Luiz Orlando Carneiro

Meses depois de distribuir para os ministros do Supremo Tribunal Federal uma proposta de reforma da Lei Orgânica da Magistratura que reduz poderes do Conselho Nacional de Justiça, o presidente do STF, ministro Ricardo Lewandowski, saiu em defesa de seu texto hoje e pregou diálogo tanto com juízes do "front" quanto com associações representativas.
Na abertura da sessão plenária desta terça-feira (07/04) do CNJ, Lewandowski, fez questão de responder a críticas à sua iniciativa de criar dois conselhos consultivos para assessorar a presidência do CNJ – o primeiro formado por presidentes das associações de classe da magistratura; o segundo integrado por representantes do Colégio Permanente de Presidentes dos Tribunais de Justiça.
O ministro afirmou que “na nova democracia representativa não se pode estabelecer metas sem ouvir aqueles que estão no ‘front’, ou seja, os juízes representados por suas associações”.
E acrescentou: “É muito importante que ouçamos não apenas os órgãos de cúpula, responsáveis pelas diretrizes para a magistratura nacional, mas também as bases. No recente congresso que tivemos em Florianópolis, foram estabelecidas  para o Judiciário metas consensuais. Não foram ouvidos somente os tribunais, mas também os servidores. Por meio de diálogo teremos muito mais sucesso no cumprimento dessas metas”.
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O presidente do CNJ falou ainda de sua “extrema preocupação” com  a “explosão da litigiosidade”, de um lado, e , de outro, da “cultura do encarceramento” . Ele lembrou  que existem 100 milhões de processos para 16.500 juízes, “processos que crescem em escala geométrica”. E que há no Brasil 600 mil pessoas encarceradas, das quais 40% em caráter provisório. Ou seja, 240 mil presos que poderiam estar cumprindo penas alternativas, usando, por exemplo, tornozeleiras eletrônicas.
O ministro informou que está para assinar convênio com o Ministério da Justiça  para a compra de milhares de tornozeleiras, até por que “o Brasil é o segundo país que mais encarcera pessoas no mundo, muito mais do que a China, que tem mais de 1 bilhão de habitantes”.
Leia abaixo a íntegra:
Gostaria de fazer um breve comentário sobre algumas notícias que têm saído nos jornais ultimamente no que diz respeito ao anteprojeto de Lei Orgânica da Magistratura, que aliás hoje se chama Estatuto da Magistratura, que deverá ser oportunamente encaminhada ao Congresso Nacional, depois de ser discutida pelo plenário administrativo do Supremo Tribunal Federal. Trata-se de um projeto que vem tramitando no Supremo Tribunal Federal há mais de dez anos e tem recebido as mais distintas colaborações, várias comissões já se debruçaram sobre o tema, eu mesmo participei de algumas, quando estava em tramitação o antigo estatuto no Congresso Nacional, sobreveio a Emenda Constitucional 45 e, todos nós sabemos, o presidente do Supremo na época, solicitou de volta o projeto para adapta-lo às mudanças que foram introduzidas pela Emenda Constitucional 45 de 2004. Desde aí, passadas várias presidências, várias comissões, ouvidos vários setores interessados, ao final fez-se uma consolidação de todas as sugestões e essas sugestões foram apresentadas, ainda em forma de anteprojeto, aos colegas do Supremo Tribunal Federal.
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Algumas notícias veiculadas, no entanto, claramente não correspondem à realidade. Talvez se devam a fruto de incompreensões à visão que esta presidência tem do Conselho Nacional de Justiça. Claramente, sempre que muda a presidência de um órgão muda-se a perspectiva, muda-se a visão, muda-se, enfim, a direção que se imprime ao órgão. E esta presidência tem procurado imprimir a este órgão, sem prejuízo da função correcional que é uma função que a própria Constituição atribui ao órgão e não pode ser de forma nenhuma diminuída ou mitigada, e nossa prezada, operosa, digna e combativa corregedora nacional de Justiça sabe que ela tem atuado com a maior liberdade e não lhe tem faltado meios para cumprir adequadamente sua missão, sejam meios, sejam meios em termos de pessoas, juízes auxiliares, então sua excelência tem desempenhado um excelente trabalho e todos nós testemunhamos esse excelente trabalho e, portanto, essa atribuição do Conselho permanece absolutamente intocada.
