Consumidores e instituições financeiras enfrentam um dilema: a fórmula da Tabela Price implica capitalização ilegal de juros e pode ser usada como método de amortização do saldo devedor? Ambos buscam entender se a capitalização ilegal de juros se configura como mera decorrência da utilização da Tabela Price como método de amortização.
Segundo o advogado professor da USP Francisco Satiro, especialista em direito empresarial e mercado de capitais, impedir a aplicação da Tabela Price não será a solução para o problema do alto custo dos financiamentos uma vez que, a questão se encontra nas altas taxas de juros, e não na forma de cálculo da amortização através da tabela.
Satiro participou da audiência pública, promovida pelo Superior Tribunal de Justiça, para discutir a legalidade da Tabela Price como método de amortização de financiamentos à luz do artigo 4º da Lei de Usura (Decreto 22.626/33). Ele falou em nome da Associação Brasileira das Entidades dos Mercados Financeiros e de Capitais.
Ele afirma que o custo de captação e o custo de inadimplência impactam na taxa de juros.
"Mesmo se o mercado passasse a usar outro parâmetro para amortização dos valores emprestados, naturalmente a taxa de juros iria subir para trazer equilíbrio econômico-financeiro nas transações", apontou.
Ao JOTA, Satiro explicou os motivos pelos quais o artigo 4º da Lei de Usura deveria ser revogado e quem pode ser o real prejudicado caso não exista juros compostos.
Leia a entrevista:
É certo que existe algum tipo de componente composto na formação da Tabela Price e discute-se se isso a define como ilegal em função do conteúdo do artigo 4ª da Lei de Usura.
Estamos diante de um problema, e esse problema diz respeito às altas taxas de juros compradas neste tipo de financiamento e por mais que se tente soluções técnicas, não necessariamente essa será a resposta cabível para o problema que se apresenta: o mutuário que não consegue pagar o seu empréstimo. Por conta disso, como sempre nas épocas em que aparecem esse tipo de problema, lavantam-se questões jurídicas para se tentar de alguma forma amenizar a questão.
Vai ficar a critério dos ministros definirem se de fato, esse conteúdo de juros composto, que existe na tabela price é ou não violador do preceito do juros dos juros do artigo 4ª da Lei de Usura. O artigo diz ser proibido contar juros dos juros: está proibição não compreende a acumulação de juros vencidos aos saldos líquidos em conta corrente de ano a ano.
A cobrança de juros compostos é ilegal segundo o artigo 4ª da lei?
Esse dispositivo deveria ser revogado. É um dispositivo que teve sentido em um determinado momento, mas não tem mais. O Banco Central está aí para regular a taxas de juros, para conter eventuais abusos, eventualmente o judiciário num segundo momento, mas eu não vejo razão para considerar que juros não podem sem cobrado sobre juros em qualquer da hipóteses. O mundo de finanças vive com base em juros compostos, então é fechar os olhos para a nossa realidade.
O dinheiro que é emprestado para a compra da casa própria é pago de maneira capitalizada. O que significa que se se quebrar um lado, existe o risco de o prejudicado não ser a instituição financeira, como parece a primeira vista, mas aquele que guardou dinheiro.
Há quem defenda que o consumidor é uma pequena parcela que faz o empréstimo e que quem seria prejudicado seria quem empresta o dinheiro, que também é um consumidor. Isso é verdade?
É verdade. O sistema financeiro é uma via de duas mãos: o dinheiro é captado de um lado de quem também é consumidor, via poupança, via CDI [Certificado de Depósito Interbancário], via fundos e ele acaba sendo emprestado pelas instituições financeiras. Esse dinheiro muda de mãos e chega nas mãos de terceiros.
Mudar a capitalização de juros resolveria o problema dos consumidores?
Talvez resolva o problema daqueles mutuários que estão com os contratos em situação de dificuldade. Mas apenas daqueles específicos, não me parece que isso seria uma solução geral para o problema das taxas abusivas. As taxas abusivas hoje têm correlação com inflação, com taxas de juros altas em função do déficit do governo e assim sucessivamente.
O efeito nefasto da insegurança pode ser a diminuição da oferta de crédito ou o seu encarecimento para fazer frente aos possíveis custos trazidos pelo risco agregado, o que vai acabar prejudicando também os consumidores interessados em novos financiamentos.

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JOTA

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