Luis Viviani

A Medida Previsória 703, que trata de inovações em acordos de leniência, possui algumas normas benéficas, mas não houve fundamento de urgência para a sua edição. Quem diz é a especialista em penal empresarial e professora da Escola de Direito da FGV-SP, Heloísa Estellita.
Para Estellita, a matéria é grave e deve ser debatida com a devida atenção no Congresso Nacional, até para esclarecer melhor algumas normas. Entretanto, enxerga que “definitivamente” a tendência é de que mais empresas fechem acordos.
Estellita também critica a exigência de um comprometimento das empresas em implantar um programa de compliance traz um enfraquecimento e grave desincentivo à implementação do sistema que “trai o próprio espírito da Lei”.
“Esse é um ponto grave da redação dada pela MP à Lei. Veja que o novo texto do art. 16, §  1o, IV, não exige sequer que as empresas implementem de fato sistemas internos de cumprimento, basta que se ‘comprometa’ a fazê-lo”, critica.
Veja a íntegra da entrevista
Quem assinar o acordo consegue manter a contratação em licitações com o governo. Como enxerga esse ponto?
Pelo texto da MP, é possível. Resta saber se o Congresso Nacional manterá a norma. Não vejo a suspensão dessa sanção em virtude de leniência como algo em si (ou seja, isoladamente) ruim, todavia, como a MP enfraquece intensamente os requisitos da leniência, especialmente com relação aos programas de cumprimento, a norma se torna deletéria dentro desse quadro.
As empresas se comprometem a cumprir algumas medidas, como criação de um órgão interno de compliance. Isso será eficiente? As empresas vão realmente se dedicar ou será feita apenas por obrigação?
Esse é um ponto grave da redação dada pela MP à Lei. Veja que o novo texto do art. 16, §  1o, IV, não exige sequer que as empresas implementem de fato sistemas internos de cumprimento, basta que se “comprometa” a fazê-lo. Há um enorme enfraquecimento e um grave desincentivo à implementação desses sistemas o que trai o próprio espírito da Lei.
Não apenas a primeira empresa pode assinar acordo, mas a segunda, terceira também poderão ter benefícios. Isso muda muito?
Sim, muda bastante. Há, agora, maior possibilidade de celebração de acordos e um grande incentivo a que as empresas sob investigação façam acordos de leniência.
Quais outros pontos podem causar mais debates? A segurança jurídica aumentou ou diminuiu com a MP? 

Vejo como positivos pontos a definição das autoridades públicas que poderão celebrar os acordos de delação já com o envolvimento do Ministério Público (art. 16, caput), e também a expressa vedação do “bis in idem” do art. 16, parágrafo 2o, II. A possibilidade de sanções em cascata aplicadas por diversos órgãos e em diversas esferas era um forte desincentivo à leniência. 
A falta de regulamentação antes da MP representava um entrave à negociação de acordos? 
Sim, especialmente diante da incerteza quanto aos órgãos que deveriam ser envolvidos no acordo e da incerteza quanto ao possível ulterior sancionamento por órgão não envolvido no acordo. Nesse sentido, as normas acima indicadas agregam segurança jurídica.
O país precisava desta MP?
Algumas normas da MP são benéficas, como dito acima, outras não (como o enfraquecimento de alguns requisitos e consequências da leniência e a repetição de que a responsabilidade da PJ pela sanção é objetiva, o que, para mim, é  inconstitucional), ou seja, em termos legais, algumas normas eram, sim, necessárias. Todavia, não vejo fundamento de urgência para a edição de MP, a matéria é grave e deve ser debatida com a devida atenção no Congresso Nacional.

Brazilian National Congress in Brasilia, Brazil

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JOTA

Para Heloísa Estellita, professora da FGV-SP, matéria é grave e deve ser debatida com atenção no Congresso

Não há fundamento de urgência para edição da MP da Leniência

Para Heloísa Estellita, professora da FGV-SP, matéria é grave e deve ser debatida com atenção no Congresso