A ineficiência do sistema penal cria mecanismos indevidos para retirar a pena que foi imposta. Essa ineficácia gera um sistema em que a impunidade é a regra. Quem afirma é o Procurador da República da 4ª Região, Douglas Fischer.
“O sistema precisa ser revisto, e revisto com urgência. Eu insisto muito em dizer sempre que eu não quero punir ninguém violando direitos, só que eu não quero essa ineficiência que gera um desproteção sistêmica que atinge também direitos fundamentais da sociedade, da coletividade. É preciso encontrar um equilíbrio”, ressalta.
Fischer defende ainda ser preciso reformar a legislação e acabar com os recursos abusivos, além de modificar o sistema prescricional. Tais propostas estão nas dez medidas contra a corrupção que é analisada na Câmara dos Deputados.  “Nós temos um investimento efetivo do Estado na execução de pena. Precisa mudar efetivamente a mentalidade das instituições: pequenos crimes não precisam cumprir penas em presídios”, afirma.
O procurador se diz “inteiramente favorável” à maioria das 10 Medidas contra Corrupção e defende a rápida aprovação de algumas propostas fundamentais como a limitação do Habeas Corpus para as situações que efetivamente são relevantes e relacionadas à prisão injusta. E explica: a proposta não prevê retirar a possibilidade do uso do HC.
Em relação à anistia do caixa dois, Fischer afirma que  o afastamento da responsabilidade penal por intermédio de anistias gera imunidade penal e viola os princípios constitucionais de um Estado Democrático de Direito. Além disso, segundo ele, o parlamentar não tem autorização para, de forma arbitrária, legislar contra a própria sociedade, ainda mais quando para se autobeneficiar ou então beneficiar criminosos que cometeram fatos extremamente graves e atentatórios ao sistema democrático.
Leia a entrevista abaixo:
JOTA - O Estado é ineficiente no sistema penal brasileiro?
Douglas Fischer - Na primeira fase do sistema penal, temos um sistema acusatório extremamente anacrônico, um sistema recursal absurdo, um sistema prescricional que gera uma impunidade bárbara, além de deficiências das instituições. Na segunda fase, na execução da pena, o sistema carcerário brasileiro é de uma ineficiência brutal que, de mais de 870 mil condenações, 0,20% são condenações efetivas por crimes um pouco mais graves, como corrupção e peculato. Isso revela que aplicamos mal o direito penal. Esses dados estão no Depen (Departamento Penitenciário Nacional).
Quais são as consequências dessa ineficiência do sistema penal?
Por conta dessa deficiência criam-se mecanismos, por exemplo, como indulto que o sujeito cumpre uma pena mínima, de ⅙ da pena e é condenado a oito e nove anos e a pena some. Essa ineficiência do sistema carcerário tem gerado mecanismos indevidos para retirar a pena que foi imposta.
Então, em um primeiro momento, existe a dificuldade de persecução, recursos, impunidade. Após a condenação, no momento do cumprimento da pena, existe todo o problema do sistema carcerário, do sistema de cumprimento de pena e dos indultos. Isso gera um sistema em que a impunidade é a regra. Então, temos a decorrência de tudo isso um sistema muito deficitário que precisa ser revisto, e revisto com urgência. Eu insisto muito em dizer sempre que eu não quero punir ninguém violando direitos, só que eu não quero essa ineficiência que gera um desproteção sistêmica que atinge também direitos fundamentais da sociedade, da coletividade. É preciso encontrar um equilíbrio.
O que pode ser feito na prática para melhorar essa situação? É preciso elaborar um novo código de processo penal?
É preciso reformar a legislação. Acabar com os recursos abusivos. Modificar o sistema prescricional. Essas propostas estão nas 10 Medidas Anticorrupção. Nós temos um investimento efetivo do Estado na execução de pena. Precisa mudar efetivamente a mentalidade das instituições: pequenos crimes não precisam cumprir penas em presídios. Além da necessidade de humanização do cumprimento de pena. Isso eu não tenho dúvida. Essas são questões práticas que precisam ser implementadas para começar a modificar. Se não, nós só vamos aumentar a bola de neve.
As dez medidas estão sendo discutidas na comissão especial da Câmara. Para o senhor, as propostas são necessárias para a melhoria do sistema penal?
Sou inteiramente favorável que a grande maioria delas sejam aprovadas o quanto antes. Eu tenho minhas dúvidas se o Congresso vai aprovar todas. Mas eu digo que algumas delas são fundamentais como o sistema recursal e o sistema de prescrição. Além disso, há também a limitação do Habeas Corpus para as situações que efetivamente são relevantes e relacionadas a prisão injusta e a criminalização do enriquecimento ilícito. Eu sei que é um tema polêmico. Isso não é a solução, mas é o começo da modificação. E não vai gerar violação de direito fundamental de ninguém. Vai maximizar os direitos da coletividade junto com os direitos daqueles que serão processados. Condenar 0,20% desses crimes não faz sentido.
Uma eventual mudança do Direito Penal na atual fase do país é positiva?
Esse é o momento para discutirmos e mudarmos não só a legislação mas a mentalidade de modo de atuação. Eu digo isso sempre: O Direito penal é um mal necessário, ele precisa existir para algumas situações, mas não vai resolver enquanto nós não tivermos um sistema educacional efetivo. Pode esquecer.

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JOTA

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