Letícia Paiva

Condenada por tráfico de drogas com processo transitado em julgado, uma mulher pede para cumprir a pena em casa, já que é mãe de um recém-nascido. Com o presídio mais próximo a 230 quilômetros de distância de Divisa Alegre (MG), onde mora, ela afirma que se tornaria impossível amamentar a criança nos primeiros meses de vida.
O recurso em habeas corpus impetrado por ela no Superior Tribunal de Justiça (STJ) gerou divergências e até bate-boca entre ministros da 6ª Turma nesta terça-feira (8/6). O tribunal precisará decidir se uma mãe com filho menor de 12 anos pode cumprir pena definitiva em regime domiciliar – e não apenas em casos de prisão temporária.
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Nesse caso, o ministro <a href="https://www.jota.info/wp-content/uploads/2021/06/stj-dje-0-28614489.pdf">Sebastião Reis havia autorizado o cumprimento em casa até o julgamento</a>. Os ministros Laurita Vaz e Rogerio Schietti Cruz não concordaram, principalmente por se tratar de uma condenação definitiva, sem possibilidade de recurso que alterasse a pena. Antonio Saldanha concordou com o descontentamento dos colegas.
"Fico preocupado porque, a rigor, estamos entendendo que nenhuma mãe cumprirá pena de prisão. Ainda que tenha cunho humanitário e a gente sempre deve privilegiar ações que beneficiem o ser humano, especialmente mulheres mães", disse o ministro Schietti, adicionando que isso permitiria que "se cometa crimes de envolvimento com facções criminosas que se dedicam ao tráfico de entorpecentes sem que se seja punidas com prisão".
Para Saldanha, haveria uma dificuldade em entender qual seria o tempo máximo para eventual uso do benefício. "Se for assim, ele seria usado massivamente. A minha preocupação também é qual seria a limitação temporal na prisão definitiva", afirmou. Assim, a falta de limites tornaria o cumprimento domiciliar indefinido. "Na medida em que ela for tendo filhos, vai cumprindo pena em prisão domiciliar até o fim da condenação", concordou Schietti.
Por outro lado, Reis argumentou que seguiu precedentes do tribunal para decidir a questão e afirmou que, ainda que em casa, ainda se estaria cumprindo pena. "Há precedentes nossos entendendo ser possível a prisão domiciliar mesmo em casos de pena definitiva. Não está no presídio, mas ficar em casa trancada está cumprindo", defendeu o ministro. Os ministros decidiram que o caso deveria ser definido na 3ªSeção.
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<h3>Marcos sobre prisão domiciliar para mães</h3>
A possibilidade de prisão domiciliar para mulheres com filhos pequenos ganhou força com decisão do ministro Ricardo Lewandowski, do Supremo Tribunal Federal (STF), em 2018, ao julgar um habeas corpus coletivo que garantiu esse direito nos casos de prisão provisória, exceto envolvendo crimes praticados por elas com violência ou contra filhos ou netos. Em dezembro daquele ano, passou a vigorar o artigo 318-A no Código de Processo Penal, prevendo exatamente isso.
Desde então, o entendimento nas cortes superiores é de autorizar a mudança às mulheres com filhos de até 12 anos que aguardam julgamento. Entretanto, o ministro Sebastião diz em seu relatório haver jurisprudência para aplicação em condenações definitivas. Ele fundamenta a decisão a partir de um outro julgamento semelhante, <a href="https://www.jota.info/wp-content/uploads/2021/06/rcl-40676-2020-12-01.pdf">da relatoria do ministro Reynaldo Soares da Fonseca no final do ano passado</a>. Na discussão desta terça-feira (8/6), os ministros ignoravam haver precedente nesse sentido.
Partindo para esse caso mais antigo, a situação se torna confusa. A 3ª Seção foi unânime no entendimento de que "os mesmos fundamentos que justificam a concessão da prisão domiciliar à ré durante execução provisória da pena também se prestam a amparar o benefício na fase definitiva". Aqui, se tratava também de uma mãe de criança pedindo a mudança – inclusive, ela já havia sido autorizada pela corte, mas fora descumprida pelo juiz de primeira instância.
O relator Soares da Fonseca trazia quatro precedentes da mesma Seção, com a interpretação da possibilidade de prisão em casa mesmo quando há condenação. Porém, em alguns deles, o benefício não é concedido, sob o entendimento de que a existência de filhos não torna a concessão automática. Assim, seria necessário que a criança estivesse em desamparo, por exemplo. Em nenhum deles é citada a saúde do bebê – como se está sendo viável a amamentação nos primeiros meses de vida.
Ao negar habeas corpus para uma mãe de São Paulo em 2019, a <a href="https://www.jota.info/wp-content/uploads/2021/06/hc538-837.pdf">ministra Laurita Vaz cita a noção de que o STJ permite o cumprimento de pena em casa sempre que for imprescindível</a>. Mas a mulher havia engravidado quando já estava presa e a filha estava aos cuidados da avó e do pai, por isso o apelo foi recusado. Sob essa perspectiva, não é possível intuir que todas as mulheres no sistema penitenciário seriam atendidas pelo benefício automaticamente.
Também é algumas vezes citado, como argumento para a concessão, o artigo 117 da Lei 7.210/1984. Ele menciona que mães de crianças e gestantes em regime aberto podem cumprir pena em casa. No ano passado, o Conselho Nacional de Justiça (CNJ) lançou <a href="https://www.jota.info/wp-content/uploads/2021/06/enunciadosaprovadosnaplenriaijdpp.pdf">enunciado afirmando ser possível aplicar o artigo, "em casos excepcionais", a condenados de regime fechado</a>.

Prison Corridor in Alcatraz Penitentiary, Usa

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JOTA

'A rigor, estamos entendendo que nenhuma mãe cumprirá pena de prisão', questionou o ministro Schietti

Prisão domiciliar para mães de criança com pena definitiva será decidida por STJ

Ao julgar caso de mulher com recém-nascido, ministros questionaram se benefício permitiria descumprir regime fechado