O esforço regulatório e o ritmo frenético de resgate de bancos grandes demais para quebrar - os famosos too big to fail - indiretamente alimenta o crescimento de um sistema de crédito nas sombras que representa uma ameaça sistêmica para o sistema financeiro.
<a href="https://www.jota.info/impeach">+JOTA: Tudo o que sabemos sobre o impeachment de Dilma Rousseff</a>
O diagnóstico foi feito ao JOTA por Kathryn Judge,  professora de Direito na Universidade de Columbia em quatro cursos, entre eles Regulação Financeira e Instituições Financeiras.
Especialista em mercado de capitais, ela foi convidada pela Fundação Getúlio Vargas e pelo Fundo Garantidor de Crédito a participar  nesta terça-feira (8/12) de uma palestra em homenagem aos 20 anos do FGC.
Nesta entrevista, a ex-estagiária do juiz Richard Posner no Tribunal de Apelação dos EUA e do judge Stephen G. Breyer na Suprema Corte Americana afirma que reguladores do sistema financeiro como os bancos centrais precisam ter uma atuação mais coesa e prestar atenção ao shadow banking - o jargão usado para se referir a instituições que fornecem crédito sem supervisão de reguladores, como empresas, por exemplo.
Muitos analistas demonstram preocupação com esse sistema de crédito que opera "nas sombras". Em especial na China, onde o volume de recursos movimentado sem contabilidade oficial por bancos estatais e instituições privadas foi uma das razões do crash da bolsa em junho.
<a href="https://www.jota.info/o-congresso-pedindo-musica-no-fantastico-tres-impugnacoes-para-uma-decisao-no-novo-cpc">+JOTA: O Congresso pedindo música no Fantástico: três impugnações para uma decisão no Novo CPC</a>
<a href="https://www.jota.info/psol-volta-a-questionar-no-stf-concessoes-de-radio-e-tv-a-deputados-e-senadores">+JOTA: PSOL volta a questionar no STF concessões de rádio e TV a deputados e senadores</a>
Nascida na cidade de Ann Arbor (MI), Kathryn se formou em Direito na Stanford Law School em 2004 e recebeu os prêmios Order of the Coif e Urban A. Sontheimer Honor (second in class). Ela defende que a concentração no mercado financeiro esteja entre as responsabilidades do banco central e que os reguladores devem buscar abordagens inovadores em relação a novos arranjos de pagamento.
Leia abaixo a entrevista:
A crise financeira reacendeu o debate sobre bancos grandes demais para quebrar, especialmente depois dos resgates de bancos nos Estados Unidos e na Europa. Quais são as principais lições aprendidas depois de lidar com instituições que representam risco sistêmico?
Grandes demais para quebrar - too big to fail - era um problema real antes da crise e se tornou mais proeminente como resultado dos resgates citados. As mudanças regulatórias pós-crise nos Estados Unidos e em outros países não solucionaram o problema, mas fizeram incursões significativas para encaminhá-lo.
As mais importantes lições que a crise revelou que foram atacadas de forma bem menos adequada são os sinais de instabilidade inerente do chamado sistema "shadow banking". Na verdade, os esforços pós-crises para combater os bancos grandes demais para quebrar parecer estar alimentando o crescimento do sistema de shadow banking, que ainda é insuficientemente regulado e compreendido.
Como a sra. vê a regulação bancária norte-americana hoje?
Precisamos desenvolver um marco regulatório mais coeso para entender como o sistema de shadow banking representa um risco sitêmico e como isso pode ser solucionado.
Como a sra. vê a relação entre direitos do consumidor e regulação bancária? A mesma agência deveria cuidar de ambos?
A experiência sugere que quando a proteção ao consumidor é fiscalizada pelo mesmo órgão que tem outros objetivos, como regulação prudencial e supervisão, geralmente a proteção ao consumidor fica no banco detrás das outras responsabilidades da instituição. Não há uma única resposta correta, mas há um valor claro em ter um órgão independente que cuida dos interesses e da proteção dos consumidores.
Há um grande debate no Brasil sobre que regulador deveria avaliar e aprovar fusões no sistema bancário. Quem deveria dar a palavra final, um banco central ou uma agência de concorrência?
Não há resposta fácil para essa questão, cada autoridade tem um objetivo diferente - e importante - que tentam aprofundar. Outros assuntos dependem do contexto - a que ponto cada órgão têm a atribuição de fazer avançar o interesse público? Uma abordagem é ter um órgão com representantes das duas instituições, para que assim idéias inovadoras sobre competição e estabilidade podem ser levadas em conta. O grupo deve ser composto de uma forma que dê o maior número de cadeiras para o órgão cujos interesses são vistos como os mais críticos para o bem estar social. No fim do dia, vai ser sempre o banco central.
Por séculos, instituições financeiras eram a principal fonte de crédito em economias nacionais. Agora, vemos alguns métodos alternativos de pagamento surgindo. Quais são os maiores desafios para bancos centrais neste novo mercado?
A falta de supervisão e informação. Pode haver um valor real no desenvolvimento de métodos inovadores para facilitar pagamentos e gerar crédito, mas quando essas atividades ocorrem fora do escopo da autoridade de supervisão do banco central, o banco central e outros reguladores ficam geralmente em desvantagem se e quando os problemas surgem.
Simetria perfeita na regulação não é a resposta e a inovação deve ser estimulada, mas é importante para os reguladores terem tanto a capacidade quanto a inclinação para evoluir suas abordagens regulatórias e de supervisão diante de novas práticas de mercado.
No Brasil, o BNDES responde por 30% do crédito. Como saber quando um banco é grande demais para quebrar? O percentual do crédito numa economia seria um bom critério?
Não acredito que esta é a melhor forma de ver esse tema. A questão é o efeito que uma falência da instituição vai causar no acesso a crédito e outros fundamentos. Como visto nos Estados Unidos com o Lehman Brothers, a falência de uma instituição financeira que está profundamente interligada a outros fornecedores de capital pode ter consequências desastrosas se os reguladores não são capazes de reduzir essa exposição de forma ordeira.
<a href="jota.info/tudo-sobre/jota-inside">+JOTA INSIDE: Conheça a coluna sobre regulação bancária</a>
​

money-742052_1280

https://images.jota.info/wp-content/uploads/2021/09/copy-of-jota-logo-high-cmyk.jpeg

JOTA

Professora de Direito da Universidade de Columbia, Kathryn Judge, alerta sobre riscos de operações sem supervisão de reguladores

Aperto na regulação bancária pós-crise alimenta "shadow banking"

Professora de Direito da Universidade de Columbia, Kathryn Judge, alerta sobre riscos de operações sem supervisão de reguladores