O Ministério Público Federal (MPF) em São Paulo informou que entrou com uma ação civil pública contra seis das principais empresas brasileiras de cimento e concreto. A Procuradoria aponta que o grupo integrou um cartel para fixação de preços superfaturados por cerca de 20 anos.
A estimativa do MPF é que o grupo tenha obtido lucro de R$ 28,9 bilhões entre 1987 e 2007. Segundo a procuradora da República Karen Louise Kahn, autora da ação, as empresas incorreram em condutas ilícitas e mantinham um acordo para eliminar a livre concorrência no setor e garantir o sobrepreço.
O MPF processa também seis gestores das empresas processadas e três associações de classe que teriam atuado no esquema. Ao todo, são 15 réus. O caso está em tramitação na 10ª Vara Cível Federal de São Paulo.
A procuradora aponta que o esquema era formado pelas empresas Votorantim Cimentos S.A., Itabira Agro Industrial S.A., Cimpor Cimentos do Brasil Ltda., InterCement Brasil S.A., Holcim do Brasil S.A. e Companhia de Cimento Itambé, além da Associação Brasileira de Cimento Portland (ABCP), a Associação Brasileira das Empresas de Serviços de Concretagem (ABESC) e o Sindicato Nacional da Indústria do Cimento (SNIC). O MPF aponta que essas três entidades intermediavam e facilitavam a adoção das condutas anticompetitivas.
- +JOTA: Como o Cade conecta provas indiretas na análise de cartel
- +JOTA:Defesa de pessoas físicas em casos de cartel
- +JOTA:Quantificação dos danos decorrentes do cartel
O Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade) investigou a partir de 2006 as irregularidades. Em 2014, esse processo culminou com a condenação dos envolvidos por formação de cartel. A apuração apontou que as empresas trocavam informações, para fixar e controlar os preços do cimento e do concreto em diversas regiões do país e que as participantes do cartel eram constantemente monitoradas, para que se mantivessem alinhadas com os acordos firmados. Estimou-se que o sobrepreço era de 20% sobre o valor corrente no mercado.
A antiga Secretaria de Direito Econômico (SDE), do Ministério da Justiça, apontou que o cartel de cimentos e concreto atuou em todo território nacional, alcançando uma participação de mercado de aproximadamente 85%, variando de estado para estado.
O MPF aponta que as empresas combinavam não apenas o preço, mas também fixavam as quantidades de cimento a serem produzidas, com o objetivo de regular a oferta e manter as participações de mercado nos níveis acordados.
Para a procuradora, houve ainda a criação de barreiras à entrada de novos concorrentes no mercado, divisão regional do mercado e a alocação combinada de clientes, quando era feita a partilha de obras entre os membros do esquema.
Cálculo de prejuízo
O MPF calcula que as empresas integrantes do cartel tenham embolsado R$ 1,4 bilhão em um ano. Para chegar à estimativa, os procuradores consideraram o preço médio da tonelada de cimento e o superfaturamento de 20%, em valores à data do julgamento pelo Cade, em 2014.
A procuradora dá um exemplo para se ter uma ideia dos prejuízos à sociedade. O programa “Minha Casa, Minha Vida” havia gasto R$ 134,5 bilhões até 2016 para construir 2,1 milhões de casas populares. “Desse total, cerca de R$ 10 bilhões foram gastos com cimento. Ou seja, somente nesse caso, o dano aos cofres públicos ficou em R$ 2 bilhões, considerando o superfaturamento de 20%, o que permitiria construir mais de 50 mil casas populares”, afirmou a procuradora.
Como pedido principal, o MPF pede que os réus sejam condenados a pagarem, pelo menos, R$ 28,9 bilhões em dano econômico-financeiro e, de forma subsidiária, o mínimo de R$ 7,7 bilhões – estimativa que considera o sobrepreço mínimo de 2,7% apurado em análise pericial preliminar, que tomou como base a diferença entre os preços do cimento operados pelo cartel entre 1994 e 2004.
O MPF demandou ainda que as empresas sejam proibidas de firmarem contratos com instituições financeiras oficiais e de participarem de licitações para a realização de obras e serviços e concessão de serviços públicos por, pelo menos, cinco anos.
O número da ação civil pública em tramitação na 10ª Vara Cível Federal de São Paulo é 5030542-89.2021.4.03.6100.