Ana Pompeu

O ex-ministro da Saúde Eduardo Pazuello prestou depoimento à CPI da Pandemia no dia 20 de maio. Dias depois, participou de um ato político ao lado do presidente Jair Bolsonaro -- participação que não foi punida pelo comando do Exército -- e hoje ocupa um cargo de confiança no Palácio do Planalto. Mas caso a CPI conclua que Pazuello cometeu um crime e o Ministério Público concorde com o relatório, a quem caberia julgar o ex-ministro? A Justiça Federal Comum ou a Justiça Militar? 
Ministros do Superior Tribunal Militar (<a href="https://www.jota.info/tudo-sobre/stm">STM</a>) entendem que, se algum crime for apontado pela comissão parlamentar de inquérito, o caso deverá ser julgado pela Corte. Apesar de Pazuello não ter atuado contra a administração militar ao agir no cargo de ministro de Estado, a qualidade do agente — ou seja, ainda ser um militar da ativa — deslocaria o foro para a jurisdição do tribunal. Há, na Justiça Militar da União, quem se disponha a defender esse ponto de vista. 
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O fundamento da argumentação está na Lei 13.491, aprovada em 2017, que diz que a Justiça Militar, em determinadas situações, pode julgar tanto os crimes militares tipificados no Código Penal Militar como todos os outros que estão na legislação penal comum e que não estão previstos na lei específica. Com exceção da improbidade administrativa -- imputação à qual Pazuello pode vir a responder e que, apesar de prever punições duras, não é crime --, esse braço da Justiça poderia, a partir daquele ano, julgar esses casos criminais do artigo 9°, inciso 2° do CPM (crimes militares em tempos de paz). 
Apesar da posição de integrantes da Justiça Militar, há penalistas que entendem de modo diverso. Advogados e promotores que atuam na área avaliam que, em "condições normais de temperatura e pressão", ou seja, em uma situação ordinária, sequer em caso de processo por homicídio ele responderia na JMU, já que não praticou crime contra a administração militar. 
A competência militar para processar e julgar um general do Exército seria em hipóteses de condutas que tenham a ver com atividades militares ou que tenham sido cometidas em local sujeito à administração militar. Na condição de ministro da Saúde, não estava na caserna ou em função dela.
Para aqueles que são alinhados a essa perspectiva, a partir de 2017, a redação do art 9° do CPM foi alterada e a doutrina começou a falar em uma nova figura, o crime militar por extensão, ou seja, crime praticado em situação ou correlação à atividade militar. Um exemplo: se antes não poderia responder como crime licitatório porque este não estava previsto no CPM, passou a ser possível com a mudança. 
Se, no fim, se entender que é mesmo a Justiça Federal comum que será responsável por processar e julgar o general aliado do presidente, pode, ainda, ser feito um Conselho de Justificação para verificar se ele tem condições de permanecer nos quadros da carreira, mesmo se tiver decidido ir para a reserva. É o mesmo instrumento que julgou Bolsonaro culpado, por 3 a 0, em 1988. Nesse caso, ele perde o posto e a patente do oficialato. E, com pena superior a dois anos, o MPM poderia oferecer denúncia. 
Na Justiça Federal ele seria julgado por um juiz de primeiro grau. Na Militar, seria julgado direto no STM, em razão do foro por prerrogativa de função. O início do processo seria mais rápido na JF. Como comparação, basta observar os processos que correm no STJ e STF, de competência penal originária. A tramitação daqueles submetidos ao foro privilegiado costuma ser mais lenta. Caso um juiz federal de primeiro grau recebesse o caso, seria provável que caminhasse com mais agilidade. A diferença é que, assim, ele teria direito a apelação, ao passo que, no STM o julgamento seria numa instância única. Assim, ao cabo, o resultado definitivo do julgamento deveria se dar mais rápido na Justiça Militar.  
O STM tem uma atuação diferente dos demais tribunais superiores. Ele funciona como se fosse também a segunda instância, como um tribunal de justiça das auditorias de Justiça Militar. Na primeira instância, o Conselho Permanente de Justiça é competente para processar e julgar militares que não sejam oficiais. O Conselho Especial de Justiça é competente para processar e julgar oficiais, exceto os oficiais generais, que são processados diretamente no STM, caso de Pazuello. Os recursos às decisões de primeiro grau são remetidos diretamente para o STM.
Demitido em março por pressões contra a gestão que fez, considerada desastrosa, à frente da Saúde, o general foi reincorporado ao Palácio do Planalto — e não pretende abreviar a carreira militar, ao menos enquanto durar a CPI. Aliado de Bolsonaro, o presidente pediu aplausos ao ex-ministro durante cerimônia para nomeação dele para o cargo de secretário de Estudos Estratégicos da Secretaria Especial de Assuntos Estratégicos da Presidência da República, com salário de R$ 16,9 mil, na terça-feira da semana passada (1/6). Pazuello não ter ido para a reserva tem parecido ser pior para a imagem do Exército do que para o ex-ministro da Saúde.

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JOTA

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