Bárbara Mengardo

Cabe aos autores arcar com o custo de perícias nas ações populares. O entendimento foi firmado pela 2ª Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) nesta terça-feira (16/06) após analisar o questionamento sobre quem ficaria com a conta da perícia no caso de uma troca de ativos entre a Petrobras e a Repsol YPF no ano 2000. A ação popular apontava prejuízo da estatal brasileira e era preciso calcular quanto valiam tais ativos.
O placar final ficou em três votos a dois. Apenas um ministro ter votado na sessão desta terça-feira, mas o assunto gerou polêmica na turma. Vencido, o ministro Herman Benjamin afirmou que, com o entendimento, o STJ decretou “a morte da ação popular”.
A crítica do ministro feita durante a sessão dizia respeito ao fato de a maioria dos cidadãos não ter como pagar perícias em casos grandes, como o analisado pela 2ª Turma. Desta forma, o posicionamento poderia desestimular a propositura de ações populares, ou restringir o uso deste meio processual a casos que envolvam valores baixos.
Ativos subvalorizados
Diferentemente das ações civis públicas (ACPs), as ações populares podem ser propostas por qualquer cidadão. O instrumento é disciplinado pela Lei nº 4.417/1965 e consta no artigo 5º da Constituição Federal, que estipula que os processos podem ser propostos, por exemplo, contra atos lesivos ao patrimônio público ou ao meio ambiente.
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Por se tratar de um tipo processual distinto dos demais, nas ações populares os autores são isentos de custas judiciais ou ônus de sucumbência, salvo em casos de má-fé. Não existe regulamentação, entretanto, dos custos de perícias realizadas ao longo do processo.
O Resp 1234162, analisado nesta terça-feira (16/06) tratou deste custo particular. O recurso tem origem em uma ação popular proposta por cinco petroleiros da Refinaria Alberto Pasqualini (Refap). Instalada em Canoas (RS), a refinaria foi um dos ativos negociados na permuta realizada em 2000.
Troca de ativos
À época, a Petrobras e a Repsol realizaram uma troca de ativos nas áreas de exploração, produção, refino, logística e distribuição de petróleo que permitiu à estatal entrar no mercado argentino e à Repsol entrar no mercado brasileiro.
Dentre outros ativos, a Petrobras cedeu à Repsol participação de 30% da Refap e 10% no campo de Albacora Leste, na bacia de Campos. A estatal recebeu, por outro lado, a refinaria de Bahia Blanca, na Argentina.
Os autores da ação, entretanto, apontam que a Petrobras teria sido prejudicada com a operação, e seus ativos teriam sido subvalorizados. De acordo com a ação, os ativos cedidos pela estatal valeriam US$ 3 bilhões, enquanto os cedidos pela Repsol seriam de US$ 750 milhões.
O processo foi ajuizado em 2001, mas a primeira instância determinou que fosse realizada uma perícia para verificar se havia equivalência entre os ativos envolvidos na permuta. Seguiu-se, então, uma discussão sobre a necessidade da perícia e à quem caberia a conta pelo procedimento.
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No Tribunal Regional Federal da 4ª Região (sul do país), o entendimento foi favorável aos autores da ação popular. O relator designado para o processo, juiz Márcio Antônio Rocha, apontou diversas irregularidades na operação, e entendeu que a perícia seria necessária pelo fato de os documentos que atestam o valor dos ativos terem sido apresentados pela Petrobras e pela Repsol.
Em relação aos honorários periciais, Rocha determinou que a conta ficasse com a Petrobras. Em sua decisão, o magistrado defende que os autores da ação não têm condições financeiras para arcar com a perícia.
Para Rocha, determinar o pagamento aos autores anularia o instrumento constitucional da ação popular. “Por sua evidente potencialidade econômica, indissociável de qualquer causa de interesse público que lhe envolva, cabe a ela, Petrobrás, com transparência, propiciar os meios de que se necessita para trazer transparência e fundamentada decisão sobre a lide”, afirmou.
Pequenas cidades
No STJ, a decisão final aprovou a realização de perícia, mas apontou os autores como responsáveis pelo pagamento. Na sessão desta terça-feira, ao apresentar voto-vista, o ministro Mauro Campbell Marques entendeu que não é possível transferir aos réus parcelas como honorários periciais, mesmo em ações populares. Para ele, o interessado na perícia deve arcar com os custos decorrentes da análise.
O posicionamento é similar ao adotado pelos ministros Humberto Martins e Castro Meira, hoje aposentado.
Para o ministro Herman Benjamin, que votou de forma contrária à Petrobras, entretanto, o entendimento é prejudicial ao instituto da ação popular. Durante o julgamento, o magistrado lembrou que o processo permite que o poder público seja questionado sem que sejam necessários órgãos intermediários, como o Ministério Público ou organizações não governamentais.
Benjamin afirmou ainda que a necessidade de pagamento de perícias pelas partes poderá restringir as ações populares a casos de menor monta, envolvendo câmaras municipais ou prefeitos de pequenas cidades, por exemplo. “O autor popular, que não tem nenhum objetivo patrimonial pessoal [com a ação], terá não apenas que contratar advogado, mas pagar os honorários periciais”, disse o ministro.
Benjamin, que votou no mesmo sentido da relatora do processo, a ministra aposentada Eliana Calmon, citou que o tema pode chegar ao Supremo Tribunal Federal (STF), por tratar de temas constitucionais.
Para o advogado que representa os autores da ação, Ângelo Bonzanini Bossle, do escritório Pimentel &amp; Rohenkohl Advogados Associados, a decisão do STJ é um “desestímulo à cidadania”.  Bossle, que defendeu os autores juntamente ao advogado Cláudio Leite Pimentel, diz que verificará com as partes interessadas a possibilidade de prosseguir com a ação que, agora, volta a Justiça Federal de Canoas.

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JOTA

Decisão da 2ª Turma representa "morte" do instrumento, segundo ministro Herman Benjamin

Quem paga a perícia em Ação Popular?

Decisão da 2ª Turma representa "morte" do meio processual, segundo ministro Herman Benjamin