O relator da ação que decide o futuro político de Jair Bolsonaro (PL) no Tribunal Superior Eleitoral (TSE), Benedito Gonçalves, votou para que o ex-presidente se torne inelegível pelos próximos oito anos contados a partir das eleições de 2022. No entanto, Gonçalves não estendeu a penalidade a Braga Netto, candidato a vice na chapa, por entender que não tem como relacioná-lo aos fatos trazidos aos autos. A sessão foi interrompida e será retomada na quinta-feira (29/6). O JOTA fará uma cobertura ao vivo do julgamento a partir das 9h.
Em seu voto de 382 páginas, Gonçalves entendeu que Bolsonaro cometeu abuso de poder político e uso indevido dos meios de comunicação ao discursar para embaixadores em 18 de junho, em Brasília, a um público formado por embaixadores de diferentes países. O relator manteve as provas posteriores à fase instrutória, como a minuta do golpe.
Gonçalves ainda determinou que sua decisão seja enviada ao Supremo Tribunal Federal, onde o ministro Alexandre de Moraes é relator dos Inquéritos nos 4878/DF e 4879/DF. O primeiro trata do vazamento da investigação da PF sobre urnas eletrônicas, enquanto o segundo investiga os atos golpistas de 8 de janeiro. Também determinou o envio para o ministro Luiz Fux, relator da Petição no 10.477
Para Benedito, os fatos estão conectados — as lives, a reunião com os embaixadores e a minuta do golpe criaram um “espiral de inverdades” e um “estado de paranoia coletiva”. De acordo com Benedito Gonçalves, a partir da análise da minuta do golpe, houve um “flerte perigoso” com o golpismo.
Na visão do relator, Bolsonaro usou “símbolos da Presidência da República como arma institucional”, valendo-se de seu cargo, “com manifesto desvio de finalidade, para obter vantagens no processo eleitoral” e antagonizar com o TSE.
“Ao falar para os embaixadores não mandarem missões internacionais para as eleições de 2022, Bolsonaro deixou claro a rota de colisão evidente com o TSE, deixando explícito o curto-circuito institucional”, disse.
O relator da ação contra Bolsonaro no TSE entende que ficou configurado abuso de poder político por parte do ex-presidente. Para ele, houve desvio de finalidade no uso do “poder simbólico do presidente e da posição do chefe de Estado” para, com a reunião com embaixadores, “degradar o ambiente eleitoral”. Ele também destacou que Bolsonaro agiu para manchar a biografia de três presidentes do TSE (Fachin, Barroso e Moraes).
Entenda
O julgamento teve início na última quinta-feira (22/6), quando o ministro Benedito Gonçalves leu o relatório sobre o caso e foram feitas as sustentações orais, e continuou nesta terça-feira (27/9).
Em 18 de julho, Bolsonaro recebeu embaixadores estrangeiros no Palácio do Planalto para falar sobre eleições. O evento foi marcado após o então presidente ter criticado publicamente um encontro que havia ocorrido em maio entre o então presidente do TSE Edson Fachin e diplomatas, em que reafirmou a segurança do sistema eleitoral brasileiro e se demonstrou preocupado com os constantes ataques às urnas eletrônicas. Este é o fato discutido na ação que tramita no TSE e que pode deixar Bolsonaro inelegível.
À época, Bolsonaro chamou a reunião no TSE de “estupro” contra a democracia e disse que Edson Fachin, então presidente da Corte, chamou os embaixadores para falar sobre as “maravilhas” das urnas eletrônicas. Além dos diplomatas, Bolsonaro convidou Fachin para o evento com os embaixadores. O então presidente do TSE recusou o convite, em nome do “dever da imparcialidade”.
Na apresentação aos diplomatas, Bolsonaro voltou a fazer críticas ao sistema eleitoral brasileiro, falou sobre possíveis fraudes sem apresentar quaisquer provas e defendeu o voto impresso. As declarações, de acordo com edição do The New York Times do dia seguinte ao encontro, deixaram os convidados “abalados”. Sob condição de anonimato, os embaixadores afirmaram que ficaram incomodados com a sugestão de Bolsonaro de que o militares deveriam participar do processo para garantir a segurança das eleições.
No dia 19 de agosto, o PDT ajuizou ação contra a fala de Bolsonaro, com o argumento de que representa abuso do poder político e uso indevido dos meios de comunicação. Em 24 de agosto de 2022 o então corregedor Mauro Campbell concedeu liminar para determinar a imediata retirada do conteúdo das redes sociais e da Empresa Brasil de Comunicação no Facebook, no Instagram e no YouTube, sob pena de multa de R$10 mil reais. A decisão foi referendada pela Corte por unanimidade seis dias depois.
A defesa de Bolsonaro e Braga Netto apresentou contestação no TSE no fim de outubro de 2022. Em preliminares, pediu a formação de litisconsórcio passivo com a União e a incompetência da Justiça Eleitoral para análise do caso, uma vez que a fala de Bolsonaro ocorreu na condição de Chefe de Estado. No mérito, em síntese, defendeu que Bolsonaro não pediu votos e mais, os embaixadores não são eleitores, então, o ex-presidente discursou para um público que não poderia votar nele. Alegou-se ainda que o ex-presidente não atacou um candidato adversário, ao contrário, fez um debate público sobre o sistema eleitoral brasileiro.