O senador Eduardo Gomes (PL-TO), relator do PL 2.338/2023, que institui o marco da inteligência artificial no país, defendeu que o debate em torno do projeto seja travado com uma visão “desarmada de certeza”. O parlamentar pregou, em seminário promovido pela FecomercioSP nesta sexta-feira (30/6), a importância de “não se identificar como um especialista de um lado ou de outro”.
A proposta foi objeto de críticas e recomendações durante boa parte do evento “Marco regulatório da inteligência artificial no Brasil na era pós-ChatGPT”. A entidade que o organizou apresentou um “decálogo”, com princípios para a regulação da tecnologia no país. A elaboração teve o apoio técnico de Rony Vainzof, consultor em Proteção de Dados da FecomercioSP.
Dentre os principais apontamentos, está o de se concentrar no uso, e não na ferramenta. “É preciso extrema cautela ao regular tecnologias para que a norma seja suficientemente flexível e adaptável às suas rápidas mudanças, permitindo experimentação, inovação e evolução contínua dos sistemas de IA,” sugere.
A associação sustenta que seria melhor adotar uma abordagem “principiológica”, isto é, baseada em princípios norteadores, e menos “prescritiva”, que enumere obrigações e responsabilidades. Ela advoga em favor de um modelo como o do Marco Civil da Internet (MCI), em oposição ao da Lei Geral de Proteção de Dados Pessoais (LGPD).
Nos moldes de hoje, o projeto de lei vai no sentido contrário. O texto baseou-se no anteprojeto elaborado por uma comissão de juristas coordenada pelo ministro Ricardo Villas Bôas Cuevas, do Superior Tribunal de Justiça (STJ), e relatado pela professora, Laura Schertel Mendes.
A proposta sofreu influência da LGPD e apresenta normas gerais para a implementação e o uso de sistemas de inteligência artificial no país, concentradas na proteção de direitos, na mitigação de riscos e na adoção de medidas de prestação de contas.
O imperativo da flexibilidade para a regulação permitir o desenvolvimento tecnológico deu o tom no painel formado por Daniel Stivelberg, advogado do Nubank, Samantha Oliveira, DPO do Mercado Livre, Eduardo Paranhos, líder do grupo de trabalho de inteligência artificial da Associação Brasileira das Empresas de Software (ABES) e Crisleine Yamaji, gerente jurídica e DPO da Federação Brasileira de Bancos (Febraban).
A exceção foi Fabrício da Mota Alves, sócio e coordenador da área de Direito Digital e Proteção de Dados do Serur, que foi membro da Comissão de Juristas do Senado Federal. O especialista reconheceu a validade da maioria das críticas, mas frisou não existir “legislação boa ou má”, mas “leis com consequências”.
“Não é um Fla-Flu. Não é uma guerra. Não há o intuito de se ganhar ou perder,” afirmou, alertando para o perigo de uma experiência semelhante à registrada com a tramitação da LGPD. “Ela trouxe feridas, trouxe problemas. A LGPD poderia ter sido uma norma muito melhor do que foi, em função disso. (…) Não é saudável para o país.”
O relator do marco da inteligência artificial adiantou que o próximo passo é aprovar o projeto em uma comissão especial no Senado, a ser instalada nos próximos dias. “Regular a inteligência artificial é uma unanimidade nas Casas Legislativas,” garantiu Eduardo Gomes.