Bárbara Pombo

O Superior Tribunal de Justiça está a um voto de decidir se débitos inscritos em dívida ativa podem ser protestados em cartório antes da entrada em vigor da Lei 12.767/2012, que deu mais esse instrumento de cobrança ao Fisco. O julgamento interrompido no dia 4 de agosto foi retomado nesta terça-feira (6/10) com três votos divergentes ao da relatora do caso, ministra Regina Helena Costa. A conclusão, porém, foi adiada pelo pedido de vista do ministro Benedito Gonçalves, último a votar.
A questão tem gerado debate entre os ministros por ser inédito na turma. No caso analisado (EDcl no AgRg no Ag 1316190), o STJ impediu, em 2011, que o município de Londrina (PR) protestasse dívidas fiscais da Empinox Indústria Metalúrgica. A decisão foi fundamentada na jurisprudência dominante na Corte que entendia haver ausência de interesse do Fisco em levar a protesto a Certidão da Dívida Ativa (CDA), título que já teria presunção de certeza e liquidez e que confere publicidade à inscrição do débito na divida ativa.
Da decisão, o município de Londrina interpôs embargos de declaração. Um dos fundamentos seria o de que a jurisprudência da Corte teria sido revista em 2012 pela 2ª Turma do STJ. Na ocasião, os ministros reformaram decisão do Tribunal de Justiça do Paraná, e autorizaram o protesto com base na Lei 9.492/1997, que regulamenta os serviços de protesto. A decisão foi unânime. A interpretação foi de que a norma não disciplinaria apenas o protesto de títulos cambiais nem versaria apenas sobre relações de direito privado. A turma ainda pontuou que a Lei 12.767/2012 seria “meramente” interpretativa, o que possibilitaria sua aplicação para fatos anteriores a sua vigência.
Ao analisar o recurso, a ministra Regina Helena Costa entendeu que o acórdão deveria ser reformado para permitir a nova forma de cobrança em cartório. Para a ministra, haveria situação nova com a edição da lei de 2012, o que justificaria a mudança do julgado. O voto é fundamentado no artigo 462 do Código de Processo Civil (CPC), de 1973.
“O julgador não pode fechar os olhos para o passado. Por que ignorar um fato novo se o desfecho do julgamento ainda está pendente?”, afirmou a ministra, nesta terça-feira (6/10), acrescentando que a lei teria resolvido a polêmica sobre a possibilidade ou não de protesto de CDA.
Ao apresentar o voto vista, o ministro Sérgio Kukina abriu a divergência para negar os embargos. Ao contrário do que defendeu veementemente a ministra Regina Helena, Kukina afirmou ter dúvidas sobre o caráter procedimental da lei que possibilitou o protesto. Para ele, a nova norma não alcançaria fatos passados porque ela não estaria em nenhuma das hipóteses do art. 106 do Código Tributário Nacional, que elenca os casos em que a lei se aplicará a fatos pretéritos.
“Admitir o protesto é impor uma situação mais gravosa ao contribuinte”, afirmou o ministro, citando doutrina da própria ministra Regina Helena sobre retroação benéfica.
Kukina também afastou o argumento do município de Londrina de que o julgamento do processo deveria ter sido sobrestado diante da afetação do tema como repetitivo. De fato, o REsp 1.126.515/PR havia sido escolhido como representativo dessa controvérsia, mas o tema foi desafetado posteriormente pelo ministro Herman Benjamin.
Apesar de discordarem sobre o caráter procedimental ou material da lei de 2012, os ministros Sérgio Kukina e Regina Helena Costa concordaram que a norma não seria interpretativa, como entendeu a 2ª Turma.
“A revisão do posicionamento da Corte pela 2ª Turma não tem o condão de estremecer um entendimento lastreado em forte jurisprudência anterior”, afirmou Kukina. “Eu concordo com a decisão da 2ª Turma, mas não por esse fundamento”, complementou Regina Helena.
Os ministros Napoleão Nunes Maia Filho e o desembargador convocado Olindo Menezes (TRF1) adentraram mais na legalidade da lei. Afirmaram que o Fisco não precisa dessa forma de cobrança, pois já possui a lei de execução fiscal. Questionaram ainda margem que a norma dá para que o Fisco escolha qual dívida protestará em cartório.
“É uma forma de constranger o contribuinte até porque a lei não diz que o protesto é obrigatório”, disse Menezes. “Não darei carta branca ao Fisco escolher qual CDA protestar”, completou Maia Filho.
Já está nas mãos do Supremo Tribunal Federal a decisão sobre a constitucionalidade da Lei 12.767/2012. A Corte analisará o assunto a partir da ADI 5135, ajuizada pela Confederação Nacional da Indústria (CNI). O relator é o ministro Roberto Barroso. Em parecer apresentado em janeiro, o Ministério Público Federal defende a constitucionalidade da forma de cobrança.
Para o procurador-Geral da República, Rodrigo Janot, "o protesto de CDAs não configura sanção política, à luz da jurisprudência do STF segundo a qual sanção política é medida administrativa que inviabilize a atividade econômica, impeça apreciação do Poder Judiciário ou possua contornos desproporcionais".

15526394508_cf5dcc2258_k

https://images.jota.info/wp-content/uploads/2021/09/copy-of-jota-logo-high-cmyk.jpeg

JOTA

1ª Turma está a um voto de bater o martelo sobre a questão

STJ vai definir se Receita pode protestar dívidas em cartório antes da Lei 12.767/2012

1ª Turma está a um voto de bater o martelo sobre a questão