Redação JOTA

*Reportagem atualizada às 16h04 de 19/3 para atualizar PDF da decisão, divulgado pelo STF
O ministro Gilmar Mendes, do Supremo Tribunal Federal (STF), sustou a nomeação do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva como ministro-chefe da Casa Civil em mandados de segurança proposto pelo PPS e pelo PSDB.
Em decisão no MS 34.070 e no MS 34.071, Gilmar Mendes determinou que todos os procedimentos criminais contra o ex-presidente da República devem ser conduzidos pelo juiz federal Sérgio Moro, responsável pela 1ª instância da operação Lava Jato.
"Já era esperado, vamos analisar a melhor forma de recorrer da decisão", disse o advogado geral da União, José Eduardo Cardozo. "A decisão contraria jurisprudência do Supremo Tribunal Federal."
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A AGU pode recorrer da decisão de Gilmar ao Plenário do Supremo. A próxima sessão está marcada para dia 30 de março, depois do feriado da Páscoa.
Os Mandados de Segurança Coletiva foram impetrados pelo Partido Popular Socialista (PPS) - 34.070 - e pelo Partido da Social Democracia Brasileira (PSDB) - 34.071. Os dois alegaram que a presidente Dilma Rousseff nomeou Lula para o cargo de Chefe da Casa Civil em ato praticado com desvio de finalidade.
Os partidos apontam que a nomeação teria sido praticada em desvio de finalidade, na medida em que buscou conferir prerrogativa de foro ao ex-presidente, "impedindo o curso das investigações".
O PPS mostrou passo a passo como o ex-presidente Lula foi nomeado ministro de Estado e pediu medida liminar para sustar os efeitos da nomeação. Primeiro, mostra a ação, a operação Lava Jato revela que pessoas aliadas a Lula seriam autoras da prática de crimes, depois o juiz Sérgio Moro determina a condução coercitiva do ex-presidente.
Em seguida, a juíza da 4ª Vara Crimina de São Paulo declinou de sua competência para julgar o pedido de prisão preventiva de Lula, depois a Presidente Dilma decide nomear Lula como ministro chefe da Casa Civil a "deslocar todas as investigações contra o ex-presidente Lula para o STF".
Por último, o partido apontou que interceptação telefônica da Polícia Federal revelou diálogo entre Dilma e Lula. "Na gravação, a autoridade coatora é clara ao falar para o ex-Presidente Luís Inácio Lula da Silva: ‘só usa em caso de necessidade, que é o TERMO DE POSSE, tá?!’"
Ao decidir pela liminar, o ministro Gilmar Mendes afirmou que nenhum Chefe do Poder Executivo, em qualquer de suas esferas, é dono da condução dos destinos do país.
"Na verdade, ostenta papel de simples mandatário da vontade popular, a qual deve ser seguida em consonância com os princípios constitucionais explícitos e implícitos, entre eles a probidade e a moralidade no trato do interesse público “lato sensu”.
Além disso, afirmou que o princípio da moralidade pauta qualquer ato administrativo, inclusive a nomeação de Ministro de Estado, e por isso impede que que sejam conspurcados os predicados da honestidade, da probidade e da boa-fé. Assim, diz o ministro, ainda que cabe à presidente da República nomear o ministro de Estado, o preenchimento d cargo deve passar pelo crivo dos princípios da moralidade e da impessoalidade.
Ao analisar o caso específico da nomeação do es-presidente Lula, Gilmar Mendes considerou que havia investigações e andamento que ficariam paralisadas pela mudança de foro, com opor exemplo a operação Aletheia, desdobramento da Lava Jato. "Havia uma denúncia pendente de apreciação, acompanhada de um pedido de decretação de prisão preventiva – caso Bancoop", explica.
Para o ministro, é claro o tumulto causado ao processo das investigações pela mudança de foro. Além disso, diz ser“autoevidente” que o deslocamento da competência é forma de obstrução ao progresso das medidas judiciais. Afirmou ainda que a retomada das medidas judiciais pelo STF "não seria sem atraso e desassosego".
"O tempo de trâmite para o STF, análise pela PGR, seguida da análise pelo relator e, eventualmente, pela respectiva Turma, poderia ser fatal para a colheita de provas, além de adiar medidas cautelares".
"A simples nomeação, assim como a renúncia, demonstram suficientemente a fraude à Constituição".
Interceptações telefônicas
O ministro Gilmar Mendes falou ainda sobre as provas produzidas no processo que tramita na 13ª Vara Federal de Curitiba, no qual foi determinada a interceptação de vários telefones, entre eles terminais usados por Lula.
