Luciano Bottini Filho

JOTA

O Órgão Especial do Tribunal de Justiça de São Paulo revogou uma liminar que suspendia uma lei estadual para inibir o cadastro indevido de devedores.
Aprovado em janeiro deste ano, o projeto regulamentou a inclusão e exclusão de nomes nos sistemas de proteção de crédito, como o SERASA e SPC. O texto dispõe que os devedores devem ser notificados por carta com aviso de recebimento e têm um prazo de 15 dias para pagar antes de serem negativados.
Ainda, o consumidor que se sentir lesado ou questionar o débito pode entrar com recurso na entidade que fez o cadastro. Apresentadas as provas, a empresa que gerencia a lista tem dois dias para retirar a restrição. Pela lei, não é preciso que o comerciante ou prestador de serviço confirme que a dívida foi quitada.
Em março, o TJSP havia suspendido a lei, a pedido da Federação das Associações Comerciais do Estado de São Paulo (Facesp), em uma ação declaratória de inconstitucionalidade. A revogação da liminar foi dada na última sessão do Órgão Especial, no dia 12.
O advogado da entidade, Sérgio Bermudes, declarou que a regulamentação era “uma sentença de morte” e que causaria danos irreparáveis aos administradores dos bancos de dados que teriam maior dificuldade para comprovar a notificação dos consumidores.
O processo provocou certa movimentação de entidades perante o Tribunal de Justiça. A Corte estadual admitiu diversos amicus curie como os diretórios do PT e PMDB, a Federação Brasileira dos Bancos e a associação de defesa dos consumidores Proteste.
Dados da Proteste e do Sistema Nacional de Proteção ao Consumidor revelam que uma das maiores fontes de reclamações em órgãos de defesa do consumidor refere-se à negativação de consumidores: aproximadamente 20% das 28.300 reclamações recebidas em 2014 pela associação são relativas a essa questão. As queixas vão de lançamentos indevidos em cadastros ou em bancos de dados privados a consumidores que afirmam não terem recebido informação alguma de que iriam para a lista.
Advogados da Proteste descrevem o sistema sem regulamentação como um cenário de total ilegalidade e descontrole. Pelo modelo anterior, qualquer eventual credor dos consumidores, por meio de um “login” e senha, acessam os bancos de dados de que são associados e negativam o cliente com apenas um clique.
A Febraban interveio para eliminar a todo o custo a notificação pessoal dos devedores. Os bancos ficaram preocupados com o custo que a adequação às regras traria à recuperação de crédito. Em vez de emails, mensagens por celular ou gravações por telefone, o desembolso de um aviso escrito dificultaria as operações em grande escala e daria margem a intermináveis contestações judiciais.
"Ao colocar em risco a validade de milhares de inscrições realizadas em cadastros de proteção ao crédito, a lei estadual dará azo para que se questione, em uma verdadeira indústria de ações judiciais, a ocorrência de danos morais pela suposta ausência de regular procedimento de notificação", afirmou, em parecer, a Febraban.
Economista e vice-presidente do Insper, Marcos Lisboa foi escalado pelas instituições financeiras para demonstrar o desastre do projeto, aprovado não só em São Paulo, mas em Mato Grosso e no Rio de Janeiro.
O estudo aponta consequências nefastas. Os gestores dos bancos de dados cadastrarão menos pessoas e demorarão muito mais para fazer as inclusões. A qualidade das informações cairá, o que prejudicará os modelos de concessões de crédito com os quais as instituições financeiras fazem suas previsões.
"Para se proteger, as instituições financeiras tenderão a ser mais conservadoras na sua concessão de crédito", antevê o economista. A análise estima um freio na oferta de crédito entre 4 e 9% a pessoas físicas e entre 11 e 17%, nas jurídicas. As cifras em jogo, segundo Lisboa, representam uma retração de crédito da ordem de R$ 250 a R$ 430 bilhões. O montante é um golpe nas finanças da população de baixa renda, as quais ficariam cada vez mais distante da política da inclusão de crédito do Banco Central.
Apesar de a liminar ter sido revogada, o processo está longe de terminar. A discussão toda está centrada em se uma lei estadual pode interferir em matéria de defesa do consumidor e relações creditícias. O tema já é alvo de repercussão geral do Supremo Tribunal Federal e os desembargadores paulistas resolveram aguardar a palavra final da última instância. Na última sessão, o TJSP decidiu que o processo ficará suspenso até os julgamentos de outras ações que estão no Supremo para seguir com o mesmo desfecho.

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Órgão especial derrubou liminar que suspendia lei estadual

TJSP reativa lei que exige notificação prévia de devedores antes de negativação

Órgão especial derrubou liminar que suspendia lei estadual