Andrea Murta

Depois da explosão de “fake news” e da interferência da Rússia nas eleições americanas de 2016 via mídias sociais, gigantes da tecnologia do país enfrentam um cenário cada vez mais agressivo contra a falta de controle sobre suas operações. Nesta semana, Google, Facebook e Twitter terão de depor no Congresso dos EUA, onde uma proposta de lei já tramita para tentar obrigar as empresas a criar mais transparência na difusão de propagandas políticas.
Se é impossível quantificar exatamente o impacto das fake news e da atuação russa no resultado da eleição presidencial do ano passado, há poucas dúvidas sobre sua propagação massiva na rede. Segundo o projeto Propaganda Computacional, da Universidade de Oxford, que estuda “fake news” e campanhas políticas online, na semana da eleição do ano passado, o público de estados onde a disputa entre Donald Trump e Hillary Clinton estava incerta tinha a mesma chance de ver fake news ou noticias reais no Twitter.
E pior: nacionalmente, usuários do Twitter foram expostos a mais conteúdo polarizado, conspiratório e falso do que a notícias reais. Muito do conteúdo divulgado, aliás, continha links criados por operadores russos, ainda de acordo com o projeto Propaganda Computacional. 
Os gigantes tech não negam o ocorrido. Recentemente, Twitter e Facebook entregaram relatórios ao Congresso listando boa parte das propagandas políticas compradas e divulgadas pelos russos em suas redes. Segundo o Facebook, operadores russos gastaram pelo menos US$ 100 mil em anúncios políticos na eleição de 2016. 
O Google enfrenta desafio similar: conteúdo falso com frequência aparece em resultados de buscas acima de notícias reais. Um exemplo recente diz respeito ao tiroteio em Las Vegas, que deixou 58 mortos e quase 500 feridos. Até hoje, uma busca no YouTube – controlado pelo Google - a respeito do tiroteiro lista na primeira página de resultados vídeos sugerindo que o evento foi criado propositadamente pelo governo americano para aterrorizar seus cidadãos. E, assim como Facebook e Twitter, o Google admitiu que operativos russos compraram anúncios políticos e usaram nomes falsos para espalhar mensagens polarizadoras antes e depois da eleição de 2016.
Apesar da forte polêmica, há muita lentidão das empresas nas tentativas de tentar resolver o problema. Até agora, o público geral não teve acesso nem ao conteúdo identificado como fruto de interferência estrangeira nem a textos falsos ou conspiratórios criados por usuários locais e divulgados entre seus contatos nas redes. 
Sob pressão, diretores jurídicos dos três gigantes deporão publicamente na quarta-feira, 1 de Novembro, sobre ações russas em suas redes durante as eleições. Eles também discutirão um projeto de lei introduzido por dois senadores democratas (Amy Klobuchar e Mark Warner) e um republicano (John McCain) para obrigar propagandas políticas online a divulgar suas fontes de financiamento. Atualmente, apenas propagandas em mídias tradicionais como TV e rádio têm requerimento do tipo. 
A chamada Lei dos Anúncios Honestos (Honest Ads Act, H.R.4077) requer que plataformas digitais com ao menos 50 milhões de visitantes por mês mantenham um arquivo público de todas as comunicações eleitorais compradas por pessoas ou grupos que gastem mais de US$ 500 em suas redes. O arquivo terá de contar uma cópia do anúncio, descrição da audiência escolhida para recebe-lo, número de vezes que o anúncio foi visto, datas de publicação, custo e contato do comprador.
A lei parece ter sido introduzida no momento certo. O Facebook anunciou na semana passada que pretende colocar informações de financiamento em anúncios futuros. O Twitter também afirmou que acrescentará dados sobre compradores de anúncios políticos e baniu anúncios de duas organizações de mídia russas. 
O problema da segmentação também deve ser abordado no Congresso, apesar de não ser o alvo direto da lei dos Anúncios Honestos. Na segmentação de audiências, a questão não é apenas quem compra o anúncio, mas quem o consome: Facebook e similares permitem ao usuário escolher o público ao qual a propaganda é dirigida, enquanto o restante sequer fica sabendo o conteúdo que está sendo divulgado. 
A segmentação não apenas torna qualquer monitoramento federal mais difícil, mas também facilita a difusão de mensagens falsas e polarizadoras. Além disso, segmentação em plataformas menores não será captada pela lei dos Anúncios Honestos. 
Há alguma discussão sobre arquivos que disponibilizariam toda e qualquer propaganda política sendo veiculada em redes sociais ao público em geral, mas isso ainda não foi feito pelas gigantes. O que existe é fruto da ação de ativistas americanos de grupos como a Sunlight Foundation e a ProPublica, que já se organizaram para buscar e divulgar, por meios próprios ou crowdsourcing, todos os anúncios veiculados pelas mídias sociais.
Por fim, existe pressão de grupos sociais contra fusões e aquisições de firmas de tecnologia devido a preocupação com monopólios no setor. Mas ao contrário da Europa, onde o Google foi multado em US$ 2,7 bilhões por supostamente abusar seu monopólio em buscas online, nos Estados Unidos o apego do governo atual ao Estado mínimo restringe qualquer ímpeto neste sentido.
O cenário mais provável nos EUA é de avanço moderado no tema, ao menos por enquanto. O clima político está esquentando, mas na terra da liberdade de expressão ações revolucionárias para limitar o poder das mídias são raras. A chance de um candidato em 2020 partir para o ataque aos gigantes da tecnologia, porém, são vistas como altas.

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JOTA

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