, que está em estado grave no hospital. As duas famílias pedem justiça às autoridades, que sentem a pressão da sociedade. Afinal, todos sentem empatia pelo jovem casal de classe média atacado em casa. Um veterano de guerra e sua linda mulher. Quem os vê não imagina os segredos e preconceitos que eles e suas famílias escondem. Felicity Huffman dá show na pele de Barb. Sua primeira aparição já causa repulsa.
Enquanto o público acompanha o crime na visão dos pais das vítimas, outra história começa a se desenvolver. Carter (Elvis Nolasco) e Aubry (Caitlin Gerard) são um casal viciado em heroína. Os dois vivem nas ruas à procura de dinheiro para comprar drogas. Ele é negro e pobre. Ela é branca e rica. Os dois sonham com uma boa vida, mas a rotina de quem vive atrás do sustento de um vício não é fácil.
O espectador acompanha também a vida de Tony (Johnny Ortiz), um jovem de origem mexicana que trabalha com o pai em uma oficina mecânica. Ele e a irmã cresceram sem mãe e o pai, Alonzo (Benito Martinez), sempre foi muito rígido. Para desafiar o pai, Tony empresta um carro da oficina a um membro de uma gangue. Esse carro é visto na cena do crime e Tony é preso. Lá vai o bom menino para o reformatório, lugar que transformará a trajetória de Tony e sua família. O garoto revela à polícia o nome do homem que pegou o carro emprestado na noite da morte de Matt. É Hector Tontz (Richard Cabral), um sujeitinho desprezível. E sua história também é revelada aos poucos para o telespectador.
“American Crime” é teatral. É como se o palco estivesse dividido em quatro cenários, em quatro ambientes, Todos se apresentam ao mesmo tempo e, às vezes, se relacionam. Na primeira temporada, nenhuma das quatro histórias toma o rumo fácil. Ninguém pega um atalho. A série lida com a quebra de estereótipos e brinca com os nossos preconceitos. Um veterano de guerra é sempre heroi? Um relacionamento inter-racial é possível? O imigrante ilegal tatuado tem culpa de quê? Todo muçulmano carrega bombas embaixo de suas vestes?
O novo ano da série já começa quebrando um preconceito. Uma mulher liga para a emergência e relata um estupro. Com o desenrolar da história, o publico vê que a vítima é um garoto. Taylor não é popular na escola, mas quer se encaixar. Vai a uma festa do time de basquete e, no dia seguinte, fotos íntimas suas estão na internet. O garoto quer esquecer o assunto, mas a mãe não vai deixar nada de lado. Conseguir fazer justiça não será uma tarefa fácil.
A diretoria da escola quer abafar o caso para não manchar o nome do ótimo time de basquete da escola. O espectador verá a agressão pelos olhos da diretora da escola, do treinador do time e da mãe de um dos acusados. Os protagonistas em cena são os mesmos da primeira temporada. Felicity Huffman, Timothy Hutton, Regina King, Elvis Nolasco e Lili Taylor estão no palco. Todos são grandes atores interpretando complexos personagens. A segunda temporada não tem nenhuma ligação com a primeira fase. Os atores são os mesmos, mas as situações e os cenários são diferentes. O único ponto em comum entre as duas temporadas é a desconstrução de verdades preestabelecidas, a quebra do senso comum.
“American Crime” vai ao ar às quartas-feiras, às 22 horas, no canal AXN.

LILI TAYLOR

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JOTA

“American Crime” usa a fórmula do seriado tradicional, mas consegue fugir do lugar comum

American Crime: Derrubando mitos

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