Luiz Orlando Carneiro

A senadora Gleisi Hoffmann (PT-PR) vai ser investigada em inquérito criminal (Inq 4.130) no foro do Supremo Tribunal Federal, por prerrogativa de função. Mas não como suspeita de envolvimento em delitos que teria cometido no âmbito da Operação Lava Jato. Os indícios apontados no processo em que foi citada por delator premiado – ao lado de outros investigados que não têm direito a foro especial – e que foi aberto pelo juiz Sérgio Moro, da 13ª Vara Federal de Curitiba, referem-se a supostos crimes de lavagem de dinheiro praticados em  São Paulo, e não na capital paranaense.
Assim, o feito será desmembrado, a fim de que a investigação prossiga no STF tão somente em relação à senadora Gleisi Hoffmann. Em relação aos demais, cópia dos autos será enviada à Justiça Federal de São Paulo com urgência, já que há réus presos.  Ou seja, nem todos os inquéritos nos quais aparecem  delatores ou personagens  que figuram em investigações ou ações penais  derivadas diretamente do esquema de corrupção na Petrobras devem  ser encaminhados pelo Ministério Público à 13ª Vara Federal de Curitiba, com base nos princípios processuais da prevenção,  da conexão ou da continência.
A decisão foi tomada, na sessão do Supremo Tribunal Federal desta quarta-feira (23/9), em julgamento de questão de ordem afetada pela 2ª Turma  ao plenário . Por unanimidade quanto ao desmembramento apenas com relação à senadora. Mas por 7 votos a 3 (vencidos os ministros Gilmar Mendes, Celso de Mello e, em menor extensão, Roberto Barroso)  quanto à retirada dos autos da 13ª Vara Federal de Curitiba e o encaminhamento do processo à Justiça Federal paulista.
A 2ª Turma do tribunal começara a analisar supostas práticas criminais atribuídas à senadora Gleisi Hoffmann (PT-PR) e a outros investigados sem prerrogativa de foro privilegiado, a partir de trechos do inquérito aberto pelo juiz Sérgio Moto, da 13ª Vara Federal de Curitiba. A questão de ordem foi levada à 2ª Turma pelo ministro Dias Toffoli, e o colegiado formado por cinco ministros resolveu que o plenário é que deveria dirimir a controvérsia. O caso em pauta surgiu em agosto último, a partir da 18ª fase da Operação Lava Jato. O juiz Sérgio Moro teve conhecimento de supostos delitos cometidos pela senadora e outros corréus, que teriam se beneficiado de repasses de valores da Consist Software, empresa que tinha contrato com o Ministério do Planejamento para gestão de empréstimos consignados. Por conta da prerrogativa de foro da senadora, o caso foi enviado ao ministro Teori Zavascki, relator dos casos relacionados à investigação da Lava Jato.
O ministro, contudo, decidiu enviar o caso à presidência do STF, para livre distribuição, por entender que os fatos apontados na investigação envolvendo a senadora não teriam relação com a apuração de fraudes e desvio de recursos no âmbito da Petrobrás. A presidência da Corte concordou com o ministro Teori e determinou a livre distribuição do feito. O inquérito foi então distribuído ao ministro Dias Toffoli.
O Ministério Público Federal requereu ao presidente da Corte a reconsideração da decisão do ministro Teori, para que o inquérito voltasse para sua relatoria. Para a Procuradoria-Geral da República, a questão era  muito importante porque poderia  abrir uma brecha para que os processos não diretamente ligados saiam das mãos do juiz Moro. O ministro Ricardo Lewandowski, contudo, negou o pedido da PGR. Além disso, o procurador-geral, Rodrigo Janot, insistiu no fato de que a investigação não se dirigia a delações ou a empresas, mas a uma “organização criminosa que tem vários ramos e opera de maneira uniforme em várias frentes  com quase sempre os mesmos atores”.
OS VOTOS
O ministro-relator Dias Toffoli entendeu que, sendo a colaboração premiada um meio de obtenção de prova, o delator pode falar de crimes outros que não os que sejam objeto da investigação-matriz. A seu ver, para a determinação da competência ou da jurisdição deveria se partir da chamada “ratione loci”, isto é, do local onde se consumou o fato alegadamente criminoso e, também, do lugar onde teria ocorrido o crime de pena mais grave.
Segundo ele, os documentos encaminhados ao STF referem-se a repasses de valores da Consist Software (prestadora de serviços de informática) em fatos relacionados à gestão de empréstimos do Ministério do Planejamento, e não com o desvio de recursos da Petrobras. “São fatos ocorridos em âmbitos diversos, com matrizes diferentes. Os fatos que envolvem a Consist não têm relação com os inquéritos referentes à Lava Jato”, sublinhou.
Toffoli acrescentou que não se podia fugir à observância do “juiz natural”, e que cabia também ao STF dizer qual o juízo competente para investigar os suspeitos que não têm direito a foro especial por prerrogativa de função. Citou o relatório do juiz Sérgio Moro, no qual se lê que a empresa Consist, sediada em São Paulo (e não em Curitiba) foi tomadora de serviços prestados a escritórios de advocacia (entre os quais o do investigado Oliveira Romano), em contratos e emissão de notas fiscais ideologicamente falsos.
O voto do ministro-relator foi acompanhado, no todo, por Edson Fachin, Teori Zavascki, Rosa Weber, Cármen Lúcia, Marco Aurélio e Ricardo Lewandowski. O ministro Zavascki aproveitou a oportunidade para destacar que o inquérito básico para investigar o escândalo da Petrobras, propriamente dito, do qual é relator, é o Inq 3.989, que tem 39 indiciados. O ministro Roberto Barroso aderiu ao voto do relator quanto ao desmembramento, mas discordou com relação ao envio dos autos relativos aos demais indiciados – que não a senadora Gleisi Hoffmann – para a Justiça federal de São Paulo.
O voto vencido mais contundente foi o do ministro Gilmar Mendes, para quem não estava em causa “uma questão neutra ou eminentemente técnica”.
“No fundo, o que se espera é que os processos saiam de Curitiba, e não tenham a devida sequência em outros lugares. É bom que se diga, em português claro!” – afirmou. E acrescentou: “O que temos aqui são fatos ligados ao que aparenta ser uma organização criminosa com os mesmos meios de atuação. A Operação Lava Jato tem várias ramificações com comando central. O caso envolve, sim, conexão e continência, e deveria se levar em conta a nova dimensão de organização criminosa que age independentemente de foros e comarcas. O que se apurou é que o esquema criminoso foi replicado em diversos outros órgãos públicos além da Petrobras, com os mesmos métodos e figuras”.
Ele se referiu a João Vaccari Neto, ex-tesoureiro do PT, José Dirceu e Milton Pascovitch como nomes que aparecem em investigações diversas, e disse não ter dúvida de que a lavagem de dinheiro, no caso em discussão, está ligada ao crie antecedente.
“Não há dúvida de que a lavagem é ligada ao crime antecedente. No caso, o esquema convergia para Vaccari Neto, ex-tesoureiro do PT, que já era investigado ou réu em processos na vara de Curitiba. Não tem na história deste país organização criminosa desse jaez!”
Defendeu, portanto, o ponto de vista de que o processo deveria continuar em Curitiba, com o juiz Sérgio Moro, titular da 13ª Vara Federal da capital do Paraná.

Sessão do STF. Corte sem quorum para planos econômicos.

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JOTA

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