Bárbara Mengardo

Discussões polêmicas com altos valores envolvidos, sessões que entraram noite adentro, muitos pedidos de vista e turmas incompletas marcaram a primeira semana de julgamentos do Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (Carf), depois da paralisação decorrente da Operação Zelotes. As características da retomada foram reflexos da turbulência que marcou o tribunal administrativo em 2015.
O ano que termina foi atípico para advogados tributaristas e auditores fiscais que atuam no conselho. Afinal de contas, os julgamentos foram suspensos por quase nove meses, período em que o Ministério da Fazenda adotou medidas para tentar recuperar a credibilidade abalada com as denúncias de compra de decisões, manipulação de julgamentos e prisão de ex-conselheiros.
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Enquanto o Senado dava andamento a uma pouco produtiva Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI), a Fazenda “vendia” um “novo Carf”. O regimento interno foi reescrito, o número de turmas enxugado, a distribuição de processos agora é eletrônica e os conselheiros representantes dos contribuintes passaram a ser remunerados por sessão que participa.
A gratificação de até R$ 11,2 mil e a consequente decisão da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) de proibir advogados de atuar como julgadores do Carf levaram a uma debandada de representantes dos contribuintes, e a renovação quase integral da composição.
Enquanto isso, a instabilidade na relação Congresso-Executivo fez o governo esperar seis meses pela liberação da verba para pagar os conselheiros em 2015, medida essencial para a retomada dos julgamentos. Com a previsão da rubrica na lei orçamentária no final de novembro, muitos acreditavam que o Carf estaria pronto para recomeçar em 2016.
Mas o governo tinha pressa de retomar os trabalhos do tribunal que conta com um estoque de processos da ordem de R$ 500 bilhões. Sob a presidência do ex-secretário da Receita Federal, Carlos Alberto Barreto reuniu seus conselheiros entre os dias 7 e 11 de dezembro, com a tarefa de analisar uma pauta de mais de 1,5 mil processos.
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As pautas de julgamentos foram publicadas com tributaristas preocupados com os efeitos da troca de conselheiros nas decisões. Havia o receio de alteração de jurisprudência beneficiando o Fisco ou falta de experiência na análise de casos tributários complexos.
Parte das críticas, conforme apurou o JOTA, prevaleceram após o término da primeira semana de julgamentos. Em algumas turmas, as discussões sobre os processos ficaram circunscritas aos conselheiros veteranos, em sua maioria representantes do Fisco. Muitos casos importantes saíram de pauta por pedidos de vista dos novos julgadores.
“A inexperiência se traduziu em pedidos de vista”, resumiu um advogado ao JOTA.
Barreto, porém, apresentou ponto de vista distinto. “Tanto nas turmas quanto nas câmaras superiores eram esperados pedidos de vista, mas [o que realmente ocorreu] não destoou da média”, disse.
Para o presidente do Carf, “é natural” que a troca de conselheiros possa alterar a jurisprudência, o que, para ele, não aconteceu na semana de retomada.
Tributaristas também se preocuparam com o fato de, na semana de dezembro, terem sido disponibilizadas apenas vistas coletivas aos processos. Isso significa que, quando o caso voltar, nenhum outro conselheiro poderá retirar o processo de pauta para analisá-lo melhor.
Para advogados que atuam no Carf, o fato demonstra que as primeiras sessões de 2016, quando o conselho volta do recesso, serão recheadas de decisões em casos vultuosos.
Falta gente
A saída de conselheiros também refletiu na composição das sessões. O Carf voltou à ativa com vagas em aberto, o que afetou a paridade entre contribuintes e Fisco em algumas turmas. A 2ª Turma da 4ª Câmara da 1ª Seção, por exemplo, analisou casos com quatro dos seis conselheiros previstos na composição original, sendo que apenas um deles representava os contribuintes.
Um dos processo previstos para análise da turma discute aproveitamento de ágio pelo Banco Volkswagen, que totalizava R$ 100 milhões. O caso, porém, foi retirado de pauta antes do início do julgamento.