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Há certas incompreensões no tocante a uma notícia que foi divulgada no sentido de que conselheiros não mais poderiam interrogar os juízes, os magistrados brasileiros. Evidentemente, essa notícia não tem o menor cabimento. Os conselheiros têm uma atribuição aqui que advém diretamente da Constituição. Talvez quem divulgou esta notícia tenha feito uma pequena confusão porque na parte do anteprojeto do Estatuto da Magistratura, em que se prevê o processo disciplinar dos magistrados, não tem nada a ver com a investigação feita pelo CNJ, prevê-se, além daqueles direitos que todo cidadão brasileiro processado tem, que é o direito à ampla defesa, ao contraditório, ao devido processo legal, o direito de ser interrogado apenas por um magistrado de sua categoria. Isso acontece em outros organismos também, especialmente nas Forças Armadas. Não se tem ideia nem notícia jamais na história de nossas Forças Armadas de sargento que interrogasse um coronel, ou um capitão, ou um general. É isso que se pretende naquele capítulo especifico que diz respeito ao processo disciplinar do magistrado brasileiro e que não tem nada a ver com as atribuições do CNJ.
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Nós estamos extremamente preocupados com dois fenômenos importantes, e temos feitos algumas visitas internacionais nesse sentido, conversado com ministros da Justiça e com outros órgãos análogos ao nosso conselho nacional da magistratura. Um deles é a explosão de litigiosidade que afeta o Brasil. Essa é uma das preocupações básicas do presidente do Conselho Nacional de Justiça de como enfrentar os 100 milhões de processos que temos em andamento no País para 16.500 juízes e, processes esses, que crescem em escala geométrica. Estamos envidando, como todos sabem, todos os nossos esforços no sentido de introduzirmos medidas alternativas de solução de controvérsia em nosso País, quais sejam arbitragem, mediação, conciliação, e outras, e esse tem sido inclusive o diálogo que temos travado internacionalmente para colhermos subsídios nesse sentido. Então, evitar a cultura da litigiosidade e implantarmos no Brasil uma cultura de pacificação.
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O segundo grande objetivo desta presidência do Conselho Nacional de Justiça é enfrentar o que chamo de cultura do encarceramento. Nós temos no Brasil hoje mais de 600 mil presos, sendo que deles 40% são presos provisórios, 240 mil presos provisórios aproximadamente, pessoas que poderiam estar cumprindo cumprir medidas alternativas, previstas aliás na legislação pátria, que é exatamente o artigo 319 do Código de Processo Penal. Tornozeleiras eletrônicas, por exemplo. Nesse sentido, dentro de alguns dias, nós assinaremos um convênio com o Ministério da Justiça para comprarmos, por todo o País, milhares de tornozeleiras eletrônicas para que elas possam ser efetivamente usadas pelos juízes da execução.
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O Brasil é hoje, pasmem, o segundo país que mais encarcera pessoas no mundo. Vim da China, onde participei de vários compromissos oficiais, visitas à Suprema Corte, assinaturas de acordos de cooperação, e tive a oportunidade de conversar com a ministra da Justiça da China e ela me disse que estava extremamente preocupada com a população carcerária da China, de 1.600 presos para uma população de 1,2 bilhão. Vejam a desproporção imensa de prisioneiros que temos no Brasil. Então, dentro do planejamento estratégico que nós pretendemos, é justamente enfrentar estes dois problemas básicos que são o problema de excesso de processos, ou da cultura de litigiosidade que se implantou no Brasil, e de outra parte a cultura do encarceramento, de um lado com 100 milhões de processos em andamento e em progressão geométrica, e de outro lado com 600 mil presos também em progressão geométrica.
