Guilherme Pimenta

O subprocurador-geral do Ministério Público junto ao Tribunal de Contas da União (TCU), Lucas Rocha Furtado, tem tirado o sono de alguns gestores da administração federal e causado incômodo ao próprio presidente Jair Bolsonaro.
Autor de 173 representações desde janeiro de 2019, o procurador afirma que seu papel é fiscalizar o chefe do Executivo, independentemente de quem seja o mandatário.
"Atualmente, o presidente é o Bolsonaro, ele é o chefe do Executivo. Por isso, não há outra pessoa para fiscalizar, necessária e obrigatoriamente será ele", afirmou Lucas Furtado em entrevista ao JOTA.
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Boa parte das ações de Lucas Furtado é baseada em reportagens publicadas em meios de comunicação, principalmente aqueles alvos de críticas do presidente da República.
A ação incisiva de Lucas em face do Executivo é criticada por alguns de seus colegas. Acusado por bolsonaristas, colegas de MPTCU e também por alguns ministros da Corte de agir com interesses políticos, o procurador rebate: "Não sou candidato a nada. Não é porque minhas representações envolvem temas do governo que tenho interesses políticos", falou Furtado.
Desde o início do mandato de Bolsonaro, somente na Esplanada dos Ministérios, já foram alvo do procurador de contas atos de gestão dos ministros Paulo Guedes (Economia), André Mendonça (Justiça), Bento Albuquerque (Minas e Energia), Ricardo Salles (Meio Ambiente) e Ernesto Araújo (Relações Exteriores), os ex-ministros Sergio Moro (Justiça), Abraham Weintraub (Educação) e Osmar Terra (Cidadania), além do próprio presidente e seus assessores mais próximos.
Quando Bolsonaro excluiu o jornal Folha de S.Paulo de uma licitação que assinaria jornais para a administração federal, Furtado ingressou com uma representação no mesmo dia, solicitando a re-inclusão do veículo. Dias depois, o governo recuou e cancelou o certame.
Em outro caso envolvendo o núcleo do presidente, Lucas Furtado solicitou que o TCU suspendesse os anúncios que o Banco do Brasil vinha realizando em blogs e sites que divulgam informações falsas. O plenário da Corte atendeu a representação do procurador e suspendeu toda a publicidade estatal do BB na internet.
Suas ações, no entanto, não são restritas ao núcleo bolsonarista e também chegam às outras instituições da Praça dos Três Poderes. Rodrigo Maia, Davi Alcolumbre, presidentes da Câmara dos Deputados e do Senado Federal, respectivamente, e Dias Toffoli, presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), também caíram na mira de Furtado em algum momento.
Em um processo, as autoridades foram alvos de representação do procurador para que o uso de aviões da FAB fosse disciplinado. Nesse caso, o procurador citou a realização de um voo por Toffoli para supostamente comemorar seu aniversário, em São Paulo.
"Absolutamente ninguém gosta de ser fiscalizado, seja o governo A ou B. Mas fiscalização não pode ser confundida com posição política", declarou.
Na última quinta-feira (16/7), o procurador chegou a pedir o afastamento do secretário-executivo do Ministério das Comunicações, Fábio Wajngarten, devido a um suposto descumprimento de decisão da CGU. O JOTA apurou, porém, que o pedido não deve prosperar entre os ministros do TCU, que tem estreitado o canal de diálogo com o ex-titular da Secom.
<h3>Comparações</h3>
O subprocurador evita tecer comentários diretos sobre o presidente e sua gestão à frente do Palácio do Planalto, e se considera "uma mera ponte" entre o que é publicado na imprensa, principalmente, e o órgão de controle responsável por analisar o uso do dinheiro público.
Há 25 anos no MPTCU, Lucas Furtado já teve como subordinados os atuais ministros Benjamin Zymler e Augusto Sherman, que foram chefes de gabinete do procurador.
Devido a um acidente vascular cerebral (AVC) ocorrido em 2008, ele teve parte de sua memória comprometida. Não lembra, por exemplo, de sua atuação em governos anteriores, quando ocupou o posto máximo de procurador-geral do MP junto ao TCU.
