Bárbara Pombo

Bárbara Mengardo

Depois de o governo criar um salário para integrantes do Carf, o Ministério da Fazenda transferiu para a OAB a decisão de limitar a participação de advogados no conselho que julga recursos contra punições da Receita Federal. No dia 7 de maio, mais de uma semana depois do decreto que fixa gratificação de até R$ 11.200 mensais aos conselheiros, o ministro Joaquim Levy consultou a OAB sobre o impacto do pagamento na atuação dos advogados no conselho.
O assunto dividiu a Ordem, que analisa a consulta de Levy na segunda-feira (18/05). Foi quase tópico único nas conversas de tributaristas nas últimas semanas. Três correntes de interpretação discutem o que os advogados podem fazer: estariam impedidos de advogar contra a Fazenda Pública? Essa eventual limitação se aplicaria também a seus colegas de escritório?
Há quem defenda, ainda, que as funções de advogado e de conselheiro representante dos contribuintes seriam incompatíveis. Tentar manter um pé em cada uma das canoas implicaria a suspensão da carteira da OAB, “passaporte” necessário para o exercício da profissão.
“A prevalência dessa corrente vai desestimular tributaristas a atuarem no Carf”, afirma Gustavo Ventura, vice-presidente da Comissão Especial de Direito Tributário da OAB nacional.
As duas outras correntes entendem que os conselheiros do Carf estariam impedidos de atuar como advogados privados apenas em algumas situações. Em uma minuta de parecer finalizada na quinta-feira (14/05), a comissão especial de direito tributário da OAB fechou a posição de que a limitação abrange apenas o advogado conselheiro em casos contra a fazenda pública federal.
Formado por representantes do Fisco e dos contribuintes, o Carf está em evidência desde que a Polícia Federal deflagrou a Operação Zelotes no dia 26 de março. No início de abril, o governo suspendeu todas as sessões do órgão e colocou em consulta pública uma nova versão - mais restritiva - do Regimento Interno do conselho. A instituição do pagamento a representantes dos contribuintes foi feita no dia 29 de abril, por meio do decreto presidencial 8.441/2015.
Presidência da OAB.
Na interpretação do presidente da OAB, Marcus Vinicius Furtado Coêlho, o impedimento de atuar no Carf e advogar seria total depois da edição do decreto.
“O impedimento do conselheiro do Carf deverá ser estendido ao escritório que ele faz parte. Com isso traremos paridade de armas”, afirmou. Coêlho também sugere a edição de ato semelhante à <a href="http://www.cnj.jus.br/images/imprensa/Resolu%C3%A7%C3%A3o_200-2015.pdf">Resolução 200/2015</a>, do Conselho Nacional de Justiça, que impede magistrados de atuarem em processos patrocinados parentes ou pelos escritórios deles.
Se o plenário da OAB aprovar a posição do presidente, um escritório que tenha integrantes entre os conselheiros do Carf não poderia atuar em outros casos tributários contra a União. A área tributária das bancas, desta forma, ficaria restrita aos casos envolvendo tributos dos Estados e municípios. O volume de processos no Carf supera R$ 500 bilhões, segundo o governo.
Já é possível cravar que a sessão do plenário vai mudar os rumos do Carf, independentemente do que OAB decidir na segunda-feira, com a alteração do perfil dos conselheiros e do próprio tribunal administrativo. Antes mesmo de uma definição da OAB, <a href="https://www.jota.info/remuneracao-leva-conselheiros-do-carf-a-entregar-os-cargos">sete integrantes do conselho já entregaram os cargos</a>. Nos bastidores, outros admitem fazer o mesmo.
O relator da consulta é o conselheiro Marcelo Galvão.
A opinião da PGFN
Na consulta formulada à OAB, a equipe econômica quer saber se há incompatibilidade ou impedimento entre a advocacia e a função de conselheiro do Carf. A prevalecer a segunda hipótese, a Fazenda pede esclarecimentos sobre se o impedimento do advogado se estenderia aos sócios e associados do escritório do conselheiro, além dos parentes dele.
A pedido do secretário executivo adjunto da Fazenda, Fabricio Valle Dantas Leite, a Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional (PGFN) elaborou o Parecer 584/2015, no qual opina ser incompatível o exercício da advocacia com “a deliberação coletiva da administração pública”. Isso porque os conselheiros dos contribuintes colaboram com o Poder Público, e não são servidores. Além disso, a procuradoria reforça seu entendimento citando a função judicante do Carf - que não é um órgão regulador.
