Laura Diniz

O delegado Carlos Eduardo Sobral, presidente da Associação de Delegados da Polícia Federal (ADPF), reagiu com indignação à entrevista do ministro da Justiça, Eugênio Aragão, publicada no sábado (19/3) pelo jornal Folha de S. Paulo.
O novo ministro afirmou que se sentir o "cheiro" de vazamento de informações por parte de um agente da PF, trocará toda a equipe, mesmo que sem provas. As declarações do ministro foram feitas em relação à Operação Lava Jato, que investiga o maior esquema de corrupção da história do Brasil.
Segundo Sobral, a ameaça de Aragão demonstra a importância da aprovação da autonomia funcional da PF, que "impediria a adoção de medidas disciplinares movidas por interesses políticos". Sobre a entrevista, o delegado disse: "Estamos avaliando as medidas que poderemos adotar, ainda que preventivamente, para impedir a troca das autoridades e suas equipes que atuam nas investigações criminais sem que haja o debido processo de apuração de irregularidades."
Leia a íntegra da entrevista:
Em entrevista à Folha de S. Paulo, o ministro Eugênio Aragão declarou: “A primeira atitude que tomo é: cheirou vazamento de investigação por um agente nosso, a equipe será trocada, toda. Cheirou. Eu não preciso ter prova.” Como o senhor avalia essa declaração?
Consideramos lamentável a declaração do ministro recém-nomeado, especialmente, quando disse que trocará toda a equipe de investigação da Operação Lava Jato no primeiro sinal de vazamento, ainda que não existam evidências ou provas de que o eventual vazamento tenha sido promovido pelos policiais.
A Polícia Federal não compactua com vazamentos e não há nenhum indício de que policiais federais tenham promovido vazamento de informações. Se surgir alguma notícia de vazamento, a Polícia Federal investigará amplamente o fato e o seu responsável, dentro das regras legais de nosso país, de forma técnica e imparcial, como é sua atuação característica.
Ameaçar os delegados e suas equipes que investigam a Operação Lava Jato, sem provas e sem o devido procedimento investigatório não é condizente com a posição de ministro da Justiça e produz o efeito de estimular os delegados a ampliar a sua atuação firme no combate à corrupção.
Essas declarações do novo ministro da Justiça, logo após a sua posse, nos dá a certeza de que a Polícia Federal encontra-se em situação de risco institucional nunca vista antes e que é premente a autonomia da PF para que possa dar continuidade à Operação Lava Jato e ao combate continuado da corrupção em nosso país.
O fato de Aragão ser integrante do Ministério Público Federal influencia nesse tipo de abordagem?
É mais lamentável perceber que essas declarações partiram de um membro do Ministério Público, uma vez que, além de conhecer profundamente as leis, tem por função preservar o estrito cum´primento das leis em nosso país e jamais poderia defender a aplicação de qualquer tipo de punição sem provas e sem a observância do devido processo legal.
A Polícia Federal está apurando vazamentos de informações por seus agentes na Operação Lava Jato?
Sempre que surge a notícia de vazamento de operações policiais, a Polícia Federal investiga amplamente o fato dentro das regras legais do país. No caso da Lava Jato, tem-se observado que a Justiça tem determinado o levantamento regular do sigilo nos autos do processo. Portanto, nesse caso, não há que se falar em vazamentos.
Há excessos por parte dos agentes da PF envolvidos na investigação da Lava Jato?
Não há notícia de excessos por parte dos delegados e seus agentes que trabalham na Operação Lava Jato. O time de delegados que atuam na investigação principal em Curitiba possui excelente qualificação técnica e experiência profissional na área.
O ministro afirmou que “há uma politização do procedimento judicial, seja por parte do juiz, seja por parte dos agentes públicos em torno”. O senhor concorda?
Não há nenhum indicativo de politização dos atos de investigação da Lava Jato, tanto que a mídia tem noticiado que as últimas delações premiadas atingem diversos ocupantes de cargos eletivos de partidos diversos. A polícia federal investiga crimes contra a administração pública promovidos por diversos agentes públicos, regularmente.
No caso da Lava Jato, tem-se observado que os envolvidos diretamente nos fatos apurados ocupam ou ocuparam cargos políticos ou públicos de alto escalão da República. Logo, não há se falar em politização da investigação, mas, sim, numa investigação que trata de fatos que envolvem políticos.
Que tipo de prejuízos a interferência política do Ministério pode trazer à atuação dos policiais?
A ausência de autonomia da Polícia Federal para gerir e planejar seu orçamento e seus projetos a torna vulnerável a interferências externas que podem, por meio do corte e contingenciamento de seus recursos, paralisar as atividades investigativas ou conduzir as investigações para combater crimes diversos da corrupção. Importante registrar que os projetos de crescimento e expansão das atividades de combate ao crime organizado da Polícia Federal já estão em franco declínio. A forma de protegermos a Polícia Federal de qualquer espécie de interferências políticas é a aprovação da PEC 412/2009.
Além disso, a ausência de autonomia administrativa da PF faz com que todos os ocupantes das funções de direção da instituição sejam escolhidos pela Casa Civil e pelo Ministério da Justiça, em prejuízo da escolha por critérios técnicos pela própria instituição.
Por outro lado, a autonomia funcional da PF impediria a adoção de medidas disciplinares movidas por interesses políticos, tendo em vista que hoje o Ministério da Justiça tem o poder decisório, em último grau, de todos os processos disciplinares da Polícia Federal. O MJ, hoje, tem o poder de instaurar e julgar em último instância, todos os processos disciplinares.
A ADPF pretende reagir às declarações, de alguma forma?
Os delegados receberam as primeiras manifestações do ministro da Justiça de maneira muito ruim, uma vez que esperavam que ele anunciasse o compromisso de garantir o combate ao crime organizado e à corrupção levado adiante pela Polícia Federal e demais atores do sistema de justiça criminal.
Estamos avaliando as medidas que poderemos adotar, ainda que preventivamente, para impedir a troca das autoridades e suas equipes que atuam nas investigações criminais sem que haja o debido processo de apuração de irregularidades.
Em relação à ameaça do ministro de que irá trocar os policiais federais mediante simples notícia de vazamento, ainda que sem provas, os delegados estão estudando as ações que poderão ser adotadas, inclusive, judiciais para evitar a troca ou afastamento arbitrário dos delegados e seus agentes que atuam na Lava Jato.
Esse tipo de investida do ministro, deve ter algum efeito em relação à <a href="http://www.camara.gov.br/proposicoesWeb/fichadetramitacao?idProposicao=453251">PEC 412</a>, que trata da autonomia funcional e administrativa da Polícia Federal – para lhe dar ou tira força?
As declarações do novo ministro são demonstração concreta da fragilidade institucional da Polícia Federal e da necessidade de aprovação urgente da PEC 412/2009.
Em razão da urgência da autonomia da Polícia Federal, foi lançada recentemente a campanha pela autonomia da instituição trazendo o assunto para o debate com a sociedade e apoiamento, por meio de assinatura na Carta do Povo Brasileiro ao Congresso Nacional pela autonomia da PF, disponível no sítio de internet da ADPF a qual, em uma semana, já alcançou mais de cem mil assinaturas.
Certamente, o Congresso Nacional se sensibilizará com a necessidade urgente de aprovação da PEC da autonomia da PF, diante do quadro que vivenciamos.
Convidamos a todos para participar conosco dessa campanha em defesa da Polícia Federal.

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JOTA

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