Mendes afirma que, "de fato", houve decisão determinando a interrupção das receptações no dia 16 de março às 11h13 e que a ordem não teria sido imediatamente cumprida, "o que levou ao desvio e gravação do áudio".
Entretanto, o ministro afirmou que não é necessário emitir juízo sobre a licitude da gravação. "Há confissão sobre a existência e conteúdo da conversa, suficiente para comprovar o fato", disse. Ele se referia ao fato de Dilma ter admitido a conversa até em nota oficial.
Leia trecho da nota:
“Para conhecimento público, divulgamos cópia do termo de posse assinado hoje à tarde pelo ex-presidente Lula e que se encontra em poder da Casa Civil. Esse termo foi objeto do telefonema mantido entre o ex-presidente Lula e a presidenta Dilma Rousseff, sendo, no dia de hoje, divulgado, ilegalmente, por decisão da Justiça Federal do Paraná".
Confissão extrajudicial
Segundo o ministro: "Estamos diante de um caso de confissão extrajudicial, com força para provar a conversa e seu conteúdo, de forma independente da interceptação telefônica".
"A confissão não mereceria invalidação pelo nexo com a prova ilícita – gravação sem autorização. A admissão foi espontânea, na medida em que sobre ela não houve indagação por autoridade".
Além disso, de acordo com Gilmar Mendes, com o andamento das investigações "pairava cenário" que indicava que, nos próximos desdobramentos, o ex-Presidente poderia ser implicado em ulteriores investigações, preso preventivamente e processado criminalmente.
"A assunção de cargo de Ministro de Estado seria uma forma concreta de obstar essas consequências", disse.
O ministro aponta conversas em que isso fica claro. Por exemplo, em um conversa com Lula, um cientista político diz que a única chance de escapar da prisão seria a assunção de um ministério. Já em outra conversa, Rui Falcão, Presidente do Partido dos Trabalhadores, propõe ao então Ministro Chefe da Casa Civil, Jaques Wagner, a nomeação de Lula para cargo de Ministro de Estado, para impedir sua prisão.
República de Curitiba
"Não há aqui pedido de nomeação para o cargo, mas há uma clara indicação da crença de que seria conveniente retirar a acusação da 13ª Vara Federal de Curitiba – a “República de Curitiba” –, transferindo o caso para uma “Suprema Corte acovardada”. Além do tumulto processual causado pela declinação, há a crença de que o foro no STF seria leniente com o ex-Presidente. O objetivo da Presidente da República de nomear Luiz Inácio Lula da Silva para impedir sua prisão é revelado pela conversa seguinte, em 16.3, 13h32", diz um trecho da decisão de Gilmar Mendes.
Explicação de Dilma não corresponde ao que foi dito
Em um outro trecho, Gilmar contesta a explicação de Dilma para o diálogo mantido com Lula:
“Finalmente, cabe esclarecer que no diálogo entre o ex-presidente Lula e a presidente Dilma a expressão “pra gente ter ele” significa “o governo ter o termo de posse”, assinado pelo presidente Lula, para em caso de sua ausência já podermos utilizá-lo na cerimônia de amanhã. Por isso, o verbo não é “usa” mas sim o governo usar o referido termo de posse”. Essa explicação não corresponde ao que foi dito, nem é compatível com a legislação de regência."
Termo de posse como ministro da Casa Civil
O ministro discorreu ainda sobre a assinatura de Lula no "Termo de Posse" e disse que a assinatura de Lula não é suficiente para que ele pudesse assumir o cargo de ministro. Se o ex-presidente não estivesse presente na cerimônia ou ele não tomaria posse - podendo fazê-lo a qualquer momento, no intervalo de trinta dias contados da publicação da nomeação – ou tomaria posse por procuração. 
"Uma explicação plausível para o documento objeto da conversa é que foi produzido um termo de posse, assinado de forma antecipada pela Presidente da República, com a finalidade de comprovar fato não verídico – que Luiz Inácio Lula da Silva já ocupava o cargo de Ministro de Estado".
"O objetivo da falsidade é claro: impedir o cumprimento de ordem de prisão de juiz de primeira instância. Uma espécie de salvo conduto emitida pela Presidente da República. Ou seja, a conduta demonstra não apenas os elementos objetivos do desvio de finalidade, mas também a intenção de fraudar".

Gilmar

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