"Em uma rede social, após uma representação, perguntaram onde eu estava na gestão do presidente tal. Respondi que estava internado, me recuperando de um AVC", rebateu o procurador.
Ele faz questão de dizer, porém, que optou por trabalhar depois do grave acidente. "Depois do AVC, ou representava ou aposentava. Preferi a opção um. Não me arrependo", declarou.
<h3>Polêmicas</h3>
Nos bastidores, além de críticas por supostamente agir politicamente, seu trabalho atuante em face do Executivo tem rendido debates entre os ministros da Corte, que por vezes alegam que Furtado ultrapassa os limites constitucionais da atuação do MP junto ao TCU ou que não cumpre pré-requisitos para apresentar representações.
Recentemente, quando relatou a representação do procurador sobre o uso de aeronaves da FAB para o transporte de autoridades dos três poderes, o ministro Augusto Sherman, seu antigo subordinado, votou por não conhecer da peça.
Na ocasião, o ministro concordou com a área técnica do TCU e concluiu que a ação não possuía os requisitos mínimos de admissibilidade.
"O MPTCU precisa seguir as regras de nosso regimento interno e a Constituição Federal", votou Sherman.
Seu voto levou a um debate acalorado com o ministro Bruno Dantas, que rebateu Sherman ao afirmar que não conhecer de uma representação do MPTCU deve ser uma providência que o Tribunal deve tomar em "pouquíssimos casos".
"O TCU, na medida do possível, precisa expandir a competência do MP, e não tolhê-la", discordou Dantas. Ao final, sua tese foi a vencedora por maioria.
Na última quarta-feira (15/7), ao julgar mais um processo envolvendo publicidade oficial do governo após uma representação de Furtado com base na imprensa, Sherman voltou a criticar o teor da peça. Segundo o ministro, não é possível se basear na imprensa já que ela não seria "totalmente confiável" e teria seus interesses.
"Fake news hoje também são encontradas em diversas matérias de jornais, não só na internet", criticou Sherman.
Segundo o subprocurador-geral, a crítica sobre ultrapassar a linha de atuação também é descabida, uma vez que a Justiça brasileira e outros órgãos de fiscalização são, por vezes, falhos. Portanto, não poderia haver vácuo de poder. "Qualquer vácuo deve ser preenchido por qualquer órgão. Se a fiscalização deveria ser exercida por um órgão e não é, outro deve fazer", avaliou.
Na última semana, em outra representação polêmica, o subprocurador de contas chegou a solicitar a suspensão da prorrogação do auxílio emergencial, sob risco de o benefício prejudicar ainda mais o equilíbrio fiscal do país.
"Parece uma contradição se falar, ao mesmo tempo, em abertura e prorrogação do auxílio. Por isso, é preciso investigar se está havendo fraude que pode afetar a geração atual e futura", disse. Ele considera essa representação a mais importante que apresentou nos últimos tempos.
Ao JOTA, Furtado afirmou que essa ação, assim como todas as demais, servem para "colocar a bola no jogo", já que as peças são endereçadas à área técnica do TCU para serem avaliadas pelos auditores do Tribunal. "Caso não tenha nenhuma irregularidade, serei o primeiro a pedir o arquivamento", avisou.
Questionado se ele não teme que sua ação possa prejudicar milhões de brasileiros vulneráveis, Lucas Rocha Furtado responde: "Minha função é provocar a discussão. Apresentei essa representação temendo que ela possa atingir muitas pessoas, mas preciso cumprir minha função."

Subprocurador-geral do Ministério Público junto ao TCU, Lucas Rocha Furtado (Foto: Divulgação TCU)

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JOTA

Autor de diversas representações contra o governo, Lucas Rocha Furtado avalia que seu papel é 'colocar a bola no campo'

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'Bolsonaro é o presidente, e obrigatoriamente vou fiscalizá-lo', diz procurador do TCU

Autor de diversas representações contra o governo, o subprocurador Lucas Rocha Furtado avalia que seu papel é 'colocar a bola no campo'.