Bárbara Pombo

Na sua segunda manifestação sobre autuações fiscais decorrentes de operações com ágio, a Câmara Superior do Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (Carf) deu vitória à Fazenda Nacional, mantendo uma cobrança de R$ 22 milhões contra a CPM Braxis, de tecnologia da informação. O colegiado admitiu a tributação pelo Imposto de Renda e pela CSLL sobre ágio decorrente de quotas de sociedades limitadas. Com o mesmo número de votos pró e contra o contribuinte, coube ao presidente do órgão administrativo e auditor fiscal, Otacílio Cartaxo, desempatar o julgamento a favor do Fisco. Não cabe mais recurso no Carf, última instância administrativa para questionar cobranças da Receita Federal.
Ágio é o valor que excede o valor nominal do capital da empresa. Esse tipo de operação ocorre com mudanças na participação acionária, na aquisição de empresas por um preço maior do que o de mercado e em reestruturações entre companhias de um mesmo grupo.
No primeiro julgamento sobre o tema, em maio de 2013, a Câmara Superior anulou uma autuação de R$ 5 milhões contra a Casa do Pão de Queijo (Processo nº 13839.001516/2006­64). Na ocasião, os conselheiros entenderam que a subscrição de ações, uma preferência dada ao acionista, seria uma forma de aquisição de ações e de participação acionária. Logo, o ágio decorrente da operação poderia ser utilizado para abatimento do IR e CSLL, o que garante um recolhimento menor dos tributos.
“Foram os dois primeiros julgamentos sobre ágio na Câmara Superior, mas as discussões são distintas”, alerta o advogado Douglas Guidini Odorizzi, da Advocacia Dias de Souza.
Em março de 1999, a CPM Braxis decidiu aumentar seu capital social em R$ 20 milhões. O preço unitário das cotas foi definido em R$ 5, sendo R$ 1 relativo ao capital social e R$ 4 ao ágio. Sobre os R$ 80 milhões relativos ao ágio gerado na emissão de cotas não foram recolhidos o IR e a CSLL. Daí, a autuação do Fisco.
No Carf, a Câmara Superior reformou decisão proferida em 2010 pela primeira instância do órgão administrativo que havia considerado não haver incidência de tributos sobre o montante, inclusive por se tratar de  aporte de capital.
O Regulamento do Imposto de Renda (Decreto 3.000, de 1999) deixa de fora da tributação o ágio na emissão de ações, de títulos e valores imobiliários (artigo 442, inciso I). Para a Câmara Superior, porém, esse dispositivo só valeria para as sociedades anônimas, e não para as limitadas. “A lógica adotada pelo Carf é que se essa regra não existisse sociedades anônimas e limitadas seriam tributadas”, afirma Odorizzi.
Contas públicas
No primeiro semestre, a Fazenda Nacional conseguiu recuperar R$ 16,7 bilhões em 317 decisões favoráveis do Carf. O valor é pouco menor que os R$ 17,1 bilhões obtidos durante todo o ano passado.
Ao lado da discussão sobre a tributação de lucros de multinacionais brasileiras no exterior, o ágio é o tema com o maior volume financeiro em autuações discutidas no Carf, de acordo com a Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional (PGFN). "A Receita Federal está com foco maior nos grandes contribuintes, e tem mudado a forma de fazer o lançamento tributário. Não faz mais só a análise contábil, mas também do setor [do contribuinte], da estrutura societária da empresa, dos tratados internacionais e preços de transferência", afirma Paulo Riscado, procurador-chefe da PGFN no Carf.
O balanço dos julgamentos do órgão administrativo não permite identificar o peso das duas discussões no volume financeiro obtido pela Fazenda em decisões favoráveis. Mas nenhum especialista nega a relevância. No primeiro semestre do ano, 144 das 317 decisões a favor do Fisco vieram da 1ª Seção do órgão administrativo – responsável por analisar questões sobre Imposto de Renda e CSLL, onde se inserem as disputas acerca de ágio e lucros no exterior.
Em caso de derrota, o contribuinte pode levar ao Judiciário o questionamento sobre a autuação da Receita Federal. Por isso, os R$ 16,7 bilhões ainda não são considerados como parte da arrecadação de impostos. Advogados lembram, porém, que recorrer à Justiça implica garantir, por vezes, milhões de reais em juízo. “Se fizer a garantia em espécie o contribuinte corre o risco de o valor ser imediatamente convertido em renda da União”, pontua um tributarista ouvido pelo JOTA.
O cenário positivo à Receita no Carf está inserido em um contexto de extrema dificuldade do governo federal em fechar as contas do ano. A arrecadação de impostos até agosto cresceu apenas 0,64% em relação ao mesmo período do ano passado. Aposta da equipe econômica para ajudar no cumprimento do superávit primário, o programa de refinanciamento de dívidas fiscais – o Refis – representou receita extra de R$ 7,1 bilhões, montante consideravelmente inferior aos R$ 12 bilhões esperados pela Fazenda em agosto.
A pressão sobre o governo é grande. Por conta da desconfiança do mercado com as contas públicas, agências internacionais de rating têm rebaixado ou sinalizado que farão o chamado downgrade da nota de crédito do Brasil - decisões que podem encarecer os papéis que o Tesouro lança no mercado. No ano, entre janeiro e agosto, o governo central cumpriu um superávit primário inferior a R$ 5 bilhões - a meta para 2014 é de R$ 80 bilhões. Sem aumento da arrecadação, a meta, que é definida pelo próprio governo no Orçamento dificilmente, será atingida.

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JOTA

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