Mariana Ribas
Repórter em Brasília cobrindo Congresso Nacional. Jornalista formada pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP). Antes, foi repórter de Carf no JOTA. Email: mariana.ribas@jota.info
“O Brasil está prestes a enfrentar um momento de retrocesso em termos de luta contra a desigualdade social. Temos que ter cuidado, a arbitragem nunca foi tão importante como é hoje, se não prestarmos atenção a esse problema, veremos a arbitragem cair”, alerta Alexis Mourre, presidente da Câmara de Comércio Internacional (ICC, na sigla em inglês), durante a 9ª edição do ICC Arbitration Day, que ocorreu entre a última terça-feira (1/6) e quarta-feira (2/6).
O sistema arbitral está em crescimento no Brasil. Só os processos movidos pela Administração Pública - direta e indireta - aumentaram 17% em 2020. No ano de 2019, havia nas Câmaras arbitrais o total de 967 procedimentos em andamento, 65 a mais em relação ao ano anterior. É o que aponta a pesquisa “Arbitragem em Números e Valores”, da advogada e professora Selma Lemes.
Apesar dos números motivadores, a imprevisibilidade imposta pela pandemia da Covid-19 e a crise econômica colocam a discussão sobre os custos da arbitragem como um importante ponto que precisa de mudança, caso contrário, poderá haver consequências negativas para o setor.
"Aqui o desafio é desenhar um mecanismo que seja mais barato. A arbitragem convencional é mais cara para litígios de menor valor. Não se quer que a arbitragem de menor valor caia no mesmo problema, porque se cair não vai prosperar. Vai ser impossível competir com o Judiciário", disse Gustavo Franco, ex-presidente do Banco Central e sócio-fundador da Rio Bravo Investimentos, no evento.
Em janeiro deste ano, o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) divulgou um estudo que mostra que 44,8% das empresas brasileiras foram afetadas negativamente pela pandemia. Só em julho de 2020, o número de negócios que fecharam as portas no país foi de 716 mil, um aumento de 12,7%, de acordo com levantamento da Boa Vista.
Para Franco, a arbitragem pode ser uma solução para alguns problemas que essas empresas enfrentam, podendo trazer mais segurança econômica. Ele explica que isso é possível porque "a arbitragem preenche alguns vazios que o Judiciário não consegue suprir. É preciso que o sistema seja econômico para as partes e que dialogue com o Judiciário, porque se for um processo falho ele funcionará apenas como uma instância anterior, onde as partes vão continuar se desentendendo e depois procuram os tribunais".
Olhando para a parte jurídica, Marcelo Trindade, advogado do escritório Trindade Advogados, avalia que também é importante que as decisões arbitrais sejam respeitadas por parte do Judiciário, para que haja segurança jurídica para o setor.
Em abril de 2020, a ICC pediu, através de uma carta aberta, uma ação urgente dos líderes do G20 em resposta à pandemia causada pela Covid-19, que se alastrava no mundo. O texto lista dez práticas para o enfrentamento da crise, entre elas a redução de tarifas e facilitação de comércio de produtos essenciais, manutenção de fluxos logísticos e de financiamento ao comércio.
Com a emissão de US$ 650 bilhões de Direitos Especiais de Saque (DES) do Fundo Monetário Internacional (FMI), o secretário-geral da ICC, John W.H. Denton, afirmou em reunião virtual com representantes do G20 em abril de 2021, que muitas empresas sentiriam que o grupo estaria apenas distribuindo “paliativos”, não uma recuperação duradoura. Assim, pediu um amplo pacote de solidariedade internacional.
“É tradicional entre economistas a distinção entre risco e incerteza. A crise de 1929 trouxe o desafio previsível de que o padrão hoje estaria sob ataque. Daqui em diante não se consegue vislumbrar o que será a mudança. Prever o futuro é sempre uma complicação”, explica Franco, em relação ao impacto econômico da crise da Covid-19.
A ICC Arbitration Day ocorreu de forma online e contou, também, com a presença dos especialistas Jan Kleinheisterkamp, professor associado de Direito (London School of Economics - Department of Law); Gustavo Franco, ex-presidente do Banco Central; Berardino Di Vecchia Neto, representante na América Latina do ICC YAF; Anne Marie Whitesell, LLM Program and Faculty Director, Program on International Arbitration and Dispute Resolution (Georgetown University) e Maurício Almeida Prado, sócio MAP Negotiation and Arbitration.