“A proibição total ao exercício da advocacia imposta aos que exercem função de julgamento em órgãos colegiados da Administração Pública tem fundamento em preceitos éticos, uma vez que esses agentes possuem evidente poder de adesão sobre interesses de terceiros”, assinala a PGFN em documento assinado pelo procurador Daniel Neiva Freire, da Coordenação-Geral Jurídica do órgão. “ A par de outras implicações éticas, essa circunstância, se aliada à capacidade postulatória do agente, poderia — ao menos em tese — representar um injustificado privilégio no mercado profissional.”
Diferentemente do que têm defendido alguns tributaristas, a Fazenda rejeita a comparação da situação do Carf com a Justiça Eleitoral - que possui advogados como juízes. A PGFN cita a decisão do STF da ADI 1.127: não há incompatibilidade porque a composição da Justiça Eleitoral é estabelecida na Constituição.
Sem advogados
A Fazenda arremata o parecer afirmando que a função de conselheiro representante do contribuinte não precisa, necessariamente, ser exercida por advogados.
“Conquanto se reconheça que os advogados se destacam no preenchimento desses requisitos, não se pode falar em norma constitucional ou legal que determine a representação da classe no referido Conselho.”
A PGFN cita a Lei 11.941/2009 e o Decreto 7.482/2011, que exigiriam integrantes “indicados pelas confederações representativas de categorias econômicas de nível nacional e pelas centrais sindicais”. O Regimento Interno do Carf, por sua vez, impõe que os conselheiros tenham “notório conhecimento técnico, registro no respectivo órgão de classe há, no mínimo, cinco anos e efetivo e comprovado exercício de atividades que demandem conhecimento nas áreas de direito tributário, de processo administrativo fiscal, de tributos federais e de contabilidade’’.
A Fazenda cita também duas decisões do Conselho Federal em que a OAB entendeu não haver incompatibilidade ou impedimento de advogados atuarem como conselheiros do Carf (Consulta 0002/2004/OEP) ou do Tribunal de Impostos e Taxas de São Paulo (Consulta 49.0000.2013.007132-1/OEP). Nos dois casos, não havia remuneração. O cenário, porém, é outro diante do jeton instituído pelo governo.
De acordo com um membro da comissão de direito tributário da OAB ouvido pelo JOTA, poderia-se interpretar que a remuneração aos conselheiros do Carf seria conflitante com o entendimento deferido anteriormente pela ordem. Neste caso, entretanto, seria preciso analisar se o montante estabelecido pelo decreto caracterizaria remuneração ou apenas uma ajuda de custo, já que a norma vincula o valor a ser recebido à quantidade de sessões nas quais o conselheiro atua.
Por fim, a PGFN afirma que o Decreto 8.441, de 2015 não tem o poder de ampliar ou restringir o exercício profissional dos advogados. “Isso não significa, contudo, que não possa o Decreto fixar requisitos ao exercício de mandato em órgão de deliberação coletiva que integra a estrutura do Poder Executivo”, afirma.
Por advogados tributaristas no Carf
Em memorial enviado à presidência da OAB, conselheiros do Carf que representam os contribuintes defendem a compatibilidade entre as funções,  alegando que o jeton oferecido pelo governo não configuraria remuneração de natureza salarial. Argumentam, ainda, que os conselheiros representantes do Fisco recebem R$ 22 mil por mês, valor superior aos R$ 11.200 prometidos aos representantes dos contribuintes.
“Se a gratificação de presença prevista no Decreto n° 8.441/15 fosse remuneração, frente ao fato de que os Conselheiros exercem a mesma função, com as mesmas responsabilidades, prazos, metas, produtividade, a dita “remuneração” de Conselheiros Fazendários e Não Fazendários haveria de ser idêntica”, afirma, no documento, a vice-presidente do Carf, Maria Teresa Martínez López, advogada do Bradesco.
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O decreto determina uma “gratificação de presença” aos conselheiros dos contribuintes pela participação em, no máximo, seis sessões de julgamento por mês. Por cada uma delas, o governo pagaria o equivalente a um sexto da remuneração concedida ao cargo comissionado DAS-5. Atualmente, um funcionário nessa posição recebe R$ 11,2 mil mensais.
Advogados ouvidos pelo JOTA dizem que o decreto não é claro sobre a manutenção do pagamento nos meses em que não houver sessões de julgamento ou quando o conselheiro apresentar um atestado médico.
Não bastasse a polêmica do Carf, o plenário da OAB também deve indicar integrantes para o Conselho Nacional de Justiça (CNJ) e para o Conselho Nacional do Ministério Público (CNMP).
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JOTA

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