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Li também algumas críticas pelo fato de ter instalado, junto à presidência, um conselho consultivo de presidentes de Tribunais de Justiça. Os juízes estaduais hoje correspondem à grande maioria dos juízes em atividade no Brasil. De outra parte também instalei um conselho consultivo das associações de magistrados. Hoje, na nova democracia participativa que se implantou com a Constituição de 1988, não é mais possível estabelecer metas e prioridades de cima para baixo sem ouvir aqueles que são atingidos por essas metas. É muito importante que o presidente tenha, complementarmente à visão técnica e oportuna do Conselho sobre os problemas da magistratura nacional, que se ouça também aquele que está na trincheira, muitas vezes abandonado nos rincões mais extremos do País. Ele precisa ser ouvido e como ele se faz ouvido? Através das associações que podem eventualmente veicular algum problema, alguma insatisfação, alguma intranquilidade que movem os juízes da base dessa enorme magistratura brasileira. De outra parte também, os juízes estaduais, representados em seu colégio de presidentes. Nós temos hoje 27 tribunais autônomos com problemas particulares que precisam ser ouvidos também antes que se tomem algumas medidas.
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Eu posso lembrar que, recentemente, abandonou-se o projeto de informática e adotou-se outro quando muitos, para não dizer a maioria, já tinham adotado processos de informatização próprios. Por exemplo, São Paulo já tinha previsto investimentos da ordem de R$ 600 milhões. Então é muito importante que nós ouçamos, nesta nova fase da democracia brasileira, não apenas os órgãos de cúpula que são responsáveis pelas diretrizes para a magistratura nacional, e me refiro não apenas ao Conselho Nacional de Justiça, mas também ao próprio Supremo Tribunal Federal, que tem um papel extremamente relevante com os instrumentos que tem, com as súmulas vinculantes, as suas repercussões gerais, mas que se ouça a base também.
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No recente Encontro Nacional do Judiciário, em Florianópolis, em que foram estabelecidas as metas para a magistratura nacional em todo o Brasil, foram metas consensuadas. Foram ouvidos não apenas os tribunais do País, federais, estaduais, do trabalho, foram ouvidos os representantes dos servidores e também as associações. Tenho certeza que, por meio do diálogo, nós haveremos de ter muito mais sucesso na aplicação dessas metas do que se fossem simplesmente estabelecidas unilateralmente.
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São essas algumas observações que eu gostaria de fazer, sem entrar em maiores polêmicas. Evidentemente, o presidente deste Conselho Nacional de Justiça tem o maior interesse no fortalecimento desse órgão, que aliás tem crescido exponencialmente. O ministro Jobim me dizia que no início deste órgão nós tínhamos 15 conselheiros e um funcionário para cada gabinete, portanto 30 membros que trabalhavam em salas do Supremo Tribunal Federal. Hoje nós temos mais de 830 servidores entre efetivos e terceirizados e orçamento de quase R$ 280 milhões. Ou seja, é um órgão que cresceu extraordinariamente, para muito além daquilo que os constituintes imaginavam, lançando seus olhos sobre temas que jamais os constituintes originários imaginavam, como precatórios, problemas de saúde, problemas da mulher, mediação, conciliação, arbitragem. Enfim, é um órgão que está crescendo e que precisa realmente de um direcionamento, como tem sido dado em consenso com os demais, e todos sabem dos esforços que a presidência tem empreendido no sentido de dotarmos este órgão, que antes ocupava algumas salinhas no STF e hoje ocupa cinco prédios de Brasília. E todos sabem que estamos fazendo esforços, ouvindo os conselheiros, no sentido de unificarmos todas as instalações em um único prédio. É preciso que se compreenda com clareza o que está sendo feito no anteprojeto da Lei Orgânica da Magistratura, que será ainda objeto de um longo debate no STF e ainda será levado à apreciação dos representantes do povo, dos deputados e senadores, que afinal decidirão sobre aquilo que é melhor não apenas para a magistratura mas para todo o País. Mas é preciso sempre ter clareza nas informações e clareza naquilo que se divulga.

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JOTA

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