Bárbara Pombo

A principal resposta do Ministério da Fazenda às denúncias de corrupção no Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (Carf), investigadas pela Operação Zelotes, foi dada nesta quarta-feira (10/06). Com as novas regras de funcionamento do tribunal administrativo, publicadas no Diário Oficial da União, o governo pretende retomar em julho os julgamentos no órgão, onde são discutidos mais de R$ 500 bilhões em autos de infração.
A Fazenda dá como completa a reforma em relação a julgamento e composição do colegiado. “Porém, ações administrativas para fortalecimento devem ocorrer. Além disso, contaremos com assessoria para modelar, otimizar e certificar os processos de trabalho, o que pode, eventualmente, requerer intervenções pontuais”, disse, em resposta a questionamentos do JOTA.
O texto do novo regimento prevê o enxugamento do órgão, traz medidas para tentar agilizar os julgamentos – que tem levado até oito anos -, dezenas de hipóteses de perda de mandado de conselheiros. Proíbe ainda a designação de conselheiro que tenha relação ou vínculo profissional com outro. Parentes de até 3º grau de conselheiros ou ex-conselheiros também estão impedidos de atuar no tribunal.
Apesar disso, advogados afirmam que a estrutura do órgão continuará a mesma, inclusive com uma antiga deficiência: a paridade formal que impede, segundo eles, mais equidade entre Fisco e contribuintes.
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“O novo texto trouxe mudanças e terá chacoalhada. Mas, no final do dia, a estrutura básica do órgão será a mesma”, afirma o tributarista Luiz Paulo Romano, advogado do escritório Pinheiro Neto. “O poder de indicação dos presidentes das turmas continua exclusivamente do Fisco e o voto de qualidade [para desempate de julgamento] continua sendo do Fisco. O órgão continua menos imparcial”, completa Romano.
Durante consulta pública, representantes dos contribuintes sugeriram medidas para tornar o órgão, segundo eles, mais imparcial. Propuseram, por exemplo, revezar as presidências das turmas entre Fisco e contribuintes. Com isso, os votos de qualidade – proferidos pelos presidentes das turmas em casos de desempate – não ficariam concentrados apenas nas mãos dos representantes da Receita Federal.
“A verdadeira paridade, tão almejada, não veio”, afirma o advogado Vinícius Branco, do escritório Levy &amp; Salomão, para quem a redação do regimento mal redigida tecnicamente expôs pressa e a tentativa do governo de retomar os julgamentos o quanto antes.
Outra sugestão rejeitada foi a de descentralizar o órgão. A iniciativa privada propunha que apenas a Câmara Superior do Carf continuasse com sede em Brasília. “A ideia era facilitar o acesso ao tribunal, especialmente porque grande parte das autuações com os valores mais elevados tem origem em São Paulo”, diz Branco.
Foi rejeitada ainda a proposta dos contribuintes de que multas de ofício e de mora fossem afastadas em casos de empate de julgamentos. Manter-se-ia, assim, a exigência do imposto e dos juros. “Foi o que fez o Supremo no julgamento do mensalão. O empate demonstra dúvida dos julgadores em relação a culpa. Deveria prevalecer a presunção de inocência, e excluída a penalidade”, diz Branco.
A Fazenda afirmou que deverá publicar em seu site até a sexta-feira as justificativas às rejeições das propostas formuladas na consulta pública.
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Composição
Para advogados, a falta de maior equidade também será sentida com a mudança no perfil dos conselheiros representantes dos contribuintes, que ainda é uma incógnita. “Essa é a mudança mais impactante. Sabemos que as confederações estão recebendo currículos. Mas não sabemos de quem”, diz Romano.
Com a remuneração de R$ 11.200 instituída pelo governo aos conselheiros dos contribuintes, a Ordem dos Advogados do Brasil proibiu conselheiros do órgão de advogar. Com isso, dezenas de conselheiros – a maioria advogados especialistas em direito tributário – deixaram o cargo. Pelo novo regimento, o conselheiro terá que apresentar documento que comprove a licença da advocacia.
Apesar das novas regras, a OAB ganhou um assento no Comitê de Seleção de Conselheiros que terá a competência, inclusive, de avaliar o desempenho dos conselheiros.
