A Corte Interamericana de Direitos Humanos (Corte IDH) julgou o Paraguai responsável pelo assassinato do jornalista Santiago Leguizamón Zaván. O tribunal considerou o Estado paraguaio responsável pela violação dos direitos de Zaván à proteção judicial e também pela violação da integridade pessoal da mulher, da filha e dos filhos do jornalista assassinado.
No processo, o Paraguai reconheceu sua responsabilidade internacional pelo assassinato de Zaván. De acordo com a sentença, o Paraguai foi condenado a fazer pagamentos que somam US$ 505 mil em indenizações para a esposa do jornalista (Ana María Margarita Morra) e para os quatro filhos dele (Raquel, Dante, Sebastián e Fernando Morra).
O jornalista Santiago Leguizamón Zaván foi assassinado em Pedro Juan Caballero, cidade paraguaia na fronteira com o Brasil, em 26 de abril de 1991.
Quando foi assassinado por pistoleiros, Zaván era diretor e proprietário da Rádio Mburucuyá, de Pedro Juan Caballero, correspondente do Canal 13 e dos jornais Noticias e Ultima Hora.
Zaván se destacou na cobertura de notícias de elevado interesse público, denunciando casos de contrabando de madeira, corrupção, narcotráfico, violência e a situação dos camponeses e povos indígenas. Antes de ser morto, o jornalista tinha sofrido diversas ameaças por sua atuação profissional.
A família de Zaván acusou o Estado paraguaio de ter se omitido no esclarecimento do crime. A Comissão Interamericana de Direitos Humanos (CIDH) formalizou a acusação de que o Paraguai se omitiu da proteção do direito de Zaván à liberdade de expressão.
A investigação da polícia paraguaia indicou 14 indivíduos como suspeitos de envolvimento no assassinato, mas todos eram cidadãos brasileiros.
O governo paraguaio, então, formalizou um pedido de cooperação internacional ao Brasil, mas, de acordo com a sentença, não houve resposta produtiva e tratamento adequado pelo Estado brasileiro. Mais de 30 anos depois do assassinato, a morte de Zaván permanece impune e sete suspeitos já morreram.
A Comissão Interamericana de Direitos Humanos reconheceu que a polícia paraguaia chegou a abrir uma investigação imediatamente após o assassinato, mas argumentou que as autoridades não respeitaram procedimentos e os parâmetros internacionais adequados durante investigações e perícias para a coleta bem-sucedida de provas.
A família da vítima argumentou que a investigação oficial da polícia “teve o propósito de evitar o esclarecimento dos feitos e garantir a impunidade dos autores”, de acordo com a sentença.
Tanto a família quanto a Comissão avaliaram que o caso não teve a devida diligência na coleta de provas e na promoção de uma ação penal contra os responsáveis, ou até linhas de investigação e hipóteses investigativas razoáveis para identificar e punir os responsáveis.
Ao fim do processo, o Estado paraguaio reconheceu que as linhas de investigação não se desenvolveram adequadamente.
Ao julgar o caso, a Corte IDH avaliou que o Estado do Paraguai sabia da situação de risco em que se encontrava Zaván. Mas, ainda assim, não adotou medidas necessárias para evitar que ele fosse assassinado.
A Corte IDH também avaliou que o assassinato de Zaván foi um ataque à liberdade de expressão tanto em sua dimensão individual quanto de maneira coletiva.
O tribunal internacional julgou que o crime teve evidentes consequências para toda a sociedade, pois teve um efeito intimidador sobre outros jornalistas, o que solapou o direito da sociedade paraguaia de ser informada.
“A Corte lembra que a liberdade de expressão, especialmente em assuntos de interesse público, é pedra angular das sociedades democráticas. Sem ela, se debilita o sistema democrático, se viola o pluralismo e a tolerância, os mecanismos de controle e denúncias cidadãs podem se tornar inoperantes e, em definitivo, se cria um campo fértil para regimes autoritários”, destacou a sentença.
Os magistrados da Corte IDH concluíram que o Paraguai não promoveu dentro de um prazo razoável a investigação e o julgamentos dos responsáveis pelo assassinato. Não houve também a “devida diligência”, segundo o tribunal, o que fomentou a impunidade.
Pelas violações, a Corte IDH sentenciou que o Paraguai cumpra as seguintes medidas de reparação:
- criar um Grupo de Trabalho para estabelecer as circunstâncias do assassinato de Zaván;
- praticar ato público de reconhecimento de responsabilidade internacional;
- reestabelecer o prêmio nacional “Santiago Leguizamón” para jornalistas;
- adotar medidas necessárias para preservar lugares destinados a homenagear a memória de Zaván;
- adotar medidas oportunas para fortalecer o trabalho da Junta de Segurança dos Jornalistas paraguaios
- criar um fundo para financiar programas voltados à proteção e assistência a jornalistas vítimas de violência;
- promover a aprovação de um projeto de lei sobre liberdade de expressão, proteção de jornalistas e defensores de direitos humanos;
- pagar indenizações compensatórias por danos patrimoniais e imateriais, assim como custos e gastos.
Participaram do julgamento o presidente da Corte IDH Ricardo C. Pérez Manrique (Uruguai); o vice-presidente Humberto Antonio Sierra Porto (Colômbia); e os magistrados Eduardo Ferrer Mac-Gregor Poisot (México); Nancy Hernandez Lopez (Costa Rica); Verônica Gomez (Argentina); Patricia Pérez Goldberg (Chile) e Rodrigo Mudrovitsch (Brasil).