Isabella Macedo

Acelerado para esclarecer as acusações de cobrança de propina na aquisição de vacinas, o depoimento do representante da Davati Medical Supply, Luiz Paulo Dominguetti Pereira, nesta quinta-feira (1º) elevou a temperatura da CPI da Pandemia e acendeu um alerta entre os senadores de que o policial militar foi usado ou plantado para desviar rumos da investigação sobre a negociação da vacina indiana Covaxin. 
Depois de reiterar a cobrança de US$ 1 dólar por dose de imunizante na compra de vacinas Astrazeneca, Dominguetti apontou os irmãos Luís Ricardo e Luis Miranda - deputado federal pelo DEM do DF - como intermediários em uma negociata para trazer vacinas ao Brasil. A acusação sobre sobre os irmãos Miranda foi apresentada por meio de um áudio no qual o parlamentar fala sobre a negociação de um produto não especificado.
<a href="https://www.jota.info/produtos/poder?utm_source=Banner%20site&amp;utm_medium=Artigos&amp;utm_campaign=CTA_Poder_materias"><picture><img class="size-medium wp-image-292717 aligncenter webpexpress-processed" src="https://www.jota.info/wp-content/uploads/2021/05/jota-pro-poder8.png" sizes="(max-width: 688px) 100vw, 688px" srcset="" alt="" width="688" height="688" /></picture></a>No áudio, Miranda diz que falará direto com um comprador e pediria “prova de vida” do produto, que não é identificado no áudio. Em seguida, o deputado afirma que o referido comprador tem potencial para pagar instantaneamente e que, se o produto estiver “no chão” e citar o nome do parlamentar, seria compreensível a veracidade da proposta. 
Minutos depois da exibição da gravação, o deputado apareceu na CPI e desmentiu, em conversa reservada com Aziz, Fernando Bezerra Coelho (MDB-PE) e Marcos do Val (Podemos-ES), que a conversa gravada tratasse de vacinas. 
“O que ele diz é que esse áudio é de 2020, que é uma negociação nos Estados Unidos, não tem nada a ver com o Brasil, é um áudio em que nem se falava em vacinas ainda, e que está editado aqui para prejudicá-lo. Ele foi agora à polícia levar o áudio completo, fazer uma denúncia-crime e irá dispor pra gente a edição do áudio. Está certo? Que ele, a testemunha aqui neste momento, fala até no irmão”, disse Omar.
O celular do policial militar foi retido pela Polícia Legislativa, a pedido da CPI, para que o conteúdo fosse espelhado e periciado. Após o fim do depoimento, Dominguetti e seu advogado aguardaram por mais de uma hora a liberação do aparelho.
O áudio disparou alerta entre os senadores, que viram no depoimento a intenção de plantar um chamariz para tentar descredenciar os irmãos Miranda, isentar o presidente Jair Bolsonaro (sem partido) da suspeita de prevaricação, e apontar para o segundo escalão do Ministério da Saúde no caso da compra da Covaxin.  
A senadora Simone Tebet (MDB-MS) afirmou que o depoimento de Dominguetti é um “bode na sala”. “Digo isso porque a pergunta que fica é se esse bode veio espontaneamente ou foi plantado. E, quando eu falo em bode na sala, não estou me referindo a vossa senhoria, eu estou me referindo a um áudio fraudulento sacado do bolso do colete, que está comprovado, pelas atas, que ele está editado e que não condiz com a verdade, nem com os fatos, nem do que nós estamos querendo apurar aqui”.
O senador Alessandro Vieira (Cidadania-SE) apontou que Miranda registrou o conteúdo do áudio em cartório para atestar que Dominguetti reproduziu uma versão falsa ou descontextualizada de seu áudio. “O deputado federal Luis Miranda compareceu e apresentou todo o conteúdo dos diálogos, áudios, prints e conversas que teve, se eu não estiver enganado, no mês de setembro de 2020, falando sobre venda de luvas. Esse é o áudio que o senhor apresentou para esta CPI como se fosse um áudio referente à intermediação de venda de vacinas. O senhor tem noção da gravidade do que o senhor está fazendo?”
Vieira chegou a pedir a prisão em flagrante do depoente, mas o pedido foi negado pelo presidente da comissão, Omar Aziz (PSD-AM). 
Mesmo senadores governistas afirmaram que Dominguetti precisaria ser investigado por apresentar provas fraudulentas à comissão. O senador Marcos Rogério (DEM-RO), afirmou que se tratava de “caso de polícia”. “Esse personagem parece protagonista de golpes Brasil afora”, afirmou. 
O líder do governo, Fernando Bezerra, afirmou se tratar de um caso de “aventureiros”. “Nós, da base do governo, queremos ir a fundo nessas investigações. Quem não se comportou como deveria se comportar; quem não cuidou de zelar pelo interesse público que seja, de fato, punido, mas é importante também perceber que se trata, claramente, de aventureiros e sem quaisquer qualificações para tratar de assuntos dessa magnitude”. 
Na síntese do depoimento, o relator da CPI, senador Renan Calheiros (MDB-AL), destaca que o policial militar parece ser inexperiente não apenas em questão de insumos ligados à saúde, mas também em vendas, o que reforça a desconfiança da CPI sobre Dominguetti: “O depoente denota não ter experiência em vendas, não conhece de medicamentos e insumos hospitalares, não possuía, segundo seus relatos, contatos no Ministério da Saúde”. 
Aziz, entretanto, adotou um discurso mais ponderado. Para o presidente da CPI, Dominguetti pode ter sido induzido a erro pelo representante oficial da Davati no Brasil, Cristiano Alberto Carvalho, que teria enviado o áudio ao policial militar. “Com certeza [foi induzido a erro]. Ele não mostraria, e aí, sim, ele foi orientado a mostrar. Porque ele não falou isso na reportagem? Como é que esse áudio foi parar na mão do Cristiano? Ele pode não saber como foi passado, mas o Cristiano sabe quem passou e vai nos dizer”, disse o presidente da comissão. “Em relação à CPI, o Cristiano tem muita coisa pra explicar aqui”, afirmou.
A convocação de Cristiano Alberto Carvalho foi aprovada ontem pelos senadores, mas ainda não há data marcada para que ele preste depoimento. Na próxima semana, estão previstas a oitiva de Regina Célia Silva Oliveira, servidora do Ministério da Saúde e fiscal do contrato da Covaxin, na terça-feira (6/7); Roberto Ferreira Dias, ex-diretor do Departamento de Logística em Saúde do ministério e apontado como o reponsável por cobrar a propina para a venda da vacina, na quarta-feira (7/7); e Carolina Palhares Lima, Diretora da Diretoria de Integridade (Dinteg) da pasta, na quinta-feira (8/7). Na sexta (9/7), está prevista a diligência para ouvir o ex-governador do Rio Wilson Witzel (PSC).

51283605061_ae20e8cd40_k

https://images.jota.info/wp-content/uploads/2021/09/copy-of-jota-logo-high-cmyk.jpeg

JOTA

Testemunha acusa deputado de negociar vacinas, mas é desmentido e gera desconfiança entre senadores

CPI vê artifício para confundir investigação em depoimento de Dominguetti

Depoimento do representante da Davati Medical Supply acendeu alerta de que testemunha teria sido plantada para atrapalhar investigações