De acordo com o regimento, o conselheiro representante do contribuinte deverá ter “formação superior completa, registro no respectivo órgão de classe há, no mínimo, três anos, notório conhecimento técnico, e efetivo e comprovado exercício de atividades que demandem conhecimento nas áreas de direito tributário, processo administrativo fiscal e tributos federais”.
“O que adianta ter formalmente paridade se de um lado há um auditor da Receita com 30 anos de experiência e de outro alguém recém-formado ou um professor que sabe muito na teoria, mas não conhece a prática?”, questiona Romano.
O tempo de mandato dos conselheiros foi reduzido de três para dois anos. O limite de permanência no tribunal será de seis anos.
Perda de mandato
O regimento prevê nada menos que 18 hipóteses de perda de mandato do conselheiro, dentre elas o descumprimento reiterado das metas de produtividade determinadas pelo Presidente do Carf.
Os artigos 42 e 43 também preveem as hipóteses de impedimento do conselheiro, advindas após as denúncias da Operação Zelotes que apuram esquemas de corrupção e manipulação de julgamentos. O julgador não poderá analisar recursos de ofício, voluntário ou especial que tiver sido relator ou redator da decisão alvo do recurso.
Também estará impedido se o cônjuge, companheiro ou parente até 2ª grau atuar no escritório que defende o contribuinte.
Estrutura
O número de conselheiros foi reduzido de 216 para 120. Foram extintas as turmas especiais, as turmas ordinárias da 1ª Câmara e as terceiras turmas ordinárias das 4ªs Câmaras da 2ª e 3ª Seções de Julgamento. Dessa forma, houve redução de número de turmas para 15 e a quantidade de conselheiros por turma foi ampliada de 6 para 8.
“A medida permitirá que a jurisprudência do Carf seja mais consistente, permitindo maior segurança jurídica e redução dos recursos especiais de divergência”, diz a Fazenda.
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Para especialistas ouvidos pelo JOTA, as medidas demonstram a necessidade que o governo viu de ter maior controle do órgão, depois das denúncias de corrupção vindas com a Operação Zelotes. Para advogados, porém, o enxugamento não levará a maior celeridade dos julgamentos. A análise de um recurso hoje no Carf demora oito anos.
Apesar do enxugamento, a Fazenda diz que pretende “manter e até ampliar o número de julgados a partir da reestruturação do órgão: melhorias dos processos de trabalho (inclusive com certificação), ampliação do quadro de servidores técnico-administrativos, melhor estrutura funcional e a adoção plena do processo eletrônico (e-Processo) e informatização dos processos de trabalho”, disse.
Para dar agilidade aos julgamentos, a Fazenda inseriu, no regimento, a possibilidade de o presidente do Carf atribuir a uma seção a especialidade de julgamento de outra. Com isso, a competência de a 1ª Seção julgar questionamentos relacionados a Imposto de Renda de Pessoa Jurídica poderia ser estendida, temporariamente, à 2ª Seção, cuja competência é analisar litígios relacionados a contribuição previdenciária, Imposto de Renda Pessoa Física e Imposto sobre a Propriedade Territorial Rural (ITR). De acordo com o regimento, a medida visa “à adequação do acervo e à celeridade de sua tramitação”.
Julgamento em bloco
Outra medida para tentar agilizar a análise dos recursos é o julgamento em bloco de casos idênticos. Advogados afirmam, porém, que o governo passou um “verniz” na possibilidade, que já era prevista no regimento anterior de forma menos arquitetada. Quando houver múltiplos recursos sobre o mesmo assunto o presidente da turma poderá sortear um como paradigma. Julgado o caso, os demais processos sobre o assunto serão analisados em bloco.
A novidade está no parágrafo 3º do artigo 47 do regimento. Agora, as partes dos processos não sorteados terão direito a fazer sustentação oral no julgamento do caso paradigma. O pedido pela previsão no texto de uma manifestação de interessados partiu de entidades durante consulta pública sobre o novo regimento.
O texto também passou a autorizar a realização de defesas orais por videoconferência.
Além disso, o Carf passa a estar obrigado a divulgar em seu site cancelamentos e adiamentos de julgamentos com cinco dias de antecedência. “Era comum viajar a Brasília, gastar com hotel, passagem e tempo e o julgamento ser adiado”, diz Branco, que atua em São Paulo.

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JOTA

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