A 1ª Turma do Supremo Tribunal Federal (STF) decidiu por maioria, nesta terça-feira (29/11), trancar a ação penal contra o padre Jonas Abib, por suposta ofensa a grupo religioso – no caso o espiritismo – em face de trechos do seu livro “Sim, Sim, Não, Não/ Reflexões de Cura e Libertação”, publicado em 2007, e já na 98ª edição.
O sacerdote foi denunciado pelo Ministério Público do Estado da Bahia, em 2008, que o acusou de “fazer afirmações discriminatórias à religião espírita e às religiões de matriz africana, como a umbanda e o candomblé”.
A maioria dos ministros da turma do STF entendeu que, apesar da suposta ofensa a um grupo religioso, o caso se enquadrava nos direitos à liberdade religiosa e de expressão.
Relator do caso, o ministro Edson Fachin defendeu que “descabe ao Judiciário censurar manifestações de pensamento”, sobretudo em se tratando da liberdade religiosa, “elemento fundante da ordem jurídica constitucional”. Considerou, no entanto, que “a liberdade não ostenta caráter absoluto”, sendo o repúdio ao racismo, por exemplo, preceito expresso na Constituição como crime inafiançável e imprescritível).
No julgamento que considerou procedente o recurso do padre (RHC 134.682), Fachin foi acompanhado por Rosa Weber, Marco Aurélio e Roberto Barroso. Ficou vencido o ministro Luiz Fux, que votou pela continuação da ação penal.
Em junho último, também como relator de ação cautelar (AC 4.158) sobre o mesmo caso, Fachin tinha negado a medida liminar, por razões processuais técnicas.
A defesa do Padre Jonas sustentou que a manifestação de opinião em nome da fé católica não legitimava a abertura de ação penal: “A denúncia não disse onde parou o proselitismo – direito de um líder católico – e onde começou a discriminação punível criminalmente, tornando impossível a convivência entre a intenção persecutória com os ditames da liberdade de expressão, da liberdade de religião”.
Assim, pediu o trancamento da ação penal na segunda instância e no Superior Tribunal de Justiça. Não obtendo êxito naquelas instâncias, a defesa recorreu ao STF.
Votos
Em seu voto, Fachin citou  limites da expressão religiosa e do proselitismo dos praticantes, destacando que deve ser tolerada – dentro dos limites constitucionais – a divulgação da mensagem religiosa. E fez referência à palavra de Jesus Cristo, citada no Evangelho de Marcos: “Ide por todo o mundo, pregai o evangelho a toda criatura”.
Ao concluir o seu voto,  Fachin afirmou: “Como se vê, o paciente [ padre] limita-se a reconhecer a distinção entre os grupos religiosos e explanar, na sua visão, a inviabilidade do sincretismo religioso e a prevalência do catolicismo. Ainda que, eventualmente, os dizeres possam sinalizar certa animosidade, não se explicita a mínima intenção de que os fiéis católicos procedam à escravização, exploração ou eliminação das pessoas adeptas ao espiritismo. Ao contrário, a publicação é direcionada aos católicos, a fim de pautar as opções dos respectivos fiéis".
"A vinculação operada entre o espiritismo e características malignas cinge-se à afirmação da suposta superioridade da religião professada pelo acidente. Não se trata, em absoluto, de tentativa de subjugação dos adeptos do espiritismo. Nota-se, outrossim, a grave e inaceitável indicação de que sejam queimados os livros espíritas, embora exclusivamente as obras dos próprios católicos, e mediante livre escolha", completou.
A ministra Rosa Weber, a segunda a se manifestar, votou também pelo trancamento da ação penal, embora criticando o conteúdo do livro do Padre Jonas Abib. Disse que estava “exercendo a minha tolerância em face da intolerância de outro (a do padre-autor).
Marco Aurélio disse que a obra em questão tinha por objetivo, basicamente, “rechaçar o espiritismo, feita por um padre católico”.
Ressaltou ser livre a manifestação do pensamento, assim como do exercício dos cultos religiosos. A seu ver, “o paciente não fez nesta obra um discurso de ódio, mas um discurso dirigido aos católicos que aderiram ao espiritismo”. E concluiu: “Temos de marchar com muita cautela. Temos de ser tolerantes, embora não concordando com pensamentos que são veiculados”,
O ministro Luís Roberto Barroso (presidente da 1ª Turma), ao prover o recurso do padre, disse em síntese: "O mundo é feito de pessoas que são diferentes, pensam diferentemente, e somos parte de um mundo dividido entre conservadores e liberais. Critica-se a forma usada pelo recorrente para se expressar, chamando a doutrina espírita de maligna. Porém, a liberdade de expressão não protege apenas as falas com as quais eu concordo. Mesmo os textos intolerantes, pedantes ou prepotentes também são protegidos pela liberdade de expressão. O único limite está nas manifestações de ódio, sobretudo quando dirigidas a grupos vulneráveis”.
Barroso relembrou o Caso Ellwanger (setembro de 2003), ocasião em que o STF manteve, por 7 votos a 3, a condenação do editor Siegfried Ellwanger, que publicava, no Rio Grande do Sul livros com pregações antissemitas. O ministro comentou que, naquele caso, o STF protegeu um “grupo vulnerável” e que, no recurso agora em julgamento, não se tratava de um grupo vulnerável, embora a fala do padre, a seu ver, ultrapassasse “os limites do tolerável”.
O ministro Luiz Fux foi o único voto vencido da turma, por considerar que, no caso, a crença das pessoas que têm religião adversa (o espiritismo) estaria sendo atingida “de modo por demais preconceituoso”.
<a href="/wp-content/uploads/2016/11/RHC-134682.pdf" target="_blank">Leia o voto do ministro Edson Fachin na íntegra. </a>
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Fachin-STF

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JOTA

Jonas Abib foi denunciado por incitação à discriminação religiosa por livro sobre "Reflexões de Cura e Libertação"

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