Serviço público

Governo fará mapa de integridade nos órgãos federais

Modelo de Maturidade será aplicado a partir de 2024. Estudo da OCDE mostra fragilidade em cargos de liderança

Diretora de Integridade Pública, Renata Alves de Figueiredo atua na execução de modelo / Crédito: Adalberto Carvalho/CGU

Entre janeiro e fevereiro de 2024, o governo pretende dar início a um grande diagnóstico para saber como os órgãos federais atuam para prevenir e combater práticas que contrariam o interesse público.

Chamado de Modelo de Maturidade em Integridade Pública, o sistema será aplicado em etapas, ao longo dos próximos três anos. O processo começa pela estruturação da ferramenta nas unidades que articulam e coordenam ações de integridade e transparência em 204 órgãos e autarquias federais.

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Essas unidades formam o Sistema de Integridade, Transparência e Acesso à Informação (Sitai). De acordo com a Controladoria-Geral da União (CGU), o diagnóstico deve avaliar a conformidade de condutas e comportamentos que aumentam a confiança da sociedade nas organizações e nos serviços prestados.

“Para tornarmos a administração cada vez mais íntegra, precisamos saber onde estão nossas forças e, também, nossas fragilidades. Precisamos de um mapa que nos permita enxergar como as organizações públicas estão atuando em relação à integridade e, também, quais os caminhos que elas podem percorrer para se tornarem cada vez mais íntegras”, afirmou ao JOTA o ministro da Controladoria-Geral da União, Vinicius de Carvalho.

O modelo deve oferecer, em uma frente, diretrizes e orientações sobre o que se espera da gestão da integridade. Em outra, haverá um questionário para identificar o nível de desenvolvimento de cada órgão. A CGU reconhece, no entanto, que o modelo precisará de ajustes e receberá colaborações dos órgãos ao longo do primeiro ano de execução.

O sistema de avaliação deve permitir que a maturidade seja identificada em um dos cinco níveis do modelo. O inicial é quando a integridade do órgão depende de indivíduos e não há atividade estruturada nesse sentido. O nível máximo tem o nome de otimizado, quando as ações engajam a sociedade, os parceiros e permitem a multiplicação de conhecimento.

“A gente fala integridade é fazer a coisa certa, é a pessoa ser correta, ser honesta… Mas, no âmbito organizacional, a gente não pode depender unicamente dos esforços individuais das pessoas. A gente precisa ter um caminho para que as organizações se fortaleçam e realmente consigam lidar com esses desafios que representam riscos à integridade”, explica Renata Alves de Figueiredo, diretora de Integridade Pública e Prevenção a Conflitos de Interesse da CGU.

A diretora de Integridade da CGU afirma que a meta é permitir que todos os órgãos atinjam, pelo menos, o segundo nível de maturidade, chamado de padronizado, quando há uma estrutura, treinamento e desenvolvimento de ações de integridade.

Nesse conceito, a integridade vai além das medidas de combate à corrupção e aos conflitos de interesse. Os desafios também abrangem o que os técnicos classificam como questões públicas emergentes para um ambiente organizacional íntegro.

Essa lista inclui componentes de prevenção ao assédio sexual, moral, institucional e o combate à discriminação de qualquer natureza.

Paralelamente ao modelo, a CGU e a Escola Nacional de Administração Pública (Enap) discutem a possibilidade incluir um eixo de avaliação em integridade na formação inicial dos novos servidores públicos.

“A gente quer que as capacidades institucionais para a integridade tenham como foco a entrega de valor público à sociedade”, afirma Renata Alves de Figueiredo.

Retrato nos cargos de liderança

Um levantamento produzido pela Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE) e pela CGU, a partir de entrevistas realizadas em 2022, mostra que são grandes os obstáculos para disseminar conceitos de integridade entre os ocupantes de funções de liderança no governo federal.

O estudo, discutido em evento relacionado ao Dia Internacional de Combate à Corrupção, na semana passada, em Brasília, analisou as respostas de ocupantes de funções de confiança equivalentes aos antigos DAS 4 e DAS 5, hoje divididos em Cargos em Comissão Executivos e Funções Comissionadas Executivas (só para efetivos).

Os resultados apontam que, mesmo com mais funções de liderança que só podem ser exercidas por servidores efetivos, falta uma estratégia para disseminar a cultura de integridade entre os ocupantes desses cargos. De acordo com a OCDE, a inexistência de avaliação de performance, em muitas vagas, já compromete esse esforço.

O mesmo levantamento demonstrou ainda que, diferentemente do que a OCDE imaginava, ocupantes de funções de liderança jovens estão mais abertos a participar de cursos de capacitação voltados à integridade, sendo que as mulheres são mais interessadas no tema na comparação com seus colegas homens.

“As evidências também sugerem que os líderes não estão suficientemente engajados em disseminar os cuidados relacionados à integridade, bem como dialogar sobre o tema com suas equipes e organizações”, afirma o estudo.

De acordo com a pesquisa de 2022, 65% dos entrevistados afirmaram que nunca participaram de uma reunião ou de uma discussão relacionada à integridade, sendo que 26% afirmam nem mesmo terem participado de treinamento sobre conflito de interesse, ética, nepotismo, transparência e outros riscos relacionados à administração.

Outro dado destacado no levantamento é a importância da disseminação de uma cultura organizacional aberta, quando as pessoas são encorajadas pelos líderes e gestores a dar a sua opinião e discutir publicamente potenciais violações da integridade pública.

A pesquisa identificou que as entrevistadas se sentiam menos encorajadas a tratar desses temas em comparação com os seus colegas do sexo masculino.

A diretora de Integridade da CGU pondera que existe uma defasagem na pesquisa em relação à atual política de integridade do governo e que “não necessariamente” esse diagnóstico reflete a situação atual.

No entanto, Renata Figueiredo afirma que o estudo é importante para compreender a necessidade de, por exemplo, criar redes de relacionamento para identificar  pessoas que sirvam como referências dentro dos órgãos, mesmo em cargos abaixo da alta direção. Por exemplo, coordenadores que disseminem a cultura da integridade.

“Na minha equipe, por exemplo, eu tenho três coordenadores gerais. Eles já estão mais próximos da equipe. Tem que chegar nas pessoas.  A gente não consegue evoluir na integridade só criando regras, criando políticas, criando sistemas, controlando e punindo as pessoas. A gente tem que investir na integridade por meio do comportamento. E a gente só muda o comportamento no dia a dia”, explica a diretora da CGU.