Liminares
A decisão da OAB que entendeu a função de julgador do Carf incompatível com a advocacia motivou duas conselheiras que representam os contribuintes a procurar a Justiça. Ambas pediram para não entregarem as carteiras da Ordem na primeira semana de julgamentos. As conselheiras Valdete Aparecida Marinheiro e Luciana Mattos Pereira Barbosa conseguiram liminares para continuar na advocacia até que a OAB finalize o julgamento dos embargos de declaração relacionados à questão da incompatibilidade.
A ausência de conselheiros e as liminares eram assuntos frequentes nos corredores do tribunal, assim como a impossibilidade de pedir preferência de julgamentos na primeira semana. O mecanismo é utilizado por advogados para “mexer” na ordem de julgamento, colocando na frente casos nos quais os representantes das partes estão presentes para acompanhar ou fazer sustentações orais.
Na primeira sessão de julgamentos, porém, os pedidos não puderam ser feitos. Advogados reclamaram por terem ficado nas salas de sessões assistindo a casos nos quais não havia nenhum representante presente. Um tributarista narrou que chegou a perder a festa de fim de ano do escritório, em São Paulo, porque teve que atrasar o voo de volta.
As “esperas” também foram causadas pelo tamanho das pautas. A 1ª Turma da Câmara Superior, por exemplo, só conseguiu finalizar seis dos 11 temas escolhidos pela presidência. Foram adiados casos envolvendo assuntos polêmicos, como Juros Sobre Capital Próprio (JCP) e tributação de lucros no exterior.
Segundo Barreto, o problema foi restrito às câmaras superiores. “As turmas ordinárias julgaram a maioria dos processos pautados”, disse.
Meio bilhão
Cumprindo o que já havia anunciado antes da volta dos julgamentos, o presidente do Carf pautou casos grandes e polêmicos para a primeira semana. Sobre ágio foram selecionados casos envolvendo empresas como a Natura, o Banco Cacique e a Companhia Energética de Pernambuco (Celpe), que somam, no mínimo, R$ 500 milhões. A maioria dos processos foi retirado de pauta após pedido de vista.
A 3ª Turma da Câmara Superior julgou ainda – de forma desfavorável às empresas – caso sobre a tributação de distribuidoras de energia elétrica. O precedente desfavorável deverá ser replicado em cerca de cem casos sobre o tema em tramitação no Carf.
O Santander também teve um caso analisado, de aproximadamente R$ 120 milhões. O caso foi julgado de forma favorável à Fazenda Nacional, e a maioria dos conselheiros da 1ª turma da Câmara Superior entendeu que deve ser aplicada a trava de 30% para aproveitamento de prejuízo fiscal na incorporação de empresas.
Zelotes, uma questão do passado?
Pouco se falou da Operação Zelotes na semana de retomada do Carf. Em seu discurso de abertura, Barreto disse que quer "recuperar a reputação e a imagem da instituição”. Depois disso, não tocou mais no assunto.
<a style="color: #ff6600;" href="https://www.jota.info/tudo-sobre/zelotes">Veja a cobertura completa do JOTA sobre a Zelotes</a>
Também não foram alvos de comentários pelo presidente ou pelos conselheiros os trabalhos da Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) do Carf, finalizada em 3 de dezembro. Os senadores que compunham a comissão foram enfáticos ao afirmar que deverão acabar com a paridade no conselho.
Tramita no Senado a PEC 112 proposta pelo presidente da CPI, senador Ataídes Oliveira (PSDB-TO), que prevê o ingresso no Carf apenas por concurso público, sem a distinção entre conselheiros do Fisco ou dos contribuintes.
Com uma expectativa de andamento rápido, a tramitação da proposta foi atingida pela ciranda de surpresas que marcaram 2015. O presidente da Comissão de Constituição e Justiça, José Maranhão (PMDB procura agora um novo relator para a proposta, depois que o antigo, senador Delcídio do Amaral, foi preso na Operação Lava Jato.
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JOTA

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